Numa conferência de imprensa à margem do Fórum Global de Refugiados que decorre em Genebra, Suíça, aonde chegou na quarta-feira diretamente de Gaza, Philippe Lazzarini voltou a fazer uma exposição sobre a situação no terreno, que já descrevera como "um verdadeiro inferno", enfatizando que a população palestiniana experimenta atualmente algo que nunca viveu, apesar de todas as dificuldades das últimas décadas: a fome.
"Para onde quer que se olhe, as pessoas estão desesperadas, esfomeadas e aterrorizadas. E algo completamente novo a que assisti é que por vezes as pessoas estão a parar os camiões de ajuda, a retirar a comida e comê-la imediatamente. Isto mostra o quão desesperadas e com fome estão", disse o responsável das Nações Unidas.
De acordo com o chefe da UNRWA, "devido à imensidão das necessidades e da pouca ajuda que entra em Gaza, é cada vez mais difícil esta chegar aos nossos armazéns, que estão sobrelotados, pois no exterior há dezenas de milhares de pessoas que estão também desesperadamente com as mesmas necessidades, e que também têm de ser assistidas".
"E isto não tem nada a ver com desvios [da ajuda]. Tem a ver com o desespero total que as pessoas estão a expressar na Faixa de Gaza. A fome é algo que nunca conheceram antes, mas emergiu nas últimas semanas, e encontramos cada vez mais pessoas que não comem há um, dois ou três dias. É por isso que testemunhamos pessoas por vezes a pararem camiões e a alimentarem-se imediatamente no local", disse, rejeitando que sejam militantes do grupo terrorista Hamas a fazê-lo.
A este propósito, Lazzarini, dirigindo-se aos jornalistas, sublinhou a importância da verificação de factos, para combater a desinformação e desmontar "acusações repetidas e por vezes grosseiras".
"Como diretor da UNWRA, experimentei [as 'fake news'] mais do que uma vez, já que a nossa agência também tem sido um dos alvos da desinformação nesta guerra", disse.
Na véspera, o responsável da ONU já enfatizara que "a população de Gaza está agora amontoada em menos de um terço do território original, perto da fronteira egípcia", advertindo que "é irrealista pensar que as pessoas se manterão resistentes face a condições de vida tão inabitáveis, sobretudo quando a fronteira está tão próxima".
"A visão de um camião que transporta ajuda humanitária provoca agora o caos. As pessoas têm fome. Param o camião e pedem comida, e comem-na na rua. Testemunhei isto em primeira mão quando entrei em Gaza na segunda-feira à noite. Chamar a estas cenas desumanas é um eufemismo. A ordem civil está a ser quebrada", disse.
Segundo a ONU, mais de metade das casas foram destruídas ou danificadas pela guerra na Faixa de Gaza, onde 1,9 milhões de pessoas - 85% da população - foram deslocadas.
De acordo com o Ministério da Saúde do Hamas, mais de 18.200 pessoas foram mortas na Faixa de Gaza, na sua grande maioria mulheres e menores de 18 anos, pelos bombardeamentos israelitas desencadeados pelo ataque do movimento islamita Hamas contra Israel a 07 de outubro passado, que provocou cerca de 1.200 mortos, na maioria civis.
Paralelamente à sua campanha de ataques aéreos devastadores, o exército israelita conduz desde 27 de outubro uma ofensiva terrestre contra o Hamas, inicialmente concentrada no norte de Gaza e depois alargada a todo o território.
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