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Eliane Brum defende jornalismo ativista e luta contra "comedores de mundos"

Eliane Brum assume-se como jornalista ativista pelo clima, porque acredita que "quem não é ativista hoje ou está morto ou está em coma", e deposita esperança nos jovens que lutam pelo seu futuro, contra "os comedores de mundos".

Eliane Brum defende jornalismo ativista e luta contra "comedores de mundos"
Notícias ao Minuto

28/10/24 15:40 ‧ Há 2 Horas por Lusa

Mundo Ativismo

A viver desde 2017 em Altamira, no coração da floresta amazónica, a escritora e jornalista brasileira, que acaba de lançar em Portugal o livro "Meus desacontecimentos" (Companhia das Letras), contou em entrevista à agência Lusa que fez essa opção, porque, como ativista climática, quer estar num dos centros do mundo.

 

Fê-lo por coerência, como afirmou, porque defende que é "urgente" um deslocamento dos conceitos hegemónicos do que é centro e do que é periferia, ou seja, "os centros do nosso mundo são onde a natureza resiste, não os centros financeiros e políticos, onde as decisões que destroem a natureza são tomadas", afirmou.

Então, para a jornalista, os centros são a Amazónia, outras florestas tropicais, os oceanos, outros biomas, e não Washington, Pequim, Londres, Frankfurt, Lisboa ou São Paulo.

A reboque dessa ideia de recentralização do mundo, Eliane Brum e o seu companheiro estão a "recentralizar o jornalismo", contando o que está a acontecer a partir de outro lugar.

Tudo começou em 2016, quando a jornalista estava a fazer o seu primeiro projeto de ativismo com um grupo de psicanalistas, "que era para escutar as pessoas da floresta que foram expulsas pela hidroelétrica de Belo Monte, escutar o sofrimento delas".

"Eu pensei, se eu sou jornalista e digo que a Amazónia é um dos centros do mundo, porque é que eu estou na periferia do mundo, em São Paulo, e não na Amazónia?".

Eliane Brum não separa a cidadã ativista da jornalista e acredita que ambas podem e devem coexistir, sem pôr em causa as regras e os critérios que sustentam o bom jornalismo.

"Eu acho que quem não é ativista hoje ou está morto ou está em coma. É porque a gente está vivendo a situação mais desafiante de toda a trajetória humana nesse planeta", afirmou, explicando que isso a confrontou com a necessidade de "fazer o que não sabe", porque "o que sabe não é suficiente" e isso faz-se usando "a imaginação".

Começou então a criar projetos com outras pessoas, o principal dos quais é uma plataforma jornalística, baseada na Amazónia, chamada "Sumaúma -- Jornalismo do Centro do Mundo".

Nesta plataforma, "a gente está formando jornalistas da floresta para que contem o que está acontecendo lá a partir de outra linguagem, a partir da linguagem de dentro, a partir da linguagem de quem não se separa da natureza", contou, explicando que a criação deste projeto é em si um ato de ativismo, mas "o jornalismo de Sumaúma segue rigorosamente as premissas do jornalismo".

"Eu desafio qualquer pessoa com as nossas matérias. As matérias são extremamente rigorosas. A gente recuperou o que o jornalismo perdeu com a crise, nós temos 'checkador', nós temos revisor, nossos tradutores são nativos profissionais, a gente tem revisão das traduções, tudo é rigorosamente tratado, os factos são respeitados".

Contudo, Eliane Brum assinala que, apesar do desastre climático, algo de novo está a surgir, uma "nova infância" de crianças e jovens preocupados com o futuro do planeta.

"As maiores e mais importantes manifestações por ações contra o aquecimento global, contra a destruição da natureza, foram lideradas por adolescentes", destacou.

Na opinião da jornalista, pela primeira vez na história, há uma inversão: "Não são os adultos que protegem as crianças, são as crianças desesperadas pela inação dos adultos".

Para a ativista, é preciso começar a viver na emergência e isso não é o que está a acontecer.

"Eu acho que o capitalismo, ao nos converter em consumidores, ele sequestrou o nosso instinto de sobrevivência, que qualquer organismo, qualquer ser vivo, diante de uma ameaça, imediatamente reage. E nós, não. Então eu acho que é esse o pânico dos adolescentes que se movem".

Usando uma metáfora, a autora entende que estes jovens olham para a inação dos adultos como quem vê uma casa em chamas e um adulto sentado, no único lugar que ainda não está a arder e precisa de ser convencido a enfrentar o fogo e a não se deixar queimar.

O que a preocupa são negacionistas, e não os políticos, porque esse é um "negacionismo calculado" - eles "sabem perfeitamente o que está a acontecer". Por isso, preocupante é o negacionismo que afeta a população.

Preocupada com a ascensão da extrema-direita um pouco por todo o mundo, Eliane alerta para a mentira que este movimento prega: É "uma mentira confortável" que promete o regresso a "um passado que nunca existiu".

Por outro lado, um político e um partido que digam a verdade vão dizer que "o mundo vai piorar, que quem tem privilégios vai precisar de perder privilégios, que a gente vai precisar mudar radicalmente o modo de vida, e já".

"Em quem vota? Nós precisamos de votar em quem diz a verdade, e fazer comunidade para enfrentar esses comedores de mundos".

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