"Muitos países em África já estavam em crise alimentar. (...) O aumento dos preços está a agravar a situação de milhões de pessoas atiradas para a pobreza pela pandemia, o que requer ação urgente dos governos e da comunidade internacional", disse a investigadora sénior da Human Rights Watch (HRW) Lena Simet, citada num comunicado da organização.
Na nota, a HRW recorda que a invasão da Ucrânia pela Rússia agravou a crise de segurança alimentar em muitos países africanos, que dependem fortemente do trigo, fertilizantes e óleos alimentares importados daqueles dois países em guerra.
Além disso, com a guerra, os mercados globais foram desestabilizados e os preços dos alimentos aumentaram ainda mais, pelo que mesmo países que têm importações reduzidas da Rússia e da Ucrânia são afetados indiretamente.
"Os governos e os doadores devem garantir o acesso a alimentos a preços acessíveis em África, intensificando os esforços de assistência económica e de emergência e de proteção social. Caso contrário, milhões de pessoas em todo o continente africano podem passar fome", apela a HRW no comunicado.
Recordando que, segundo a legislação dos direitos humanos, todas as pessoas têm direito a alimentação suficiente e adequada, a organização sublinha que os governos são obrigados a aplicar políticas e programas que garantam que todos tenham acesso a alimentos seguros e nutritivos.
A HRW recorda que mesmo antes da guerra na Ucrânia, muitos países, incluindo Angola, Camarões, Quénia e a Nigéria, já enfrentavam um forte aumento dos preços dos alimentos devido a episódios climáticos extremos, como secas e inundações, e à pandemia de covid-19.
Desde o início da invasão russa, os preços dos alimentos alcançaram novos recordes, lembra a organização, que cita o Índice de Preços dos Alimentos da agência das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO), que aumentou 12,6% entre fevereiro e março.
O índice de março é o mais alto desde que a medição foi criada nos anos 1990.
A Rússia e a Ucrânia estão entre os cinco maiores exportadores mundiais de cevada, girassol e milho, e representam cerca de um terço das exportações mundiais de trigo.
O Programa Alimentar Mundial (PAM) compra metade do trigo que distribui em todo o mundo à Ucrânia. Com a guerra, a oferta diminuiu e os preços aumentaram, incluindo os preços dos combustíveis, o que agrava o custo de transportar alimentos de e para a região.
A ONU define insegurança alimentar como a "falta de acesso consistente a alimentos, o que diminui a qualidade da dieta, perturba os padrões alimentares normais e pode ter consequências negativas para a nutrição, a saúde e o bem-estar".
O PAM já alertou que se a guerra durar para além de abril, a fome aguda pode aumentar em 17% a nível mundial, estimando-se que os piores aumentos ocorram na África Oriental, Ocidental e Austral, onde o número total de pessoas a sofrer de insegurança alimentar aguda pode aumentar em 20,8% e afetar 174 milhões de pessoas, recorda a HRW.
Segundo dados da FAO de 2020, 66,2% da população africana já estava então privada de uma dieta saudável e cerca de 323,2 milhões de africanos (29,5%) tinham ficado sem alimentos em algum momento desse ano, situação entretanto agravada pela pandemia.
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