A votação de 09 de janeiro, anunciada na quinta-feira pelo presidente da assembleia, Nabih Berri, caberá aos deputados do parlamento dividido por blocos religioso-políticos, também eles divididos internamente, e que raramente encontram consenso.
Segundo o sistema de sectarismo do Líbano, desenhado para respeitar igualmente todas as religiões presentes no país, o Presidente tem que ser cristão Maronita, o primeiro-ministro muçulmano sunita e o presidente da assembleia muçulmano xiita.
Não há uma lista oficial de candidatos à presidência, mas na última votação os candidatos que tiveram mais votos foram Jihad Azour e Sleiman Frangieh.
Azour dirige o departamento do Médio Oriente e Ásia Central do FMI e foi Ministro das Finanças no Líbano entre 2005 e 2008. Apesar de ser independente, é apoiado pelo patriarca dos Maronitas, e pelos partidos cristãos Forças Libanesas (LF), Kataeb, Movimento Patriótico Livre (FPM) e ainda o partido Druze Partido Socialista Progressivo (PSP).
Já Sleiman Frangieh é apoiado pelos dois partidos principais xiitas: Hezbollah e Amal (o partido do presidente da assembleia, Nabih Berri). Frangieh é o líder do Movimento Marada, um partido político cristão criado pelo seu avô, o antigo Presidente Tony Frangieh. Amigo de infância de Bashar al-Assad, Frangieh foi a primeira escolha presidencial dos xiitas liderados pelo Hezbollah.
Em votações passadas, o Hezbollah e o Amal tiraram proveito da sua força em números e retiraram-se da sessão para quebrar o quórum quando a contagem dos votos não corria a seu favor, mas hoje, o poderio Hezbollah e a sua esfera de aliados não é a mesma.
Com a morte da maior parte da liderança militar do Hezbollah e a destruição das regiões onde operava e viviam os seus eleitores, o grupo não só não representa o braço forte que era antes como está numa posição vulnerável em que vai precisar da ajuda das instituições do Estado para reconstruir o sul do Líbano.
Para as autoridades libanesas e vários países interessados, esta fragilidade é uma oportunidade para agir depressa e ganhar um braço de ferro com o grupo xiita que dura há dois anos para eleger um novo presidente para o Líbano.
O enviado especial francês, Jean-Yves Le Drian, escolhido pelo Presidente Emmanuel Macron chegou a Beirute um dia após o cessar-fogo e poucas horas depois da sua chegada, o presidente da assembleia, Nabih Berri, anunciou a nova votação em janeiro.
O caminho é claro: eleger um Presidente o mais rapidamente possível, oficiar a tomada de posse do Governo, aplicar as reformas estipuladas pelo Fundo Monetário Internacional para desbloquear um pacote financeiro de 2.8 mil milhões de euros (3 mil milhões de dólares), considerado a última instância para o Líbano de uma das piores crises económicas dos tempos modernos.
A reconstrução e um futuro para o país só serão possíveis com donativos e pacotes de apoio financeiros vindos de países como os Estados Unidos, a França e organizações como a União Europeia e as Nações Unidas.
Na quinta-feira, o parlamento libanês enviou um sinal positivo ao mundo: os deputados conseguiram concordar e aprovar a extensão do mandato do líder das forças armadas (LF), o comandante general Joseph Aoun, decisão essencial para manter as condições do cessar-fogo que incluem o desmantelamento da presença militar do Hezbollah no sul do Líbano em prol da presença do exército.
No mesmo dia, o reeleito líder militar Joseph Aoun reuniu-se também com o enviado francês, aumentando as suspeitas de que este comandante general pode emergir como uma terceira alternativa para a presidência.
Militar de carreira, assumiu o atual cargo em 2017 e liderou a batalha contra o Estado Islâmico na fronteira com a Síria, impedindo a entrada do grupo terrorista no Líbano, e é conhecido por fazer frente ao estabelecimento político, pondo em primeiro lugar o bem-estar dos seus soldado
No entanto, o apoio vocal e direto a Aoun poderia enfraquecer a posição do Hezbollah junto dos seus apoiantes mais cerrados. Deputados do Hezbollah têm admitido sob anonimato à imprensa local que o partido xiita vê de facto Joseph Aoun como o "plano B" em alternativa a Sleiman Frangieh.
"Sleiman Frangieh é o homem do eixo Sírio-Iraniano, ele não pode representar uma nova direção. Não podemos construir e reformar o Estado com uma milícia armada até aos dentes e afiliada ao Irão", disse Richard Kouyoumjian, um oficial das LF ao jornal Le Monde o ano passado.
Se era essa era a opinião das LF o ano passado, agora, depois do Hezbollah ter levado o Líbano a uma guerra sangrenta sem vencedores, é ainda mais expectável que o Hezbollah apresente uma alternativa que represente um futuro diferente.
Também não está no interesse político do bloco cristão liderado pelas Forças Libanesas adotar uma posição rígida em relação ao seu candidato de há um ano e meio, Jihad Azour. Se isso significar atrasar ainda mais a eleição do presidente, poderá desta vez ser a eles que o povo libanês apontará o dedo.
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