Meteorologia

  • 05 NOVEMBER 2024
Tempo
18º
MIN 17º MÁX 21º

De um outubro histórico a uma Catalunha sem presidente (ponto por ponto)

Os avanços e recuos de um processo de independência que nunca foi decisivo, unitário ou ameno.

De um outubro histórico a uma Catalunha sem presidente (ponto por ponto)
Notícias ao Minuto

08:50 - 02/02/18 por Anabela de Sousa Dantas

Mundo Independência

Quando o governo regional catalão decidiu, em outubro, fazer um referendo pela independência deu-se início a um processo histórico em Espanha e na região autónoma. Um processo fortemente marcado por avanços e recuos e que ainda não conseguiu chegar a bom porto.

Carles Puigdemont foi a face desta tentativa separatista, levando a cabo um referendo à revelia de Madrid (e à margem da legalidade) que resultou numa vitória esmagadora (90%) do desejo de independência, ainda que apenas votado por 42% dos eleitores inscritos.

A declaração unilateral de independência que se seguiu, levou à ativação histórica do artigo 155.º da Constituição espanhola. O governo liderado por Mariano Rajoy, contando com a força do Tribunal Constitucional, como que deu por terminada qualquer possibilidade de diálogo com os separatistas, dissolvendo o governo regional e retirando poder aos seus ministérios.

As eleições antecipadas de 21 de dezembro, para formar novo governo regional, deram a vitória a um partido unionista (Cidadãos) mas o regime eleitoral catalão - assim como o português - voltou a colocar uma maioria independentista no parlamento regional, sendo este o bloco com mais assentos parlamentares.

Porém, com Puigdemont ainda exilado na Bélgica, nem o Juntos pela Catalunha nem a Esquerda Republicana da Catalunha (ERC) - cujo cabeça de lista, Oriol Junqueras, está preso - conseguem investir um presidente regional. Abaixo, ponto por ponto, a evolução dos acontecimentos.

Setembro de 2015 - "Hem guanyat!"

A coligação independentista Juntos Pelo Sim (‘Junts pel Sí’), de Artur Mas, foi a lista mais votada nas eleições autonómicas na Catalunha, a 27 de setembro. Estas eleições, segundo as intenções de Mas, funcionariam como um plebiscito à independência catalã mas acabou por revelar mais divisão do que unidade, no sentido de uma Catalunha autónoma. A lista Juntos Pelo Sim conseguiu eleger 62 deputados, mas foram precisos os 10 deputados da Candidatura de Unidade Popular (CUP, esquerda radical), lista também pró-independentista, para conseguir empossar um governo regional. Ainda assim, a maioria independentista chega ao parlamento catalão.

Janeiro de 2016 - Um líder mais agressivo para a autonomia?

Pouco antes do fim do prazo legal para formar um novo governo autonómico, Artur Mas deixa a presidência da Generalitat para dar lugar a Carles Puigdemont, por forma a facilitar o acordo entre o Juntos pelo Sim e a CUP. Os resultados aquém do esperado nas eleições de setembro haviam deixado Artur Mas desacreditado num partido que sempre o associou ao período de austeridade na Catalunha. Puigdemont, por seu turno, era um autarca que sempre apelou abertamente à independência da Catalunha.

Notícias ao MinutoArtur Mas [à esquerda] felicita Carles Puigdemont na investidura do segundo como o novo presidente regional catalão.© Reuters

Outubro de 2017 - O mês em que tudo mudou

Dia 1 - Com uma maioria de deputados no parlamento regional da Catalunha desde setembro de 2015, os partidos separatistas avançaram com um referendo sobre a independência, à revelia de Madrid. O ‘sim’ ganhou com 90% do votos, a 1 de outubro, embora o referendo tenha sido feito na forma de um censo universal, com possibilidade de votar mesmo que sem envelope, com boletins impressos em casa, urnas que mudavam de assembleias de voto e sem clarificar o processo de contagem. O Tribunal Constitucional e o governo central rejeitaram a legitimidade do mesmo. Todo o processo ficou marcado por cargas policiais e centenas de feridos. Votaram 42% dos eleitores inscritos no referendo, com uma maioria de 90% a escolher a independência, sem que quaisquer destes números tenham sido validados.

