Hahcen perdeu a mãe no terramoto. A casa onde vivia, com mais quatro pessoas, ficou reduzida a destroços, tal como outras duas habitações de vizinhos.
A poucos metros, cinco pessoas de uma outra família juntam-se, em círculo, sobre o que restou da sua casa. Um homem idoso, uma mulher e uma jovem choram. "Ontem tiraram dois corpos", relata Hahcen.
No total, naquelas três casas, morreram cinco pessoas. "Está tudo destruído aqui", diz o jovem.
Hoje prosseguiam ali operações para resgatar cinco corpos soterrados.
Junto à estrada, a movimentação é grande: retroescavadoras retiram os escombros, param camiões militares carregados de material, e várias viaturas transportam ajuda para a população afetada. Elementos da 'gendarmerie' procuram organizar o trânsito.
Foram instaladas duas unidades de saúde móveis, com quatro consultórios. No exterior, cerca de 20 pessoas aguardavam a sua vez para serem atendidas.
"Aqui temos todos os dispositivos médicos, medicamentos. Atendemos urgências, doenças crónicas", explica à Lusa uma responsável do Ministério da Saúde marroquino.
A funcionária adiantou que ainda há aldeias nas montanhas que estão inacessíveis por estrada e, por isso, o ministério está a enviar equipas médicas em helicópteros da Força Aérea Real.
"Não podem entrar no centro da vila, é muito perigoso", avisa um guarda, numa referência às casas que ruíram e outras que ficaram muito danificadas pelo abalo.
Ouirgane, no Alto Atlas (sul de Marrocos), às portas do parque nacional do Toubkal -- a montanha mais alta do norte de África, com 4.167 metros -- e junto a uma barragem, "era uma vila turística, mas agora não", lamenta Emnouany.
Momentos antes, o homem saíra de uma casa de dois andares pela janela: "Era a minha casa e a minha loja, um pequeno supermercado, tinha quatro metros. São 20 anos de trabalho que acabaram".
A porta de entrada ficou inacessível e as fundações do edifício estão praticamente destruídas.
"Não tenho dinheiro para recuperar a casa", diz.
Nesta vila, morreram cerca de 60 pessoas e "houve muitos feridos, foram levados para os hospitais em Marraquexe".
A povoação é uma das mais afetadas pelo sismo, registado às 23:11 (mesma hora em Lisboa) de sexta-feira, que causou mais de 2.800 mortos e acima de 2.500 feridos, de 7,0 na escala de Richter, segundo o Instituto Nacional de Geofísica de Marrocos -- o Serviço Geológico dos Estados Unidos registou uma magnitude de 6,8.
"O meu coração está partido", diz Anfat Dihaj, uma bióloga que vive em Rabat e que regressou à sua terra para ver como estão as casas da família e hoje distribuía medicamentos.
A mãe da Anfat explorava ali um hotel, mas "está tudo partido", tal como as casas dos seus familiares.
"Uma mulher que estava grávida teve um aborto e uma mãe morreu, mas a bebé de um mês sobreviveu", conta.
Mais perto da barragem, um pátio alberga agora 25 pessoas de três famílias. Mantas, colchões, um frigorífico -- desligado, porque não há eletricidade -, um sofá, mesas, um fogão a gás e muitos sacos com pertences compõem o cenário.
Ao lado, as casas onde viviam. "Caiu tudo lá dentro", conta Ahmid, e desde sexta-feira que dormem ao relento.
"Faz frio à noite, por isso temos muitos cobertores", afirma. Só hoje de manhã lhes foram entregues umas tendas, que estão presas ao chão, mas o vento fez levantar a base.
"Não sabemos como as montar", diz uma jovem, Hajar, 17 anos, que descreve que teve de partir portas para conseguir retirar os familiares do interior da casa.
Apesar de tudo, o tio alegra-se: "Deus protegeu-nos quando saímos da casa".
À pergunta se é difícil viver naquelas condições, Hajar esboça um sorriso e responde: "Estamos vivos, então...".
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