A Rússia vai a votos entre a próxima sexta-feira e domingo, 15 e 17 de março, para escolher o presidente do país. Estas serão as primeiras presidenciais desde o início da invasão russa da Ucrânia, a 24 de fevereiro de 2022. No entanto, é quase certo que o atual presidente, Vladimir Putin, seja reeleito.
No total, são mais de 110 milhões de cidadãos russos, incluindo mais de seis milhões que vivem nos territórios temporariamente ocupados pela Rússia, que são chamados às urnas para aquilo que é descrito pelo Parlamento Europeu como "um ritual de legitimação cuidadosamente encenado para a recondução de Vladimir Putin para um quinto mandato".
O presidente russo está no poder há 25 anos, desde 1999, como presidente ou primeiro-ministro, prepara-se para cumprir o quinto mandato e poderá ficar na presidência até 2036. Isto porque, em 2020, Putin apresentou uma lei - que foi aprovada - para mudar a Constituição russa e, assim, passou a poder concorrer a dois novos mandatos consecutivos.
O chefe de Estado, de 71 anos, serviu dois mandatos de quatro anos como presidente, entre 2000 e 2008. Como não se podia recandidatar por já ter cumprido os dois mandatos, a presidência foi assumida pelo seu aliado Dmitry Medvedev, mas ficou por perto como primeiro-ministro.
A duração dos mandatos presidenciais foi entretanto estendida para seis anos e Putin foi novamente eleito em 2012 e reeleito em 2018. Se permanecer no cargo até 2036, será o chefe de Estado há mais tempo no poder desde Josef Estaline, que liderou a União Soviética, desde 1924 até à sua morte em 1953.
Segundo o Parlamento Europeu, "as alterações constitucionais de 2020 permitiram a Putin candidatar-se a um quinto mandato e, possivelmente, a um sexto mandato em 2030".
Depois de ter impedido a participação de dois candidatos antiguerra, o Kremlin prepara-se agora para ter "um resultado esmagador, tanto em termos de participação como de percentagem de votos", que "legitimaria o legado de Putin e a sua guerra de agressão".
Aliás, sondagens recentes do Centro de Pesquisa de Opinião Pública Russo (VTsIOM) mostram que mais de 71% dos eleitores tencionam participar nas eleições e 82% deles tencionam apoiar Putin.
Rússia com quadro político "sombrio" e "uso persistente de tortura e maus-tratos"
De acordo com um relatório da Relatora Especial das Nações Unidas para os Direitos Humanos na Rússia, Mariana Katzarova, datado de setembro de 2023, a Rússia enfrenta um quadro político "sombrio em que qualquer dissidência é silenciada e a mobilização política é praticamente impossível".
"A atual política estatal de criminalização de qualquer dissidência real ou perceção de dissidência é o culminar de restrições progressivas e calculadas aos direitos humanos na Rússia nas últimas duas décadas", indicou o relatório, que registou ainda o "uso persistente de tortura e maus-tratos".
A título de exemplo, segundo recorda o Parlamento Europeu, cerca de 20.000 pessoas foram detidas entre fevereiro de 2022 e agosto de 2023 por participarem em protestos, principalmente contra a guerra, e em 663 casos foram objeto de acusações criminais. Em fevereiro de 2024, Putin assinou
Há ainda mais de mil presos políticos na Rússia, de acordo com dados da organização não governamental (ONG) russa OVD-Info, incluindo Vladimir Kara-Murza, Ilya Yashin, Alexei Gorinov, e Dmitry Ivanov.
Além de Putin, quem está na corrida?
Nikolai Kharitonov
Nikolai Kharitonov, de 75 anos, membro da câmara baixa do parlamento russo, a Duma, é o candidato oficial do Partido Comunista. Segundo recorda a agência de notícias Reuters, os candidatos desde partido ficaram em segundo lugar em todas as eleições desde 2000, mas com uma larga distância de Putin.
Kharitonov já foi candidato em 2004, quando obteve 13,8% dos votos, contra 71,91% de Putin.
