Em entrevista à Lusa, a presidente do organismo criado em 2019 para investigar violações de direitos humanos na Venezuela, a portuguesa Marta Valiñas, considera que a única forma de "acalmar os ânimos", numa altura em que se multiplicam as manifestações no país a contestar a proclamada reeleição de Nicolas Maduro, assim como se intensifica a repressão violenta, é através de um "esforço de transparência", para o qual é indispensável a intervenção de países próximos de Caracas, os únicos a quem o regime dará ouvidos.
"Eu penso que o importante neste momento é todos os atores internacionais, desde organismos de direitos humanos -- como ONU e organismos regionais como a Organização dos Estados Americanos [OEA] -, mas também vários países, incluindo aqueles da região que estão mais próximos da Venezuela, possam falar de uma forma assertiva, clara, e fazer alguma pressão sobre o Governo da Venezuela com vista a uma maior transparência possível e a não reconhecer o resultado das eleições a não ser que exista esse esforço de transparência", diz.
Lembrando que o Presidente Nicolás Maduro ainda esta semana "insultou de uma forma bastante condenável o alto comissário da ONU para os Direitos Humanos, Volker Türk, e não parece fazer grande caso sobre o que o secretário-geral das Nações Unidas [António Guterres] tem dito também sobre a necessidade de transparência", Marta Valiñas acredita que só os "atores que têm interesses na Venezuela" podem forçar o regime a ser mais transparente, como, de resto, já sucedeu no passado.
"Eu acho que quase que a nossa única esperança é nesses países da região, que já se viu no passado que têm uma certa influência naquilo que Nicolás Maduro depois acaba por fazer. Isso viu-se quando se confirmou [em março passado] a impossibilidade de Maria Corina Machado ser candidata às eleições presidenciais e depois impossibilitaram também a inscrição da sua substituta", nota a jurista portuguesa.
"Foi depois, com as reações do Brasil e da Colômbia especialmente, mas também de outros países da região, que acharam que era inaceitável o que se estava a passar, que se abriu excecionalmente o prazo para inscrição do terceiro candidato, que acabou por ser o candidato às eleições presidenciais, Edmundo González", que reivindica uma vitória clara nas eleições de domingo passado.
"Portanto eu acho que sim, que há ainda um espaço de influência que é preciso usar", diz, considerando que "só assim se poderiam acalmar os ânimos e evitar que a violência se multiplique", aquilo que "é o mais importante neste momento".
Mas para tal, reforça, "realmente é necessário que haja essa união, digamos, dos atores que têm interesses na Venezuela e que se possa repor nalguma medida a confiança por parte da população no processo, embora estejamos a falar de um processo já extremamente complexo e difícil".
"Mas penso que a solução passa por aí", conclui.
A Venezuela regista desde segunda-feira protestos em várias regiões do país contra os resultados anunciados pelo Conselho Nacional Eleitoral (CNE), que proclamou oficialmente, na segunda-feira, como Presidente Nicolás Maduro, para o período 2025-2031.
De acordo com os dados oficiais do CNE, Nicolás Maduro foi reeleito para um terceiro mandato consecutivo com 51,2% dos votos, contra 44,2% de Edmundo González, mas a grande coligação opositora reivindica um triunfo expressivo, com cerca de 70% dos votos, e os seus apelos com vista à publicação dos registos de votação têm sido apoiados por várias organizações, casos de ONU e União Europeia, e diversos países, como Estados Unidos, Brasil, Colômbia, Chile, México, Argentina, Espanha e Portugal, entre outros.
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