Jovem viu pai morrer em Bucha e conta: "Fui atingido por soldado russo"
O adolescente de 15 anos pode vir a testemunhar no julgamento de crime de guerra, na Ucrânia, segundo um especialista norte-americano.
© Reuters
Mundo Rússia/Ucrânia
Um adolescente e o seu pai deslocavam-se nas suas bicicletas, às quais amarraram um pano branco, quando foram surpreendidos por um soldado, que lhes perguntou o que estavam a fazer. Segundo a Associated Press (AP), não houver sequer tempo para responderem antes de o militar disparar contra eles - ignorando as mãos no ar e o sinal de paz que tinha sido amarrado para que se pudessem deslocar em segurança.
Semanas depois, Yura está deitado no chão e, acompanhado pela sua mãe, conta como sobreviveu ao ataque do oficial russo, que apareceu de um caminho de terra na cidade, onde os cenários de guerra despoletaram uma viragem neste conflito - quando, ao descobrirem-se sinais de tortura em civis os líderes mundiais começaram a chamar a guerra de Putin de genocídio.
O rapaz de agora 15 anos contou à AP que se manteve assim como estava, deitado, até o soldado abandonar o local. Yura tem agora uma marca no ombro, onde a bala acertou.
“Quando finalmente chegou a casa, a família chamou a polícia. Segundo o tio de Yura, Andriy, os agentes disseram que não sabiam o que fazer com o caso”, conta a agência, acrescentando que o procurador de Bucha, responsável pelo caso, continua a trabalhar nele.
Ruslan Kravchenkoa falou com a AP, explicando que “todas as crianças que foram mortas ou feridas de forma deliberada” pelos soldados russos, uma vez que há sempre panos brancos ou sinais com a palavra “crianças” durante evacuações, e, neste caso, deslocações.
Desde que o conflito começou, e segundo as autoridades locais, já morreram pelo menos 31 menores e 19 ficaram feridas devido à invasão das tropas russas.
Segundo lembra a AP, por norma as crianças não tidas em consideração para testemunhar devido à sua vulnerabilidade ou memórias imprecisas. No entanto, um especialista norte-americano com quem a agência de notícias falou diz que este caso pode ser uam exceção. “Os procuradores podem querer avançar porque a vítima ainda está viva e pode potencialmente testemunhar”, disse Ryan Goodman. “Pode ser difícil, senão impossível para um arguido justificar-se numa tentativa de homicídio de uma criança”, acrescentou.
Yura correu para longe do cadáver do pai, a quem as balas não passaram de raspão. Só no dia seguinte a família recuperou o corpo, tendo a avó implorado às autoridades russas para que a deixassem aproximar do local.
“Com as suas armas levantadas, [os soldados russos] deixaram-na andar à frente deles. Um outro soldado gritou, de longe: ‘Não venhas para aqui ou vamos matar-te’”, conta a AP, acrescentando que a família trouxe o corpo num carrinho de mão. O cadáver acabou por ser enterrado no quintal da casa.
Dois dias depois da tentativa de homicídio, Yura e a sua família saíram de Bucha por um corredor de segurança e o rapaz, que trazia o ombro com uma ligadura, foi questionado por soldados russos sobre o que tinha acontecido. “Fui atingido por um soldado russo”, respondeu-lhes Yura, ao mesmo tempo que a sua mãe se sentiu horrorizada. “Senti tudo a colapsar dentro de mim [...] Achei que nos iam alvejar a todos”, contou, explicando que esses soldados os deixaram passar, saindo da cidade, não sem antes passarem por onde o ataque ao pai de Yura tinha acontecido.
À medida que a procuradoria-geral da Ucrânia vai anunciando que já tem milhares de possíveis crimes de guerra, tendo esta quarta-feira sido conhecido o primeiro soldado russo que será julgado por crimes de guerra, a família de Yura não perde a esperança de que que seja feita justiça-
“Não sou apenas eu que quero justiça [...] Os ucranianos estão possivelmente ainda a ser torturados e mortas”, conta o rapaz.
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