A campanha de verão ‘Todos os corpos são corpos de praia’, lançada na passada quinta-feira pelo governo espanhol, está envolta numa (nova) polémica. Em causa está o facto de a imagem ilustrativa da campanha utilizar fotografias de mulheres sem o seu consentimento.
As primeiras críticas à campanha - que mostra uma imagem de várias mulheres com diferentes tipos de corpos e idades na praia com a frase ‘O verão também é nosso’ - surgiram horas após o seu lançamento.
A ministra Irene Monteiro, que tutela o Instituto das Mulheres e que tem a pasta da Igualdade no governo espanhol, foi a mais criticada, com os internautas a pedir a sua demissão. A hashtag #IreneMonterodemite (Irene Monteiro, demite-te) entrou nas tendências da rede social Twitter em Espanha, com mensagens de ódio contra a ministra e a garantia de que tinha gastado 84 mil euros (o que foi negado oficialmente) com uma iniciativa "desnecessária" porque "as gordas sempre puderam ir à praia" sem necessidade da "autorização da ministra".
A mais recente polémica envolve duas mulheres que aparecem na campanha, que alegam não ter dado autorização para a sua utilização. Sian Lord, uma modelo britânica com uma perna amputada, viu uma fotografia sua ser utilizada na campanha “inclusiva”, mas a sua prótese foi editada.
Nas redes sociais, a modelo disse “nem conseguir explicar a raiva” que sente “pelo facto de o governo espanhol” ter utilizado a sua imagem “numa campanha de positividade”. “Uma coisa é usar a minha imagem sem a minha autorização, outra é editar o meu corpo”, disse nas ‘stories’ do Instagram.
La chica a la que le robaron la imagen y le editaron la prótesis cuenta lo indignada que se siente de que hayan usado su imagen sin consentimiento y sobre todo de que quitasen su prótesis en una campaña de "body positive". @IgualdadGob @antoniamorillas nada que decir? pic.twitter.com/FUFBQLhn4a
— Grimmer ️ | OTAN NO (@lady_grimmer) July 29, 2022
Já numa publicação, afirmou que a fotografia original agora a faz sentir “extremamente triste” e frisou que a sua perna amputada “não é motivo de vergonha”, mas sim “um produto de força, resiliência e independência”.
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A autora da campanha recorreu ao Twitter para “pedir publicamente desculpa às modelos”, por se ter “inspirado nas suas fotografias” e “ter utilizado uma tipografia sem licença”. “Após a justificada controvérsia em torno dos direitos de imagem da ilustração, considerei que a melhor forma de mitigar os danos que possam ter resultado da minha conduta é partilhar igualmente os benefícios deste trabalho”, escreveu, acrescentando que recebeu 4.490 euros pelo trabalho, e não 84 mil.
Tras la polémica, justificada, entorno a los derechos de imagen de la ilustración he considerado que la mejor forma de paliar los daños que se hayan podido derivar de mi conducta es repartir los beneficios que se derivan de este trabajo a partes iguales
— ArteMapache (@ArteMapacheArt) July 28, 2022
Defensores da campanha, dentro e fora das redes sociais, consideram que as reações que gerou a iniciativa são a prova de que é mesmo necessário insistir na mensagem que queria transmitir, ou seja, de aceitação do corpo. E que aquilo que a campanha pretendia denunciar e combater existe mesmo: "a gordofobia" e "a violência estética".
Foi isto mesmo que disse na sexta-feira a secretária de Estado da Igualdade, Angela Rodriguez, para quem os milhares de insultos e mensagens de ódio que se seguiram ao lançamento da campanha demonstram que "há um problema" e que estas iniciativas são necessárias.
"Continua a incomodar que as mulheres gordas tenham espaços de visibilidade e por isso é importante começar a fazer política com esta questão", disse a secretária de Estado, em declarações à agência de notícias EFE.
Para Angela Rodriguez, está em causa uma "discriminação estrutural", que afeta "mulheres gordas ou homens carecas". "É preciso abrir este debate porque a diversidade corporal não é aceite. Onde estão as pessoas gordas? Não sabem ser apresentadoras de televisão, não sabem ser políticas?", questionou.
A secretária de Estado alertou que "a violência estética" ou a "gordofobia" estão na origem de problemas graves, como distúrbios alimentares ou questões de saúde mental, o que também denunciaram muitas mulheres que participaram na polémica gerada nas redes sociais e que contaram as suas próprias experiências.
"Temos de assinalar que todos os corpos são válidos e que são necessárias campanhas de sensibilização neste sentido", sublinhou a secretária de Estado, que assegurou que esta campanha foi apenas a primeira de várias iniciativas do Ministério da Igualdade neste âmbito.
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