Leonid Slutski
Com 56 anos, é membro do Partido Liberal Democrática do Rússia e iniciou-se na política como chefe de sector do Presidium do Soviete Supremo da Federação da Rússia, tendo sido depois conselheiro do edil de Moscovo.
Há três anos, a editora-chefe do canal televisivo RTVI, Ekaterina Kotrikadze, a produtora do canal de TV Dozhd, Daria Zhuk, e a jornalista do serviço russo da BBC, Farida Rustamova, acusaram Slutsky de assédio sexual. O político considerou as acusações "absurdas", parte de uma "campanha personalizada".
Alguns especialistas acreditam que Slutski poderá ficar em segundo lugar nas eleições, opinião corroborada pelo site informativo russo Meduza, publicado em Riga.
Vladislav Davankov
Do partido Gente Nova, 40 anos, originário da cidade de Smolensk. É diplomado pela Universidade de Moscovo e pela Universidade Social. Entrou para a política em 2020, quando participou da fundação do partido a que pertence, e ainda não se referiu à guerra na Ucrânia.
Davankov avançou no ano passado com um projeto-lei que proíbe o uso de toponímicos "ofensivos", tendo sido co-autor de leis que proíbem a transição transgénero e a exibição de animais em circos.
Nas eleições para o município de Moscovo, em 2023, ficou em quarto lugar. Atualmente, não tem um programa eleitoral.
Outros tentaram, mas foram impedidos
Boris Nadezhdin
Com 60 anos e membro da Iniciativa Civil, era o único candidato presidencial que se tinha manifestado contra a "operação militar especial". No entanto, em fevereiro, a Comissão Eleitoral Central (CEC) da Rússia desqualificou a sua candidatura.
Nascido em Tashkent, capital do Uzbequistão, Nadezhdin é formado em Física e Direito. O início da sua carreira política data de 1990, como membro do Conselho Municipal de Deputados do Povo de Dolgoprudni, pequena cidade dos arredores da capital.
Em 1997, aparece como conselheiro de Boris Nemtsov, participou na redacção dos estatutos da Gazprom, bem como de outras empresas do setor energético. No ano seguinte, foi nomeado assistente do primeiro-ministro, Serguei Kiriyenko.
Yekaterina Duntsova
A ex-jornalista de televisão Yekaterina Duntsova apresentou, em dezembro, o seu nome para concorrer às eleições presidenciais. No entanto, dias depois, foi impedida devido à existência de "erros" no seu pedido de registo como candidata.
Com a candidatura, a ex-jornalista tinha como objetivo terminar com a guerra com a Ucrânia e libertar prisioneiros políticos.
Eleições marcadas pela morte do principal opositor de Putin, Alexei Navalny
Além da guerra na Ucrânia, estas eleições presidenciais russas ficam também marcadas pela morte do principal opositor de Vladimir Putin, Alexei Navalny.
Navalny chegou a tentar candidatar-se à presidência russa, em 2018, mas foi impedido de participar por causa de uma condenação por fraude, em 2014 . uma acusação que o opositor dizia ter sido fabricada e ter motivações políticas.
O opositor do Kremlin estava a cumprir pena em liberdade condicional devido a essa mesma acusação, quando foi envenenado com um agente neurotóxico do tipo Novitchok, em agosto de 2020.
Após aquela que considera ser uma tentativa de assassinato por parte do Kremlin, o opositor de 47 anos foi transferido, a pedido da mulher, da Sibéria para a Alemanha para recuperar. Foi detido ao voltar para a Rússia, a 17 de janeiro de 2021.
Acabou por morrer cerca de dois anos depois, na prisão onde se encontrava detido, no Ártico, após alegadamente se ter sentido mal durante uma caminhada. Os seus apoiantes, a viúva, Yulia Navalnaya, e muitos líderes ocidentais acusam o presidente russo, Vladimir Putin, de ser o responsável pela sua morte. A presidência russa negou estas acusações.
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