"Apoiamos firmemente as conclusões do estudo publicado pela revista The Lancet, especialmente porque se baseia numa metodologia precisa e bem conhecida, anteriormente utilizada para estimar as vítimas de massacres, como os do Ruanda e da Bósnia", afirmou, em comunicado, o diretor do Ministério da Saúde de Gaza, controlado pelo movimento islamita Hamas, que é a fonte oficial dos balanços de vítimas, considerados fiáveis pela ONU.
O estudo da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres (LSHTM), divulgado na quinta-feira passada, estima em 64.260 o número de mortos em Gaza entre 07 de outubro de 2023 - data do início da ofensiva, após o ataque do Hamas contra Israel - e 30 de junho de 2024.
A investigação da LSHTM aponta para mais 26.383 vítimas mortais do que as 37.877 mortes registadas pelas autoridades palestinianas nesse período.
Zaher al-Waheidi, que dirige a unidade de saúde responsável pela contagem e identificação das mais de 46.565 pessoas mortas pela guerra no enclave, supervisionou o processo e, em declarações à agência de notícias espanhola EFE, disse que os números da revista britânica estão corretos.
"Revi a metodologia com Hanan [uma das autoras do artigo] e os dados são reais, penso que são reais", explicou por telefone a partir de Gaza.
Al-Waheidi forneceu à equipa de investigadores os dados verificados pelo ministério, assim como as notificações enviadas pelos habitantes de Gaza através da Internet para o Ministério da Saúde sobre o desaparecimento de familiares.
Os autores do artigo da Lancet também recorreram a outras fontes não utilizadas pelo ministério, como informações divulgadas nas redes sociais. Algumas dessas fontes marcam a diferença entre os números do Ministério da Saúde e os do artigo científico.
"Como ministério oficial, não podemos confiar nas redes sociais, mas o seu estudo pode ajudar", disse Al-Waheidi, segundo o qual o Ministério da Saúde de Gaza está empenhado em anunciar apenas os dados que pode comprovar plenamente.
Isto não significa, esclarece, que não haja mais vítimas mortais em Gaza do que as contabilizadas pelo ministério, uma vez que este tem sobretudo em conta os cadáveres que chegam aos hospitais.
O Ministério da Saúde também tem uma comissão que analisa os relatos de pessoas desaparecidas apresentados por aqueles que afirmam que os seus familiares se encontram nos escombros, mas a verificação envolve um processo exaustivo por parte de equipas médicas e de investigação, afirmou.
"Tenho nada menos do que 5.000 relatórios em análise", advertiu Al-Waheidi, que alertou para o facto de o número oficial de mortos poder aumentar drasticamente para mais de 51.000 se todos eles forem verificados.
A equipa de Al-Waheidi já verificou que 4.500 das mais de 11.200 pessoas desaparecidas em Gaza são cadáveres nos escombros e em estradas às quais os socorristas não têm acesso.
No entanto, mais de 1.600 famílias foram completamente eliminadas e apagadas do registo civil nos ataques israelitas, o que significa que ninguém conseguiu declarar o seu desaparecimento e, por conseguinte, muitos dos seus corpos também ficaram excluídos da contagem oficial.
A tudo isto acresce o cerco do exército israelita no norte da Faixa (nas cidades de Jabalia, Beit Lahia e Beit Hanoun), que completa hoje 100 dias e que, segundo as autoridades, causou 5.000 mortos e desaparecidos.
Os hospitais deste setor, como o hospital Al Awda de Jabalia e o hospital Kamal Adwan de Beit Lahia (ambos já fora de serviço após semanas de cerco israelita) não contabilizaram os mortos que chegaram às suas instalações por estarem isolados, o que também dificulta a sua contagem.
Além disso, as equipas da Defesa Civil encarregadas de recolher os corpos das vítimas dos atentados não podem trabalhar há mais de dois meses devido aos riscos da ofensiva no Norte.
Dados publicados na revista The Lancet indicam que cerca de 3% da população de Gaza foi morta pela guerra nestes oito meses, e que 59% dos mortos eram mulheres, crianças ou idosos.
O governo de Gaza, controlado pelo Hamas, apelou na sexta-feira à comunidade internacional, às Nações Unidas e a agências humanitárias para que ajudem a documentar o "verdadeiro número de vítimas, que excede em muito as oficialmente comunicadas".
As autoridades também pedem que seja facilitado o acesso das equipas de socorro às zonas devastadas para "recuperar os corpos e assegurar o seu enterro digno, de acordo com a sua religião e as normas humanitárias internacionais".
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