Notícias ao MinutoGuardia Civil e manifestantes em confrontos junto das urnas de voto do referendo ilegal, em Barcelona.© Reuters

Dia 10 - Dez dias depois do referendo, Carles Puigdemont anuncia a declaração unilateral de independência mas suspensa por várias semanas, no sentido de iniciar um diálogo. Uma forma de contornar o anúncio de uma decisão de seria de rutura com o governo central e com o Tribunal Constitucional. Presidente regional anunciou que queria a Catalunha como "um estado independente em forma de República", mas dentro de uma "solução concertada". Começa aqui alguma alienação entre os próprios parceiros de coligação.

Notícias ao MinutoCarles Puigdemont assina, no parlamento, a declaração unilateral de independência, com efeitos suspensos.© Reuters

Dia 21 - A 21 de outubro, Madrid, pela primeira vez na sua história, acionou o artigo 155.º da Constituição espanhola, que permite retirar autonomia à Catalunha. Pedido seguiu para aprovação no Senado espanhol.

Dia 27 - O parlamento catalão, em resposta, aprovou a declaração unilateral da independência no dia 27 de outubro, com 70 votos a favor, dez contra e dois em branco. A oposição abandonou a assembleia regional e deixou bandeiras espanholas nos lugares que ocupavam. Mariano Rajoy, primeiro-ministro de Espanha, pediu "tranquilidade a todos os espanhóis", garantindo que "o Estado de Direito restaurará a legalidade na Catalunha". O Tribunal Constitucional espanhol disse na mesma tarde que a votação não teria efeito.

Dia 27 - No mesmo dia, o senado espanhol aprovava a aplicação do artigo 155.º da Constituição espanhola e a consequente suspensão da autonomia catalã. A votação contou com 214 votos a favor, 47 contra e uma abstenção. Esta ativação implica a destituição do presidente da Catalunha e de todos os membros do seu executivo, a limitação das competências do parlamento regional e a marcação de eleições num prazo de seis meses. Carles Puigdemont arrisca detenção por rebelião, sedição e fraude.

Dia 27 - Ao final da tarde de dia 27, Mariano Rajoy, líder do governo central, anunciou as primeiras medidas do artigo 155.º da Constituição espanhola: destituição do presidente e vice-presidente da Generalitat, Carles Puigdemont e Oriol Junqueras, respetivamente; extinção dos ministérios da Generalitat, e das delegações no exterior, ficando as suas responsabilidades sobre os seus homólogos do governo central; e a convocação de novas eleições regionais, para 21 de dezembro.

Dia 30 - Depois de uma certa abertura manifestada pela Bélgica para oferecer asilo político, o presidente destituído do governo catalão, Carles Puigdemont, viajou para Bruxelas, notícia que foi anunciada por vários meios no dia 30 de outubro. Foi depois confirmado que Carles Puigdemont fugiu para Bruxelas com cinco ex-membros do governo regional.

Notícias ao MinutoManifestação contra a independência catalã, em Madrid, pede prisão para Carles Puigdemont.© Reuters

Dia 31 - No dia seguinte, 31, no primeiro discurso após a ida para a capital belga, o presidente destituído negou a intenção de pedir asilo político, atribuindo a sua ausência da região autónoma a uma espécie de pedido de ajuda europeu. "A Catalunha é um problema europeu. Estou em Bruxelas para obrigar a União Europeia a encontrar uma solução", afirmou.

Dia 31 - O Tribunal Constitucional de Espanha anunciou a suspensão da declaração de independência da Catalunha, no mesmo dia. A juíza da Audiência Nacional espanhola Carmen Lamela citou Carles Puigdemont e 13 ex-conselheiros (ministros do governo regional entretanto dissolvido) para serem ouvidos a 2 e 3 de novembro por acusações de rebelião, sedição e fraude.

