"A tragédia fez questionar tudo, provocou a contestação da capacidade de resposta das autoridades, da corrupção e da debilidade estrutural da construção e do ordenamento das cidades. Tudo isto foi posto em xeque com o sismo", destacou a deputada portuguesa, que integrará uma equipa de observação do Conselho da Europa nas eleições legislativas e presidenciais turcas, que decorrem em 14 de maio.
Para a social-democrata, as "feridas ainda não estão saradas" na Turquia, após mais de 50 mil mortes, dois milhões de desalojados, cidades inteiras arrasadas, comunidades sem casas, e famílias inteiras desfeitas.
Isabel Meirelles fez um paralelismo com o terramoto de 1755 em Lisboa, referindo que criou "uma onda de descontentamento" contra "a aristocracia e o 'statu quo'", em que "até Deus foi questionado".
"O nosso terramoto teve um impacto na cultura iluminista europeia. À escala euroasiática, o sismo de 06 de fevereiro pode ter repercussões nas eleições internas turcas, e certamente vai ter implicações quanto ao futuro geopolítico da Turquia", analisou.
O Conselho da Europa (COE), órgão de defesa dos direitos humanos no continente e do qual a Turquia é membro, enviará 42 deputados da sua Assembleia Parlamentar para observar as operações de votação, disse no final do mês de abril à agência France-Presse (AFP) o chefe da delegação, Frank Schwabe, deputado alemão do Partido Social-Democrata (SPD).
Além da missão do COE, cerca de 350 especialistas da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) irão observar as eleições turcas.
Isabel Meirelles destacou que o COE "pode ter um papel-chave para encontrar soluções para os problemas da Turquia, como o estatuto de minorias, proteção do ambiente, movimentos migratórios, crime organizado e no fortalecimento de laços de cooperação".
"Na Turquia, que é a herdeira-mãe do império otomano, a economia, a saúde e as questões sociais serão sempre essenciais, mas não dependem do COE. O povo turco é soberano. Como cidadã europeia, mulher e democrata abomino a perseguição de pessoas, sejam elas militares, magistrados, professores, empresários ou funcionários públicos", atirou.
Com o atual Presidente, Recep Tayyip Erdogan, no poder há 20 anos, o processo de adesão da Turquia à União Europeia está congelado desde 2018, e a deputada social-democrata frisa que este país "não cumpre os Critérios de Copenhaga, imprescindíveis para a adesão".
"Quando Ancara reunir os requisitos políticos, económicos e de respeito pelas obrigações enquanto membro candidato, então significa que a Turquia estará mais perto de fazer parte da casa e família europeias", sublinhou.
Isabel Meirelles manifestou também curiosidade em perceber como ficará o posicionamento "muito peculiar" da Turquia face à invasão russa da Ucrânia, em que "apoia militarmente [os ucranianos], mas no plano comercial, procura tirar vantagens com a sua relação com a Rússia".
E ainda "na mitigação de conflitos de índole regional", no Mediterrâneo, no Médio Oriente, em África e na Ásia, concretamente na disputa entre a Arménia e o Azerbaijão, na região de Nagorno-Karabakh.
As eleições presidenciais e legislativas na Turquia realizam-se em 14 de maio e serão decisivas para a manutenção, ou não, do Presidente Recep Tayip Erdogan e do seu partido AKP, no poder há duas décadas.
A oposição apresenta uma frente unida de seis partidos que tem um único candidato à Presidência, Kemal Kiliçdaroglu, apoiado pelo partido esquerdista e pró-curdo HDP.
Perto de 61 milhões de eleitores vão decidir o futuro do país, juntamente com mais de três milhões de turcos que vivem fora do seu país, incluindo em Portugal, que votam antecipadamente.
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