São Tomé considera justiça "mais importante do que democracia eleitoral"
O primeiro-ministro são-tomense, Patrice Trovoada considerou, esta sexta-feira, numa conferência em Lisboa que a justiça é "mais importante do que a democracia eleitoral" e "para que as coisas funcionem melhor em África" é preciso o continente ter "melhor justiça".
© Lusa
Mundo Patrice Trovoada
"Devemos [os governantes africanos] dar muita ênfase a melhorar a justiça, [tornando-a] mais próxima do povo, [garantir] um poder judicial independente, inamovível e responsável, mas com controlo, e controlo alargado ao controlo dos cidadãos", afirmou Trovoada, numa conferência sobre a democracia em África, que decorreu em Lisboa.
"A lei fixa um quadro legal geral, mas quando chegamos à interpretação da lei, então vemos aí uma dimensão política que é muito delicada", considerou o líder do Governo de São Tomé e Príncipe.
As declarações de Patrice Trovoada foram proferidas no dia seguinte ao Ministério Público são-tomense deduzir acusação, dentro dos prazos legais, contra os acusados no caso do assalto ao quartel-general das Forças Armadas do país em 25 de novembro.
A acusação antes da prescrição, este sábado, da prisão preventiva dos arguidos, detidos há quase três meses, foi saudada pelo Presidente são-tomense, Carlos Vila Nova, que disse esperar "o esclarecimento cabal" do caso.
Em declarações à margem da conferência, Trovoada já tinha sublinhado o facto da acusação do Ministério Público confirmar a tentativa de golpe de Estado.
Já sobre o arquivamento, por falta de indícios face às "suspeitas iniciais", das acusações contra sete arguidos, incluindo o ex-presidente da Assembleia Nacional são-tomense, o primeiro-ministro afirmou: "Delfim Neves, como todos os são-tomenses devem reconhecer que a Justiça é independente, que não há imiscuição do Governo em matéria de justiça e que o rigor do Direito, num caso tão grave, fez com que algumas alegações não tenham chegado a ter a qualidade que se impõe para ir até um processo", permitindo a Delfim Neves "beneficiar com o arquivamento".
"Infelizmente, quatro importantes testemunhas morreram, e temos de nos conformar e respeitar a Justiça e as coisas são assim, e ainda bem", disse ainda, manifestando-se "agradecido" por o sistema de justiça em São Tomé e Príncipe, e o Ministério Público, terem "dado garantias a todos [de que], quando há uma dúvida, é normal que o réu beneficie da dúvida".
Na conferência "Democracia em África", promovida pela Internacional Democrática do Centro (IDC), Trovoada voltou a elaborar sobre a importância do bom funcionamento da Justiça, sugerindo alguns mecanismos para alcançar esse objetivo, por exemplo, no âmbito das inspeções judiciais.
"Achamos fundamental e tentamos em São Tomé e Príncipe, que a inspeção a nível da justiça seja internacional e que o colégio dos inspetores seja composto não só por magistrados nacionais, mas também por magistrados estrangeiros", afirmou.
Depois, o chefe do Governo são-tomense recordou que os governos africanos, "quando precisam de fazer reformas" precisam geralmente "do apoio internacional, quer político, quer financeiro, que se traduz pelo condicionalismo".
Este "condicionalismo", sugeriu Trovoada ao Ocidente, devia evoluir de um modelo que "passa pela realização de eleições para ter ajuda pública ao desenvolvimento [APD]", para outro ligado à "qualidade da justiça".
"Acho que hoje devíamos condicionar a APD à qualidade do sistema de justiça em cada um dos nossos países", advogou.
E prosseguiu: "Isso permitiria forçar alguns avanços no domínio da justiça, que não é só as eleições, mas são os contratos, as relações comerciais, são as pessoas fundamentalmente".
"Se de facto a justiça conseguir tocar cada um de nós nas nossas vidas e nas nossas atividades, estou convencido de que poderemos resolver o problema fundamental que enferma África, que é o problema da pobreza", acrescentou.
"Maior segurança jurídica [favorece] melhores empresas, melhores cidadãos, que pagam os seus impostos, melhor transparência na gestão da coisa pública e mais felicidade para os nossos povos", sugeriu Patrice Trovoada.
A conferência aprovou e assinou no final um documento a que chamou "Declaração de Lisboa", em que sublinha a existência nos países africanos de "muitas situações" "inaceitáveis", que "não devem ser toleradas" ou "satisfeitas de forma pouco transparente e irregular, por representarem um alto risco para todo o continente africano e para a segurança dos seus cidadãos".
Em face a essa constatação, o IDC África criou um "grupo de trabalho para a defesa da segurança dos Estados, da democracia e das liberdades fundamentais em África, com o objetivo de observar com total independência" e proceder ao "acompanhamento e correção das múltiplas e diversas irregularidades e arbitrariedades cometidas, que violam o Estado de Direito, os direitos humanos e outras leis universais".
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