Supremo dos EUA contra restrições ao acesso à pílula abortiva
A maioria dos nove juízes do Supremo Tribunal norte-americano mostrou-se hoje desfavorável ao restabelecimento das restrições de acesso à mifepristona, uma pílula utilizada na maioria dos abortos nos Estados Unidos.
© Reuters
Mundo Aborto
Com o acordo histórico de junho de 2022, que anulou a garantia federal do direito ao aborto, a mais alta instância judicial norte-americana, com uma maioria conservadora, deu aos estados plena liberdade para legislar nesta área.
Desde então, cerca de vinte proibiram o aborto (interrupção voluntária da gravidez), quer seja realizado através de medicação ou cirurgia, ou regulamentaram-no estritamente.
Um tribunal de recurso, composto por juízes ultraconservadores, restabeleceu em 2023 várias das restrições ao acesso ao mifepristona, uma pílula utilizada para abortos medicamentosos, levantadas pela Administração de Alimentos e Medicamentos (FDA, na sigla em inglês) desde 2016.
Citando riscos potenciais que foram excluídos pelo consenso científico, esta decisão reduziria o limite de dez semanas de gravidez para sete, proibiria o envio de comprimidos por correio e voltaria a tornar obrigatória a prescrição exclusivamente por um médico.
O executivo liderado pelo democrata Joe Biden e o fabricante do mifepristona, o laboratório Danco, pedem aos nove juízes do Supremo Tribunal que anulem esta decisão, atualmente suspensa.
Contestam nomeadamente o "interesse em agir", uma condição para a ação judicial, dos demandantes, nomeadamente associações de médicos ou profissionais hostis ao aborto que não prescrevem nem utilizam esta pílula.
Mas para a advogada Erin Hawley, o levantamento das restrições do acesso à mifepristona por parte da FDA "força estes médicos a escolher entre ajudar uma mulher cuja vida está em perigo e violar a sua consciência".
A consultora jurídica do governo Biden, Elizabeth Prelogar, respondeu enfatizando a raridade de tal situação: "Dizem temer que um médico de urgência em algum lugar, um dia, se depare com uma mulher que sofre de uma complicação incrivelmente rara e que o médico tenha que tratá-la apesar das proteções fornecidas em caso de objeção moral".
"O que o tribunal de recurso fez para protegê-las deste risco muito ligeiro foi tomar uma decisão de âmbito nacional que reduz o acesso ao mifepristona para todas as mulheres neste país e que causa danos consideráveis", alertou.
O juiz liberal do Supremo Tribunal, Ketanji Brown Jackson, apontou a "discrepância significativa" entre a dimensão muito específica do alegado dano e a magnitude da decisão exigida pelos antiaborto.
"Este processo é um exemplo perfeito de como transformar o que poderia ser um pequeno procedimento numa consulta nacional sobre uma regra da FDA ou qualquer outra ação federal", acrescentou, por sua vez, o juiz conservador Neil Gorsuch.
A administração Biden e o laboratório garantem, ao contrário dos demandantes, que a FDA seguiu os procedimentos legais e sublinham que nenhuma evidência científica demonstra um risco aumentado para os pacientes.
A advogada do laboratório, Jessica Ellsworth, alertou ainda contra a interferência da justiça na regulamentação da indústria farmacêutica: "Os juízes não são especialistas em estatística ou na metodologia utilizada em estudos científicos de ensaios clínicos".
Várias dezenas de manifestantes pró e antiaborto reuniram-se hoje de manhã em frente ao Supremo Tribunal, que deverá divulgar a sua decisão em 30 de junho.
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