Na sequência da dissolução da União Soviética e o fim do Pacto de Varsóvia em 1991, os Estados Unidos -- com Bill Clinton na presidência --, perspetivavam então o reforço da presença da NATO, então com 16 Estados-membros, no leste europeu e na perspetiva de uma futura expansão.
A reunificação alemã, consumada em outubro de 1990, representou um passo decisivo, e o início dos diferendos com a enfraquecida liderança de Moscovo, já com Boris Ieltsin na presidência da Federação da Rússia a partir de finais de 1991.
A República Democrática Alemã (RDA), que integrava o Pacto de Varsóvia, retira-se do Pacto de Varsóvia em setembro de 1990, três dias antes da reunificação alemã, mas para assegurar o acordo do ainda líder soviético Mikhail Gorbatchov à entrada da Alemanha reunificada na NATO, foi prometido que não seriam estacionadas a leste quaisquer tropas estrangeiras ou armas nucleares. Um argumento que a Rússia nunca deixará de esgrimir.
Em paralelo, e no final da histórica cimeira aliada de 1994, Clinton anunciava a assinatura, para o final dessa semana, de um acordo trilateral com Rússia e Ucrânia que garantia a desnuclearização a prazo deste último país, que possuía um importante potencial nuclear, e a inviolabilidade das suas fronteiras.
No comunicado final confirmava-se ainda a determinação de desencadear ataques aéreos para impedir o "estrangulamento de Sarajevo", que acabam por se concretizar em 1995 contra as posições dos sérvios bósnios, naquela que foi a primeira intervenção da NATO no exterior das suas fronteiras desde a sua fundação e que inaugura as intervenções da aliança militar em diversos cenários.
O projeto de "parceria para a paz" e o acordo sobre a desnuclearização da Ucrânia são recebidos com entusiasmo pelos aliados, com Bill Clinton a referir-se a "dois passos de gigante em direção à paz e à segurança", apesar de a persistência das guerra nas ex-Jugoslávia, iniciadas em 1991, conterem um excessivo triunfalismo.
O projeto norte-americano de "parceria para a paz" será adotado quase de imediato, e sem a menor reserva. A NATO propunha aos países do antigo bloco de leste, incluindo a Rússia, uma cooperação militar com a NATO sob certas condições, incluindo transparência nos orçamentos para a Defesa, controlo civil sobre o aparelho militar do país, adesão a uma declaração de princípios políticos.
A nova arquitetura de segurança europeia que emergia na Europa após o fim da Guerra Fria excluía à partida qualquer processo de adesão dos países da Europa de leste, apesar de diversos líderes das novas "democracias emergentes" desejarem uma rápida inclusão na Aliança.
Apesar das insistências do designado "grupo de Visegrad" -- Polónia, Hungria, República Checa e Eslováquia -- em obterem critérios de integração de curto prazo, as suas ambições não são satisfeitas no imediato.
Assim, na cimeira de janeiro de 1994 não foi decidido um alargamento imediato, e ficou assente que entre os países integrados na nova "parceria", apenas poderiam pedir a integração os que se aproximavam do "perfil" de um país membro, numa referência óbvia ao grupo de Visegrad, com três -- polacos, húngaros e checos -- a garantirem a adesão plena cinco anos depois. A Eslováquia apenas será integrada no amplo alargamento de 2004, que inclui sete países e já com Vladimir Putin na presidência da Rússia após a resignação de Ieltsin em finais de 2000.
No entanto, os países da Europa de leste obtêm diversas garantias e a cimeira atendeu às suas reivindicações, contrariando os pedidos de Ieltsin, totalmente ignorados, para que a cimeira de Bruxelas explicitasse diversas ambiguidades em torno do projeto de "parceria".
Os documentos aprovados mencionam expressamente o compromisso de alargamento da NATO a leste, ainda sem data definida, e a declaração oficial reafirma que "a Aliança está aberta a outros Estados europeus".
Albânia, Arménia, Azerbaijão, Bulgária, Cazaquistão, Eslováquia, Eslovénia, Estónia, Finlândia, Geórgia, Hungria, Quirguistão, Letónia, Lituânia, Moldova, Polónia, República Checa, Roménia, Rússia, Suécia, Turquemenistão, Ucrânia e Uzbequistão são os países que assinam em 1994 o projeto de "parceria para a paz", mas sobretudo vocacionado para o espaço europeu e que irá conhecer significativas alterações nos anos seguintes.
Muitos dos dirigentes presentes na cimeira, incluindo o primeiro-ministro britânico John Major, o Presidente francês François Mitterrand ou o chanceler alemão Helmut Kohl, sempre defenderam que o alargamento da Aliança se destinava prioritariamente aos países do grupo de Visegrad.
Major e Mitterrand consideravam que o projeto em formação constituía uma "resposta razoável" da NATO às preocupações dos países de Visegrad e atendia aos receios de a Rússia se sentir isolada, ou cercada.
Estes receios também são partilhados por Bill Clinton, que considerava que um alargamento da NATO poderia implicar "o pior dos cenários quanto ao futuro da Rússia", considerando que esta "parceria" alargada "permite tempo para estendermos a mão à Rússia", que se desejava "democrática" e que não entenderia um futuro alargamento ao grupo de Visegrad como uma ameaça.
Em termos concretos, a NATO vai propor aos "parceiros" trocas de informações entre responsáveis militares e eventual participação em operações de "manutenção da paz". No entanto, o artigo 5º, que comprometia os então 16 Estados-membros a total solidariedade em caso de ataque contra um deles, não se estendia aos "parceiros", aos quais apenas previa a possibilidade de "consultar" a organização militar aliada ocidental em caso de conflito que os afetasse.
O desenvolvimento do "pilar europeu" da NATO, pela adaptação da organização à ambição da Europa em garantir maior independência política e autonomia militar na cena internacional, também se inclui nas declarações de intenções da cimeira aliada.
Desde então, o cenário geopolítico internacional registou profundas alterações. Em 2004, mais sete países do leste são integrados na Aliança, um alargamento que prossegue em 2009, 2017, 2020 e 2023, para um total de 31 Estados-membros, 19 deles incluídos após a dissolução da União Soviética.
A intenção manifestada na cimeira da NATO de Bucareste em abril de 2008 sobre uma futura integração da Ucrânia e Geórgia implicou um súbito agravamento das relações com a Rússia de Putin, que considera a adesão de Kiev uma "linha vermelha" que não poderia ser transporta.
Nesse mesmo ano as tropas russas intervêm na Geórgia, e seis anos depois, após a "revolução de Maidan" em Kiev, Moscovo anexava a Crimeia e tinha início da guerra civil no leste da Ucrânia. Em 24 de fevereiro de 2022 Putin ordena uma invasão militar em larga escala, justificada como uma medida "preventiva" no âmbito de um conflito "existencial" motivado pelo contínuo avanço da NATO em direção às suas fronteiras.
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