"A chave agora são os Estados Unidos, Brasil e Colômbia, que estão a coordenar ações e pretendem que o Governo difunda as atas eleitorais de cada mesa de voto --- em vez dos dados agregados que inventaram no domingo à tarde", declarou Andrés Malamud, investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-UL).
Segundo o investigador do ICS-UL, "sete países latino-americanos denunciaram fraude e os seus embaixadores foram expulsos de Caracas".
"Sob o ponto de vista da pressão internacional, eu penso que o mais importante será, em primeiro lugar, a atitude dos Estados Unidos, de reforço [da pressão], e depois o seu isolamento [da Venezuela] na própria América Latina", declarou o politólogo António Costa Pinto.
Para Costa Pinto, "esse isolamento não diz tanto respeito à posição de políticos da direita radical ou populista, como o Presidente da Argentina [Javier Milei], mas sim aos países limítrofes, (...) sobretudo em relação ao Brasil".
O chefe de Estado brasileiro, Lula da Silva, e o seu homólogo norte-americano, Joe Biden, conversaram na noite de terça-feira, por telefone, e sublinharam a importância da divulgação das atas das eleições venezuelanas de domingo, indicou a presidência brasileira.
Em comunicado, a Casa Branca confirmou que "os dois líderes concordaram com a necessidade de as autoridades eleitorais venezuelanas divulgarem imediatamente dados completos, transparentes e detalhados sobre a votação nas assembleias de voto".
De acordo com a Presidência brasileira, Lula da Silva "tem mantido acompanhamento permanente do processo eleitoral por meio de seu assessor especial, Celso Amorim, enviado a Caracas".
Amorim reiterou a posição do Brasil continuar a "trabalhar pela normalização do processo político no país vizinho, que terá efeitos positivos para toda a região", lê-se na mesma nota.
Andrés Malamud afirmou que após "a declaração contundente do Carter Center desconhecendo a legitimidade do processo eleitoral, só vão reconhecer o resultado difundido pelo Governo venezuelano as autocracias amigas [Rússia, China, Irão, Cuba, Nicarágua]".
"Quanto ao facto de países como a China e a Rússia [aceitarem os resultados eleitorais], isso é completamente expectável, porque são as escoras mais importantes de Maduro sob o ponto de vista internacional e também sob ponto de vista da exportação de petróleo", afirmou Costa Pinto.
Para o politólogo, o problema mais importante na Venezuela é interno.
"Qualquer alteração na situação da Venezuela terá sempre de passar pela elite militar e por eventuais alterações na elite militar em relação ao regime. Esse é o ponto fundamental", destacou Costa Pinto.
"Evidentemente a pressão popular é importante, a deslegitimação é importante, mas também é visível que, se há dez anos as populações das favelas desciam para defender o regime de Maduro e de [Hugo] Chávez (ex-Presidente) contra a oposição, nesse momento a conjuntura se inverteu e o regime está mais isolado perante a sociedade venezuelana", acrescentou o politólogo.
O CNE da Venezuela proclamou oficialmente, na segunda-feira, como Presidente Nicolás Maduro, para o período 2025-2031. Segundo o CNE, Maduro foi reeleito para um terceiro mandato consecutivo com 51,2% dos votos, tendo obtido 5,15 milhões de votos.
O principal candidato da oposição, Edmundo González Urrutia, obteve pouco menos de 4,5 milhões de votos (44,2%), indicou o CNE. A oposição venezuelana reivindica, contudo, a vitória nas eleições presidenciais, com 70% dos votos para Gonzalez Urrutia, afirmou a líder opositora María Corina Machado, recusando-se a reconhecer os resultados proclamados pelo CNE.
Contra os resultados anunciados pelo CNE, registam-se desde segunda-feira protestos em várias regiões do país, em que cerca de 750 pessoas foram detidas e pelo menos 11 morreram, segundo o Foro Penal (FP), ONG que manifestou preocupação pelo uso de armas de fogo pelas forças policiais.
A oposição venezuelana e parte da comunidade internacional duvidam destes resultados e exigem mais transparência e uma análise das atas eleitorais.
O Governo da Venezuela anunciou na segunda-feira a saída do pessoal diplomático da Argentina, Chile, Costa Rica, Peru, Panamá, República Dominicana e Uruguai do país, bem como a saída dos seus próprios representantes nestas nações. O Governo do Peru reconheceu, na terça-feira, o candidato eleitoral da oposição venezuelana, Edmundo González Urrutia, como Presidente eleito, considerando "uma fraude" a declaração pelas autoridades eleitorais de Maduro como vencedor. A Venezuela rompeu, posteriormente, as relações diplomáticas com o Peru.
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