Disruptiva até na demissão. Como o mundo se apaixonou por Jacinda Ardern
Recorde alguns dos momentos-chave do mandato da líder neozelandeza, desde o ataque terrorista em Christchurch à pandemia de Covid-19.
© Kerry Marshall/Getty Images
Mundo Nova Zelândia
Com ela, a Nova Zelândia ganhou (outro) destaque internacional. Desde que foi eleita, em 2017, Jacinda Ardern atraiu atenções de todo o mundo graças ao seu estilo de liderança, à forma como equilibrou a vida política e familiar, mas também pelo modo como conduziu o país num difícil contexto, marcado por uma crise pandémica e económica.
Em quase seis anos como primeira-ministra, Ardern tornou-se num ícone global da política de centro-esquerda, ao mesmo tempo que lidou com desastres naturais, com a Covid-19, e com o pior ataque terrorista de todos os tempos naquele país.
Em 2017, tornou-se a líder feminina mais jovem do mundo e, no ano seguinte, voltou a fazer história como a segunda chefe de Governo, a nível mundial, a dar à luz enquanto estava à frente de um executivo (Benazir Bhutto, do Paquistão, foi a primeira).
Seis anos depois, fez um anúncio surpreendente: vai deixar o cargo antes das eleições, que acontecem em outubro, por admitir já não ter energia "para desempenhar bem o cargo".
"Sou humana. Damos tudo o que podemos pelo tempo que podemos e então chega o momento. E para mim, é o momento", afirmou.
Ardern, de 42 anos, tornou-se primeira-ministra em agosto de 2017, sendo a pessoa mais jovem na história da Nova Zelândia a ocupar o cargo.
A governante cessante chegou ao poder após a surpreendente renúncia do líder de centro-direita John Key, e depois de concordar com uma coligação com os Verdes e os Nacionalistas, encerrando uma década de governo conservador.
Contudo, depois de conseguir um segundo mandato, graças à vitória esmagadora do Partido Trabalhista nas eleições legislativas de 2020, Ardern tem sofrido uma queda de popularidade devido à deterioração da situação económica e ao ressurgimento da oposição conservadora.
Nascida em 1980, em Hamilton, a sul de Auckland, Jacinda Ardern diz que foi a pobreza a que assistiu no interior da Ilha do Norte que ajudou a moldar as suas crenças de esquerda.
Filha de um polícia, foi criada na fé mórmon, à qual renunciou nos anos 2000, por causa das posições dessa Igreja sobre a homossexualidade.
Ardern interessou-se desde muito cedo pela política graças a uma tia e ingressou nas organizações sindicais da juventude.
Após completar os estudos, trabalhou para a ex-primeira-ministra Helen Clark, e depois, em Londres, para o ex-chefe de Governo britânico Tony Blair.
O ataque terrorista em Christchurch
Ardern governou durante dois dos períodos mais tumultuosos da história recente da Nova Zelândia, tendo sido a líder responsável por abolir a venda e posse de armas de fogo depois do massacre islamofóbico em duas mesquita em Christchurch, em 2019.
Brenton Tarrant, um cidadão australiano que se mudou para a Nova Zelândia em 2017, entrou armado com duas semiautomáticas em duas mesquitas da cidade do sul do país a 15 de março de 2019. Tinha intenção de matar o maior número de muçulmanos que conseguisse, como foi possível ouvir no seu julgamento em 2020.
Um dia após os ataques, Jacinda Ardern usou um hijab, numa visita aos refugiados e à comunidade muçulmana, dizendo-lhes em lágrimas que todo o país estava "unido em luto".
O ataque foi um dos mais mortíferos da história da Nova Zelândia e originou um consenso entre os deputados num espaço de semanas para que fossem banidas as armas semiautomáticas de tipo militar no país de forma a prevenir que algo do género se voltasse a repetir.
Outra resposta aos ataques foi o "Christchurch Call" – uma iniciativa global liderada por Ardern e pelo presidente francês Emmanuel Macron para instar os gigantes da tecnologia e outros governos a se comprometerem a combater a disseminação do extremismo nas redes sociais.
Líderes de todo o mundo assinaram o documento voluntário – apresentado à margem de uma reunião do G7, em maio de 2019 – assim como Amazon, Facebook, Google, Microsoft e Twitter, que se comprometeram a trabalhar mais de perto com os governos para garantir que os seus sites não se tornem canais de recrutamento radical.
Pandemia
Jacinda Ardern liderou também a resposta da Nova Zelândia contra a Covid-19. O país aproveitou o seu isolamento geográfico para se ver livre da pandemia no espaço de meses.
Ardern foi elogiada globalmente pela forma como geriu o coronavírus. Agiu rapidamente para fechar as fronteiras, em março de 2020, decretando medidas rigorosas de quarentena para neozelandeses que regressassem do estrangeiro.
Apesar das críticas domésticas sobre o ritmo lento de distribuição de vacinas, o país de cerca de 5 milhões de habitantes registou menos de 2.500 vítimas mortais da Covid-19. Tem a menor taxa de mortalidade do mundo ocidental relacionada com a infeção, de acordo com a Universidade Johns Hopkins.
O legado
O percurso de Jacinda Ardern no governo da Nova Zelândia fica ainda marcado por ter formado o executivo mais diversificado da história do país, com mais mulheres, pessoas de diferentes raças, LGBTQ e membros indígenas no parlamento do que nunca.
No ano passado, a Nova Zelândia tornou-se na primeira democracia industrializada avançada a ter uma legislatura maioritariamente feminina.
Recentemente, num encontro com a ministra finlandesa Sanna Marin, Ardern foi questionada sobre se as duas se tinham reunido porque eram da mesma idade. A líder neozelandesa insurgiu-se: "Pergunto-me se alguém já perguntou a Barack Obama [ex-presidente dos Estados Unidos] e John Key [ex-primeiro-ministro da Nova Zelândia] se eles se encontraram porque eram da mesma idade".
A primeira-ministra da Nova Zelândia disse que terminará o seu mandato o mais tardar a 7 de fevereiro, tendo sido reeleita há menos de dois anos com uma maioria absoluta.
Perante esta decisão, o Partido Trabalhista deve eleger no domingo o novo líder da força partidária e o novo primeiro-ministro.
No entanto, o eleito deverá governar até 14 de outubro, data em que se realizam as eleições legislativas.
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