Ciudadanos histórico foi impotente para independentismo dominante
Ciudadanos foi o partido mais votado, mas o bloco independentista sai como grande vencedor da noite eleitoral de 21-D. Catalunha aguarda a resposta de Mariano Rajoy e o regresso de Carles Puigdemont.
© Reuters
Mundo Catalunha
Os últimos três meses foram de cortar a respiração na Catalunha. O processo independentista, que despertou paixões e dividiu uma região, culminou no referendo de 1 de outubro, ilegal aos olhos de Madrid, que demonstrou uma grande vontade de independência apesar do silêncio unionista. Depois, no final do mesmo mês, Mariano Rajoy largou a “bomba” e aplicou o artigo 155, suspendendo a autonomia da região e destituindo o governo autónomo (Generalitat). O resultado? Vários dirigentes presos, outros no exílio, e eleições antecipadas.
O ano de 2017 terminou na Catalunha com as eleições de ontem, 21 de dezembro (21-D). O Ciudadanos, liderado por Inés Arrimadas, foi o partido mais votado e, por esse motivo, o vencedor. No entanto, na política nem sempre quem tem mais votos reflete a maioria – basta, por exemplo, olharmos para o caso português e para a formação da chamada ‘geringonça’ para o percebermos – e, nesse sentido, o grande vencedor do 21-D é o bloco independentista, que mantém a sua maioria no parlamento regional.
Bem vistas as coisas, se olharmos para o parlamento agora formado e para o de 2015, as diferenças não são assim tantas. Dos 135 lugares, 70 são ocupados por independentistas (há dois anos eram 72) o que volta a impossibilitar que os unionistas consigam formar um governo. Ou seja, apesar de o Ciudadanos ter o maior número de deputados (37) entre os partidos eleitos, não conseguirá formar uma solução governativa, uma vez que somados os seus votos aos seus potenciais apoiantes, Partido Socialista da Catalunha (PSC) e Partido Popular (PP), juntos não ultrapassam os 57 assentos parlamentares (17 dos socialistas, três do partido que governa Espanha).
Analisados os resultados, podemos afirmar que houve vitórias e derrotas nos dois campos políticos. Começando pelos unionistas, é de salientar a vitória histórica do Ciudadanos, um partido que tem apenas 10 anos de existência e que conseguiu 'engolir' o Partido Popular, a principal força de Direita no país e que sai humilhada destas eleições. Numa região maioritariamente de Esquerda, o facto de uma formação de Direita, embora incapaz de governar, ter sido a mais votada constitui, inegavelmente, um grande feito.
Já do lado dos independentistas, o grande vencedor é Carles Puigdemont, presidente da Generalitat destituído, exilado em Bruxelas. O seu Juntos pela Catalunha contrariou as sondagens e conseguiu ser o segundo partido mais votado, obtendo 34 lugares no novo parlamento. Muitos vaticinaram a remissão do ex-presidente à insignificância, mas Puigdemont ultrapassou a Esquerda Republicana da Catalunha (ERC), que ficou com 32 lugares e cujo cabeça de lista, Oriol Junqueras, está preso, e sai deste processo como um líder pronto a regressar do exílio e a assumir-se, novamente, como presidente da região. A CUP, formação de extrema-esquerda, diminui os deputados – tem agora quatro –, o que tem um sabor agridoce. Se por um lado os seus ideais independentitstas saíram vencedores do ato eleitoral, por outro o partido acaba por perder relevância.
Depois, temos ainda o caso socialista, algo perdido em todo este processo, que mesmo assim consegue 17 lugares e, por isso, terá uma palavra a dizer. Já o Catalunha em Comum, ligado ao Podemos, conseguiu oito lugares. Apesar de não ser assumidamente independista, o partido defende a autodeterminação catalã e, à partida, será favorável a um hipotético referendo à independência.
Puigdemont sai como grande vencedor
As primeiras reações dos líderes políticos aos resultados confirmam que os próximos tempos continuarão a ser de tensão. Um dos primeiros a falar foi Xavier García Albiol, líder do PP catalão, que assumiu a derrota e demonstrou-se preocupado com o futuro da região. Preocupado estará também, certamente, o primeiro-ministro espanhol, que para lá de ter visto o seu partido humilhado na região, vê a Catalunha fugir-lhe entre os dedos e o seu papel em todo este processo posto em causa. Mais do que uma derrota de Albiol, foi uma derrota para Rajoy e do governo central.
Contente com a vitória mas certamente consciente da realidade, Inés Arrimadas falou numa “vitória de Espanha” mas rapidamente apontou baterias para a “lei eleitoral injusta”. O Ciudadanos foi o primeiro partido constitucionalista a vencer eleições na Catalunha, só que a vitória acaba por ser insuficiente.
Já nos ‘quartéis’ independentistas, a satisfação era notória. Na sede da ERC, falou Marta Rovira, número dois do partido, atacando o primeiro-ministro espanhol. “Rajoy plantou estas eleições como plebiscito ao artigo 155 e a República ganhou o 155!”, disse Rovira. “Apesar da ofensiva de tantos dias, os cidadãos da Catalunha votaram maioritariamente a favor da República”, sustentou. Oriol Junqueras certamente que ouviu o discurso com satisfação, apesar de ter sido ultrapassado por Carles Puigdemont.
O herói da noite acabou por ser, precisamente, o ex-líder da Generalitat. A partir de Bruxelas, o governante exilado realçou que “a maioria independentista continua intacta” e apelou ao fim do artigo 155. Além disso, Puigdemont e fez as contas e pediu um novo referendo à independência.
Novo referendo na calha?
Agora, como não poderia deixar de ser, coloca-se a questão: o que vai acontecer a seguir? A resposta não é fácil, e o Natal vai ser atribulado em Madrid e em Barcelona.
Por ter sido o partido mais votado, certamente que o Ciudadanos vai tentar, mesmo que simbolicamente, formar governo. Terá o apoio do PP e, à partida, de mais ninguém, a não ser que os socialistas, que apelaram a que os independentistas abandonem a “via ilegal”, decidam marcar uma posição e apoiar Arrimadas.
Dado como garantido o falhanço desta investida, é a vez de as forças independentistas assumirem funções. Apesar de terem concorrido separados a estes eleições, tanto o Juntos pela Catalunha como a ERC não terão dificuldades em formar uma coligação. Para que o seu governo passe no parlamento, só precisam da abstenção da CUP, a que se deverá juntar também o Catalunha em Comum.
Posto isto, resta saber o que acontece aos ex-dirigentes detidos ou no exílio. Antes das eleições, Carles Puigdemont prometeu regressar à Catalunha em caso de vitória do seu bloco. Veremos agora se cumpre a promessa, até porque sobre ele continua a pairar a ameaça de vir a ser preso assim que pisar solo espanhol.
Madrid terá, certamente, muita dificuldade em aceitar este resultado. É toda uma estratégia de Rajoy que falhou e, agora, a bola está do governo central de Espanha. Uma das reivindicações óbvias desta vitória independentista será certamente a convocação de um novo referendo, que não seja alvo da repressão de Madrid, uma ideia que não será do agrado de Rajoy. Será capaz de se sentar à mesa das negociações e de ceder? É a grande questão que se impõe.
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