Migrações. ONG acusa França de negar cuidados a crianças desacompanhadas

A Human Rights Watch (HRW) denunciou hoje que crianças migrantes desacompanhadas não estão a receber a proteção e os cuidados que necessitam por parte das autoridades francesas, segundo um relatório divulgado hoje pela organização não-governamental (ONG).

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© Christian Torres/Anadolu via Getty Images

Lusa
30/01/2024 07:03 ‧ 30/01/2024 por Lusa

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O relatório de 73 páginas, intitulado "'Não é a França que imaginei': habitação, saúde e educação para crianças migrantes não acompanhadas em Marselha", conclui que as autoridades de proteção infantil da cidade de Marselha, no departamento francês de Bouches-du-Rhône, estão a deixar na rua e sem tratamento as crianças que tem necessidades de atendimento de saúde, apoio psicossocial ou outros tipos de acompanhamento.

Para a HRW, a França tem a obrigação de garantir as necessidades básicas de todas as pessoas no seu território e de fornecer cuidados, assistência e proteção adequados a todas as crianças, independentemente do estatuto de migração.

Metade das crianças migrantes desacompanhadas que enfrentaram uma avaliação de idade em Marselha viu negado o reconhecimento formal como criança, mas essas decisões são anuladas para quase 75% daqueles que apresentaram recurso judicial.

A revisão pelos tribunais pode levar meses ou mesmo anos, excluindo as crianças de alojamento e serviços de emergência, como assistência jurídica, nomeação de um tutor e proteção universal da saúde e educação.

A Human Rights Watch entrevistou quase 60 pessoas, incluindo 18 crianças não acompanhadas, bem como funcionários de agências humanitárias, advogados, prestadores de cuidados de saúde, entre outras pessoas envolvidas nestes processos.

As crianças disseram que foram impedidas de receber acomodações de emergência porque as instalações estavam lotadas, o que as obrigou a esperar semanas por uma vaga.

Os menores, erroneamente considerados adultos, descreveram não ter onde dormir depois de serem despejados de acomodações de emergência após a determinação da sua idade.

Um médico que trata crianças desacompanhadas em Marselha disse que as crianças que chegam a França, em muitos casos, já estão esgotadas e que "as condições de vida precárias [à chegada] são perigosas para a integridade física dos menores desacompanhados e por vezes levam a hospitalizações que duram vários dias, o que poderia ser evitado".

O departamento de Bouches-du-Rhône é responsável por realizar um exame de saúde inicial enquanto as crianças aguardam a avaliação da idade. A HRW descobriu, segundo o relatório, que estes rastreios não são realizados de forma sistemática.

Mesmo quando o são, uma avaliação inicial negativa da idade significa muitas vezes que as crianças são deixadas à própria sorte em estados vulneráveis de saúde física e mental. Em alguns casos, as crianças dormem na rua durante dias ou semanas com tuberculose, VIH/Sida, 'stress' pós-traumático ou gravidezes não detetadas até que os seus apelos de avaliação de idade sejam bem-sucedidos

Segundo a HRW, assistentes sociais, psicólogos e médicos que tratam crianças migrantes não desacompanhadas em Marselha relataram uma elevada incidência de sintomas consistentes com 'stress' pós-traumático, pensamentos intrusivos, distúrbios do sono, depressão e ansiedade.

Apesar das garantias previstas na lei, as crianças desacompanhadas em Marselha que não são inicialmente reconhecidas como crianças perdem, em média, seis meses de escolaridade, comprometendo as suas hipóteses de obter estatuto legal quando completarem 18 anos.

Uma controversa nova lei de imigração em França, que foi adotada em dezembro de 2023, anulou muitas proteções dadas aos migrantes. A maioria das disposições da nova lei não se aplicam diretamente às crianças migrantes desacompanhadas, mas não é claro como irão afetar os jovens migrantes desacompanhados que receberam uma avaliação inicial de maioridade e que procuram a revisão dos seus casos nos juizados de menores.

O Conselho Constitucional francês irá rever a lei no final de janeiro de 2024.

Leia Também: Enviar migrantes para o Ruanda? Arcebispo de Cantuária deixa alerta

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