Com base em "testemunhos de altos funcionários e noutras provas", um novo relatório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACDH) descreve "uma política oficial de ataque e repressão violenta de manifestantes e apoiantes antigovernamentais, que suscita preocupações quanto a crimes contra a humanidade que exigem uma investigação urgente e exaustiva".
A antiga primeira-ministra Sheikh Hasina, que governava o Bangladesh com mão de ferro desde 2009, fugiu do seu palácio e refugiou-se na Índia em 05 de agosto, após várias semanas de motins que foram reprimidos com derramamento de sangue.
Citando "várias fontes credíveis", o relatório da ONU estima que "cerca de 1.400 pessoas poderão ter sido mortas entre 01 de julho e 15 de agosto" e que "milhares de outras ficaram feridas", de acordo com um comunicado de imprensa.
O relatório refere que a grande maioria dos mortos foi baleada pelas forças de segurança e que 12% a 13% eram crianças.
O gabinete do Alto Comissário acusa o antigo Governo, os serviços de segurança e de informações do Bangladesh e "elementos violentos" associados à Liga Awami, o partido de Hasina, de graves violações dos direitos humanos.
Hasina foi acusada de crimes contra a humanidade pelo sistema judicial do Bangladesh e é objeto de vários mandados de captura internacionais.
O ACDH afirma ter "motivos razoáveis para acreditar que os crimes contra a humanidade de assassinato, tortura, prisão e outros atos desumanos foram cometidos como parte de um ataque generalizado e sistemático contra manifestantes e outros civis considerados suscetíveis de aderir ou apoiar os protestos".
"A resposta brutal foi uma estratégia calculada e bem coordenada pelo antigo governo para se manter no poder face à oposição maciça", afirmou o Alto Comissário para os Direitos Humanos, Volker Türk, na declaração.
"Há motivos razoáveis para crer que centenas de execuções extrajudiciais, prisões e detenções arbitrárias em massa e torturas foram levadas a cabo com o conhecimento, a coordenação e a direção de líderes políticos e altos funcionários da segurança, como parte de uma estratégia para reprimir as manifestações", acrescentou.
A mobilização contra o regime de Hasina teve início em julho de 2024, na sequência de uma decisão judicial que autorizava o regresso das quotas de emprego público: esta medida foi vista como uma oportunidade para a chefe do Governo confiar os cargos governamentais a pessoas da sua confiança.
Um governo provisório liderado pelo Prémio Nobel da Paz Muhammad Yunus assumiu as rédeas do país até à realização de eleições gerais, previstas para o final deste ano ou para o início de 2026.
A pedido de Yunus, o ACNUDH enviou ao Bangladesh, em setembro último, uma equipa composta por investigadores especializados em direitos humanos, um médico forense e um perito em armamento, para analisar a repressão das manifestações.
"A responsabilização e a justiça são essenciais para a cura nacional e para o futuro do Bangladesh", para garantir que as graves violações dos direitos humanos "nunca mais se repitam", defende Volker Türk.
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