"Grande parte do tráfico de combustível nos países do Sahel parece estar organizado informalmente", referiu um novo relatório sobre o tema lançado pela agência da Organização das Nações Unidas (ONU), o terceiro até agora este ano como parte de uma avaliação mais ampla da ameaça do crime organizado transnacional na região do Sahel.
A organização sublinhou, contudo, que "investigações recentes revelaram o envolvimento de grupos estruturados ligados a indivíduos proeminentes com interesses no setor da distribuição de combustíveis, instituições financeiras e funcionários responsáveis pelo cumprimento da lei corruptos".
O relatório apontou que os baixos preços na Argélia, Líbia e Nigéria, onde são subsidiados pelo Estado, são um dos mais importantes impulsionadores do tráfico de combustíveis no Sahel, já que estes podem ser contrabandeados através das fronteiras e vendidos pelo dobro do preço.
"O facto de o combustível ser mais barato torna a população bastante favorável a este tipo de prática" e a sua prática "tem um efeito desastroso no Estado de direito e na perceção das instituições pela população local", sublinhou o responsável de investigação para a África Ocidental e Central do UNODC, François Patuel, citado pela agência espanhola Efe.
"É um motor de corrupção, lavagem de dinheiro e cria perdas económicas consideráveis nos países da região", acrescentou Patuel.
De acordo com o relatório, existem quatro grandes fluxos de tráfico de combustível nos países do Sahel: da Nigéria através do Benim para o Burkina Faso e Mali, da Nigéria através do Níger para o Mali, da Argélia para o Mali e da Líbia para o Níger e para o Chade.
Este comércio ilícito é realizado de diferentes formas: utilizando grandes camiões de 10 toneladas de forma organizada, em motos e outros veículos fora de estrada de forma desorganizada (denominados de "formigas") ou através de revendedores registados e traficantes profissionais.
Segundo Patuel, embora o tráfico feito por "formigas" não tenha "necessariamente muito impacto na região", há os "grandes criminosos organizados que usam o tráfico de combustível para, por exemplo, lavar o dinheiro do tráfico de drogas".
Da mesma forma, as investigações do UNODC mostraram um envolvimento do setor bancário com "indivíduos dentro de instituições financeiras que facilitam a abertura de contas para traficantes", revelou o especialista.
Além disso, "a gasolina e o gasóleo baratos também alimentam as atividades de grupos armados ilegais, incluindo grupos considerados 'terroristas' pela comunidade internacional", acrescentou o relatório, referindo-se a organizações ligadas à Al-Qaida.
Reprimir o contrabando de combustíveis no Sahel, uma região com altas taxas de emprego informal, "pode ter sérias consequências para o bem-estar da população", mas esse tráfico ilegal "acarreta perdas fiscais consideráveis para países com orçamentos já limitados e alimenta a corrupção", concluiu o UNODC.
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