"Através de quatro instrumentos de análise utilizados, foi possível percecionar a necessidade de desenvolver o pensamento crítico dos jornalistas, para que despertem a curiosidade pelo mundo, o queiram conhecer e fiscalizar. A falta de consciencialização em relação à missão e ao exercício da própria profissão foi uma das maiores fragilidades assinaladas, com consequências em várias direções", de acordo com as conclusões.
"A falta de conhecimentos, que não gera dúvidas, resulta em textos jornalísticos que se limitam a dar voz às fontes, sem que os factos sejam questionados. Os temas abordados centram-se excessivamente em questões políticas e institucionais, desvalorizando-se temas sociais, originais e exclusivos", notou o estudo do projeto Consultório da Língua para Jornalistas.
Este projeto, financiado por Portugal e que apoia há vários anos a formação de jornalistas em Timor-Leste, pretendeu avaliar a situação do setor, nomeadamente em termos de requisitos adicionais de formação.
Uma das formadoras envolvidas no projeto Carina Valério considerou que o estudo é "um ponto de partida" para a segunda fase do projeto, que depois de se focar nas competências em língua portuguesa vai agora apostar mais em formação técnica.
Este trabalho de análise foi apresentado no Centro Cultural Português em Díli, por ocasião do Dia Mundial da Imprensa, onde decorreu um debate com vários jornalistas.
O estudo, que ouviu proprietários de órgãos de comunicação social (OCS) em Timor-Leste e jornalistas, analisou ainda notícias em várias plataformas, para "compreender desafios dos OCS tendo em conta as circunstâncias em que têm que desempenhar as suas funções em Timor-Leste".
Com base em dezenas de inquéritos e entrevistas, o estudo traçou igualmente um perfil profissional do setor em Timor-Leste, uma classe "bastante jovem" e com poucas bases de formação básica escolar, com a maioria dos jornalistas a exercer funções há menos de dez anos.
Os jornalistas destacaram entre as maiores dificuldades falta de formação e de tempo, considerando essencial, no futuro, formações para aperfeiçoar as técnicas de escrita.
Uma das questões mais complexas é o da relação com as fontes. Neste âmbito, o estudo apontou uma "forte politização das notícias", sendo que "a proximidade entre os jornalistas e a classe política é muitas vezes de grau familiar, o que, tendo em conta o valor cultural da família em Timor-Leste, acaba por afetar, de alguma forma, a liberdade profissional".
O estudo mostrou ainda a falta de vocação que "trava o desenvolvimento das capacidades técnicas e profissionais dos jornalistas que estão na profissão para ter um trabalho e um salário e não compreendem a responsabilidade social do jornalismo".
Entre as dificuldades mais destacadas, o estudo referiu a "falta de competências de pensamento crítico (...) sobretudo na interpretação e seleção de informação essencial e na capacidade de investigar e propor novos temas para conteúdos informativos".
De acordo com o trabalho, "as falhas no sistema educativo acabam por contribuir para esta realidade. As lacunas no ensino básico e superior contribuem também para a falta de conhecimentos gerais e de matemática que se refletem na dificuldade em fazer a cobertura de notícias sobre temas que muitas vezes desconhecem".
"Os jornalistas não chegam às redações com os conhecimentos técnicos que o ensino superior tem responsabilidade de assegurar", sublinhou.
A falta de formação profissional é apontada por 35% dos jornalistas como o maior desafio, seguido da falta de tempo 24%, da falta de condições de trabalho para 14%, falta de acompanhamento no trabalho (8%) e falta de acesso à informação (5%).
Os jornalistas disseram que querem ainda mais formação para ajudar a identificar aspetos como ângulos de reportagem, a capacidade de estruturar as notícias e a síntese da notícia, com 8% a admitirem dificuldades em fazer questões.
Em termos setoriais, os jornalistas sentem mais dificuldades na cobertura de temas como finanças públicas, justiça ou saúde, com evidentes dificuldades na cobertura eleitoral, nomeadamente na interpretação de dados de votação.
"Foi visível um desconhecimento em termos gerais e, especificamente, nas áreas da matemática, economia, saúde, finanças públicas, linguagem e funcionamento jurídicos, que se refletiram muitas vezes em notícias muito próximas de se tornarem impercetíveis", avançou.
Dificuldades em comunicar com as fontes, em ler e interpretar corretamente comunicados, ou falta de ferramentas para trabalho de investigação são outros aspetos realçados.
Entre os aspetos positivos, o estudo destacou "o uso do presente do indicativo na construção dos títulos, a escrita sem adjetivos qualificativos e a colocação de uma única ideia por frase".
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