Novembro de 2017 - Carles Puigdemont exilado na Bélgica

Dia 2 - Dos 14 membros da Generalitat, apresentaram-se em tribunal nove. Foi decretada prisão preventiva para oito deles (Santi Vila pediu demissão um dia antes da declaração unilateral de independência). Puigdemont e outros quatro não compareceram. Todos foram acusados de delitos de rebelião, sedição e desvio de fundos, arriscando-se a penas que vão até 30 anos de prisão.

Dia 2 - O Ministério Público pediu, no mesmo dia, prisão para os cinco ex-membros da Generalitat que foram chamados à Audiência Nacional e não compareceram: Carles Puigdemont e os quatro ex-conselheiros que estão consigo na Bélgica (Clara Ponsatí, Mertixell Serret, Antoní Comin e Lluís Puig). Decretada ainda prisão preventiva de oito ex-membros do governo catalão que se apresentaram para ser ouvidos, incluindo o ex-vice-presidente do governo autónomo da Catalunha, Oriol Junqueras.

Notícias ao MinutoCarles Puigdemont discursa, a partir da Bélgica, para apelar à libertação dos seus ex-ministros.© Reuters

Dia 3 - A juíza da Audiência Nacional Carmen Lamela decidiu emitir, no dia 3, uma ordem captura internacional para Carles Puigdemont e os quatro ex-conselheiros da Generalitat que estão na Bélgica e que não compareceram em tribunal.

Dia 5 - Tribunal belga ouviu os cinco ex-governantes catalães (Carles Puigdemont, Clara Ponsatí, Mertixell Serret, Antoni Comin e Lluís Puig) e decidiu deixá-los aguardar em liberdade o desenrolar dos acontecimentos. Embora tenham sido libertados, foram sujeitos a medidas cautelares: foram proibidos de abandonar território belga, obrigados a indicar uma residência fixa e receberam ordens para se apresentarem "pessoalmente" sempre que forem convocados pelo tribunal ou pela polícia belga.

Notícias ao MinutoCarles Puigdemont foi ouvido por um juiz belga.© Reuters

Ao contrário do pretendido por Puigdemont, em particular, e pelos independentistas, em geral, nenhum país europeu reconheceu a tentativa de secessão e muitos foram os que apoiaram a manutenção da unidade da Espanha e condenaram os separatistas.

Dia 7 - Na sua primeira intervenção pública depois da decisão da justiça belga, Carles Puigdemont criticou a União Europeia por apoiar o "golpe de Estado" tentado por Rajoy contra a Catalunha com o aval de Madrid e interpelou, inclusive, Jean-Claude Juncker (CE) e Antonio Tajani (PE).

Dia 10 - Carme Forcadell, presidente do parlamento catalão, e outros quatro deputados regionais, Lluís Corominas, Lluóís Guinó, Anna Simó e Ramona Barrufet, são libertados mediante caução. Joan Josep Nuet, foi libertado sem medidas cautelares. A presidente do parlamento catalão acatou decisão de Madrid, respeitante à aplicação do artigo 155, e disse ainda que a declaração unilateral de independência foi "simbólica".

Notícias ao MinutoImagem de Carme Forcadell à saída da prisão de Alcala Meco, em Madrid, após pagamento de caução.© Reuters

Dia 11 - Esquerda Republicana da Catalunha (ERC) anuncia que vai a eleições fora de coligação com Puigdemont (Juntos pelo Sim), chamando para cabeça de lista Oriol Junqueras (na altura, detido, porque era o número dois do Juntos pelo Sim).

Dia 12 - Candidatura de Unidade Popular (CUP), partido independentista de extrema-esquerda, segue o mesmo caminho que a ERC e anuncia corrida a título próprio às eleições autonómicas.

Carles Puigdemont anuncia que a sua lista às eleições se irá chamar Juntos pela Catalunha (Junts pel Catalunya), depois de perder a ERC, o parceiro de coligação no Juntos pelo Sim. Presidente exonerado anuncia ainda que irá fazer campanha a partir de Bruxelas.

