Vladimir Putin disse hoje que a Ucrânia pode perder a sua condição de Estado, se insistir em resistir à "operação militar especial" no seu território.
"A liderança atual (de Kyiv) precisa de entender que, se continuar a fazer o que está a fazer, arrisca o futuro do Estado ucraniano. E devem ser responsabilizados por isso", disse Putin, durante uma reunião em Moscovo.
Ainda assim, Putin já deu ordens para que uma delegação russa se reúna com representantes ucranianos, numa terceira ronda de negociações, na próxima segunda-feira.
Horas antes destas declarações de Putin, o cessar-fogo temporário acordado entre as partes, para permitir a saída de civis de duas cidades na Ucrânia, desmoronou-se rapidamente, com as autoridades ucranianas a culparem o Exército russo de estar a bloquear a prometida passagem segura com bombardeamentos, enquanto Moscovo aumentava o controlo na costa sul.
O Ministério da Defesa russo disse que tinha concordado com as rotas de evacuação em Mariupol, um porto estratégico, e na cidade oriental de Volnovakha, que estão sob fortes ataques há vários dias, mas as autoridades ucranianas desistiram da retirada de civis, perante a permanência de combates em ambas as regiões.
O Comité Internacional da Cruz Vermelha (CICV) descreveu como "dilacerante" a situação em Mariupol, onde a retirada de moradores foi adiada, apelando às partes que protejam os civis na Ucrânia, haja ou não um corredor humanitário.
"Entendemos que as operações de saída segura de Mariupol e Volnovakha não vão começar hoje. Continuamos a dialogar com as partes sobre a passagem com toda a segurança de civis das várias cidades afetadas pelo conflito", refere o CICV em comunicado.
Putin continua a endurecer as críticas ao Ocidente e disse mesmo que olhará para as sanções impostas pela União Europeia (UE) e pelos Estados Unidos como uma "declaração de guerra".
Vladimir Putin disse ainda que a Rússia considerará co-beligerante qualquer país que tente impor uma zona de exclusão aérea sobre a Ucrânia, uma medida pedida por Kyiv que a NATO rejeitou.
"Consideraremos qualquer desenvolvimento nessa direção como uma participação no conflito armado de qualquer país em cujo território seja criada uma ameaça para os nossos soldados", disse o líder russo sobre uma possível "zona de exclusão aérea no território da Ucrânia".
Fazendo um balanço do conflito armado em curso, Putin confessou que a decisão de intervir militarmente na Ucrânia foi "muito difícil".
"Disse isto no início da operação e disse-o antes de esta decisão ter sido tomada. Uma decisão difícil, sem qualquer dúvida", disse o chefe de Estado russo, numa reunião com membros femininos da tripulação de voo das companhias aéreas russas, transmitida pela televisão estatal.
Putin realçou, no entanto, que as forças russas praticamente eliminaram as infraestruturas militares da Ucrânia na intervenção armada em curso naquele país e que já dura há 10 dias.
No campo diplomático, vários atores internacionais mostraram-se hoje disponíveis para mediar negociações entre Kyiv e Moscovo.
O Presidente turco, Recep Tayyip Erdogan, anunciou que vai pedir ao seu homólogo russo, num telefonema a fazer no domingo, para que "ponha fim imediato à guerra", oferecendo-se para acolher negociações entre a Rússia e a Ucrânia, anunciou hoje o seu porta-voz.
"O Presidente [Erdogan] vai transmitir a mensagem que temos repetido desde o início: é preciso acabar com esta guerra imediatamente, dar uma hipótese ao cessar-fogo e a negociações, estabelecer um corredor humanitário e realizar as evacuações", disse o porta-voz da Presidência turca, Ibrahim Kalin, numa entrevista ao canal privado turco NTV.
Erdogan também vai apelar a que se iniciem conversações "ao nível dos dirigentes" entre a Rússia e a Ucrânia, que "podem acontecer na Turquia", adiantou o mesmo porta-voz.
Entretanto, a Rússia declarou que mantém "determinados canais de diálogo" com os Estados Unidos da América (EUA), apesar da crise desencadeada pela ofensiva militar russa na Ucrânia e pelas inúmeras sanções económicas decretadas contra Moscovo.
"Mantêm-se canais de diálogo com os EUA", disse o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, sobre o estado das relações com Washington, durante a sua conferência de imprensa telefónica diária.
Enquanto isso, o secretário de Estado norte-americano, Antony Blinken, e o seu homólogo chinês, Wang Yi, falaram sobre a situação na Ucrânia, durante um telefonema em que Washington mais uma vez pressionou Pequim a ser mais crítica com a Rússia.
A China, por enquanto, tem evitado condenar a invasão russa da Ucrânia, tendo expressado oposição às sanções unilaterais impostas a Moscovo pelos EUA, União Europeia e outros países ocidentais.
Em Moscovo, em resposta a críticas internas e externas, o Kremlin defendeu a necessidade de "firmeza" na nova lei que reprime "informações falsas" sobre o Exército russo para enfrentar uma "guerra de informação" que diz estar a ser travada contra a Rússia no âmbito do conflito na Ucrânia.
"No contexto da guerra de informação, era necessário adotar uma lei cuja firmeza foi adaptada, o que foi feito", disse o porta-voz da Presidência russa, Dmitri Peskov, no dia seguinte à entrada em vigor de um diploma que impõe pesadas penalizações pela divulgação de qualquer informação considerada falsa sobre as forças armadas russas.
Vários meios de comunicação ocidentais -- incluindo as estações televisivas italiana RAI, norte-americana CNN, canadiana CBC, britânica BBC e a agência de notícias Bloomberg e a agência noticiosa espanhola EFE -- decidiram paralisar os seus serviços em território russo, para protegerem os trabalhadores dos riscos de penalização pelas autoridades russas.
Entretanto, a Rússia e a Bielorrússia foram suspensas hoje do Conselho dos Estados do Mar Báltico (CEMB), em resposta à agressão de Moscovo contra a Ucrânia e o envolvimento de Minsk no conflito, segundo a União Europeia.
De acordo com o Serviço de Ação Externa da União Europeia, citado pela agência de notícias espanhola EFE, a Europa "concorda com os outros membros do CEMB sobre a suspensão da Rússia e da Bielorrússia, que permanecerá em vigor até que seja possível retomar a cooperação baseada no respeito pelos princípios fundamentais do direito internacional".
Também hoje, a Alemanha, os EUA e os Países Baixos anunciaram que vão aumentar as contribuições para as tropas da NATO destacadas na Lituânia.
Segundo a agência de notícias espanhola EFE, que cita o ministro da Defesa da Lituânia, Arvydas Anusauskas, a Força Aérea alemã vai contribuir com mísseis defensivos, enquanto os EUA enviarão um batalhão de tanques blindados, sendo esperado que os Países Baixos aumentem o seu contingente naquele país.
Num balanço de vítimas do conflito, relativo aos últimos nove dias de combate, pelo menos 351 civis ucranianos morreram e 707 ficaram feridos, de acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos.
"Entre as 04:00 de 24 de fevereiro e as 00:00 de 04 de março, o Alto Comissariado registou 1.058 vítimas civis na Ucrânia: 351 mortos e 707 feridos", referiu o relatório.
Leia Também: Kyiv pede aos Estados Unidos caças e sistemas de defesa aérea