O acordo foi concluído no momento em que o presidente norte-americano cessante, o democrata Joe Biden - que supervisionou a caótica retirada dos Estados Unidos da América (EUA) do Afeganistão em 2021 - entregou o poder ao atual presidente norte-americano, o republicano Donald Trump, na segunda-feira.
O governo talibã saudou a troca, classificando-a como um passo em direção à "normalização" das relações entre os EUA e o Afeganistão, mas isso continuará a ser difícil, uma vez que a maioria dos países do mundo ainda não reconhece a legitimidade do seu poder e se crê que há mais dois norte-americanos presos no país.
Em Cabul, o Ministério dos Negócios Estrangeiros talibã confirmou a troca, dizendo que dois cidadãos norte-americanos não-identificados tinham sido trocados por Khan Mohammed, condenado a duas penas de prisão perpétua em 2008.
A família de Ryan Corbett, um dos cidadãos norte-americanos encarcerados pelos talibãs, confirmou a sua libertação num comunicado. Corbett, que vivia no Afeganistão com a família aquando da queda do governo apoiado por Washington, em 2021, foi detido pelos talibãs em agosto de 2022, durante uma viagem de negócios.
"Os nossos corações estão cheios de gratidão e louvor a Deus por manter a vida de Ryan e trazê-lo de volta para casa, após o que foram os 894 dias mais desafiadores e inseguros das nossas vidas", afirmou a família num comunicado, agradecendo a Trump e a Biden, bem como a muitos funcionários do governo norte-americano, pelos seus esforços para o libertar.
A família de Ryan Corbett também saudou o Qatar "pelo seu papel vital em facilitar a libertação de Ryan e pelas suas visitas a Ryan como potência protetora dos Estados Unidos no Afeganistão".
O Qatar tem sido o mediador de negociações entre os Estados Unidos e os talibãs ao longo dos anos e esteve também envolvido nesta troca de prisioneiros.
O porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros do Qatar, Majed al-Ansari, recusou-se hoje a falar em pormenor sobre a troca de prisioneiros num encontro com a comunicação social.
"Ainda estamos a trabalhar no assunto com as partes", declarou al-Ansari, acrescentando: "Podemos confirmar que os nossos esforços estão sempre em curso, naturalmente, em todos ou muitos dos aspetos desta questão".
Tanto a estação televisiva norte-americana CNN como o diário The New York Times, citando responsáveis que solicitaram o anonimato, identificaram o segundo cidadão libertado como William McKenty, embora não se conheçam mais pormenores sobre a sua identidade ou sobre o que fazia no Afeganistão. As autoridades de Washington não responderam hoje aos pedidos de comentário, após a tomada de posse de Trump como novo presidente no dia anterior.
Mohammed, de 55 anos, cumpria pena na Califórnia após a sua condenação, em 2008, mas hoje o Gabinete dos Estabelecimentos Prisionais indicou que ele não se encontra sob a sua custódia.
Um porta-voz adjunto do Ministério dos Negócios Estrangeiros talibã, Hafiz Zia Ahmad Takal, disse que Mohammed tinha chegado ao Afeganistão e se encontrava com a família. Fotografias divulgadas pelos talibãs mostram-no a ser recebido na sua província natal, Nangarhar, no leste do país, com grinaldas coloridas.
Ele foi detido no campo de batalha em Nangarhar e depois levado para os EUA. Um júri federal condenou-o por transportar heroína e ópio que sabia destinarem-se aos EUA e, ao fazê-lo, envolver-se em ações terroristas.
Na altura, o Departamento de Justiça referiu-se a Mohammed como "um 'jihadista' violento e traficante de estupefacientes" que "tentou matar soldados norte-americanos no Afeganistão usando morteiros". Ele foi a primeira pessoa a ser condenada com base nas leis de narcoterrorismo dos Estados Unidos.
Ahmed Rashid, autor de vários livros sobre o Afeganistão e os talibãs, descreveu Mohammed como o "maior traficante de droga com que os Estados Unidos tiveram de lidar e principal financiador dos talibãs".
Antes de Biden deixar o cargo, o seu governo estava a tentar chegar a um acordo para libertar Ryan Corbett, bem como George Glezmann e Mahmood Habibi, em troca de Muhammad Rahim, um dos últimos detidos na baía de Guantánamo.
Glezmann, um mecânico de aviões de Atlanta, foi capturado pelos serviços secretos talibãs em dezembro de 2022, quando viajava pelo país; Habibi, um empresário afegão-norte-americano que trabalhava como fornecedor para uma empresa de telecomunicações sediada em Cabul, também desapareceu em 2022. Os talibãs têm negado ter Habibi na sua posse.
A família de Habibi saudou a troca e disse estar confiante de que o governo Trump fará um "esforço maior" para libertá-lo, expressando a sua frustração com a equipa de Biden.
"Sabemos que têm provas de que o meu irmão está vivo e nas mãos dos talibãs e isso poderia ter levado os talibãs a admitir que o têm", declarou o irmão de Habibi, Ahmed, num comunicado divulgado pela organização sem fins lucrativos Global Reach.
A equipa de Biden "recusou-se a usar" as provas, afirmou, acrescentando: "Sabemos que Trump se interessa é por resultados e temos fé em que ele usará todos os instrumentos disponíveis para trazer Mahmood para casa".
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