Dezembro de 2017 - A reedição da maioria independentista

Dia 4 - Seis ex-ministros regionais do governo catalão de Carles Puigdemont que estavam detidos preventivamente (Raul Romeva, Carles Mundó, Dolores Bassa, Meritxell Borrás, Jordi Rull e Josep Turull), foram libertados no dia 4 de dezembro depois de pagarem, cada um deles, uma caução de 100.000 euros. Ex-vice-presidente, Oriol Junqueras, o ex-ministro regional Joaquin Forn e os dois dirigentes de organizações separatistas, Jordi Sánchez (Assembleia Nacional Catalã) e Jordi Cuixart (Òmnium Cultural) continuam detidos.

Dia 5 - Supremo Tribunal de Espanha retira, a 5 de dezembro, o mandado de detenção europeu Carles Puigdemont e os ex-ministros regionais Antoní Comín, Lluís Puig, Meritxell Serret e Clara Ponsatí. Juiz mantém, no entanto, o mandado de detenção espanhol contra os cinco separatistas, arriscando detenção num regresso a Espanha.

Dia 21 - Cidadãos (Ciutadans) vence eleições regionais de 21 de dezembro, conseguindo 25.35% dos votos e 37 assentos parlamentares. No entanto, a determinação constitucionalista de Inés Arrimadas e dos partidos que a poderiam apoiar - Partido Socialista da Catalunha (PSC) e Partido Popular (PP) - não foi suficiente para suplantar o bloco independentista, que foi o grande vencedor. Dos 135 lugares, 70 são ocupados por independentistas (com apenas dois lugares a menos do que nas últimas eleições, em 2015). O partido de Carles Puigdemont, Juntos pela Catalunha, conseguiu ser o segundo mais votado, obtendo 34 assentos, acima da Esquerda Republicana da Catalunha (ERC), de Oriol Junqueras, e da CUP, que perdeu inclusive dois deputados.

Janeiro de 2018 - Carles Puigdemont fica pelo caminho?

Dia 16 - Partidos independentistas Juntos pela Catalunha e ERC anunciaram, no dia 16 de janeiro, um acordo para que Carles Puigdemont seja investido como presidente da Generalitat.

Dia 17 - Roger Torrent, de 38 anos, sucede a Carme Forcadell na presidência do parlamento catalão.

Notícias ao MinutoRoger Torrent é investido no novo cargo pela sua antecessora, Carme Forcadell.© Reuters

Dia 26 - Governo espanhol apresentou, no dia 26, um recurso no Tribunal Constitucional para impugnar a decisão do presidente do parlamento da Catalunha de propor Carles Puigdemont para a presidência do executivo regional.

Dia 27 - Tribunal Constitucional espanhol decidiu, dia 27, não aceitar o recurso interposto pelo governo de Mariano Rajoy, que pretendia impugnar a candidatura de Carles Puigdemont a presidente da Generalitat. Decisão tomada, no entanto, mediante condições: Puigdemont terá de estar presente na sessão de investidura, na Catalunha, e esta terá que ser aprovada pelo tribunal supremo. Puigdemont não pode, portanto, ser investido nem por videoconferência, nem a partir do parlamento flamengo, nem por voto delegado, opções que foram avançadas.

Dia 28 - Impedidos de ser investidos por voto delegado, decisão do Tribunal Constitucional, os ex-ministros Lluís Puig e Clara Ponsat (do Juntos pela Catalunha) e Meritxell Serret (da ERC), exilados em Bruxelas tal como Puigdemont, renunciaram aos seus mandados.

Dia 30 - Presidente do parlamento, Roger Torrent, anunciou, no dia 30, o adiamento ‘sine dia’ (sem data marcada) da sessão plenária que estava prevista para a mesma tarde, com a intenção de investir Puigdemont como presidente do executivo.

Dia 30 - Parlamento catalão havia apresentado recurso à decisão do Tribunal Constitucional espanhol, que impede a investidura à distância, mas este é recusado com unanimidade, no dia 30. Para ser empossado como presidente da Generalitat, Puigdemont tem que regressar a Espanha e arriscar a detenção.

Dia 31 - Uma troca de mensagens divulgada pela Telecinco – e que não foi desmentida por Carles Puigdemont - dá a entender que o líder independentista se deu por vencido nas suas aspirações. Nas mensagens, Puigdemont escreve que foi “sacrificado” pelos seus.

Recomendados para si

;
Campo obrigatório