Tribunais e Conselho “nunca me apontaram defeitos de caráter ou altivez"
Conhecido por casos mediáticos como a Operação Marquês, o juiz Carlos Alexandre pôs em causa o sorteio que ditou que seria Ivo Rosa a conduzir a fase de instrução do processo que envolve o ex-primeiro-ministro José Sócrates. Declarações já lhe valeram a abertura de um inquérito disciplinar.
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País Carlos Alexandre
Conhecido como o ‘superjuiz’, Carlos Alexandre concedeu uma longa entrevista ao programa ‘Linha da Frente’ onde falou da infância, dos pais, da privação de bens materiais, mas também da sua carreira carreira como juiz.
Carlos Alexandre sublinhou ser apenas “um dos 1200 magistrados judiciais de primeira instância” e conta uma história que tem 13 anos para provar que, como os demais, vive do seu trabalho.
“No âmbito de um trabalho que estava a desempenhar, para um cargo que tinha concorrido, foi-me dito para me meter com pessoas do meu tamanho porque precisava do meu ordenado para sobreviver, para comer. E de facto assim é, vivo do meu trabalho”, assinalou.
Carlos Alexandre, natural de Mação, cresceu num ambiente de privação material, numa família descrita pelas gentes da terra como "humilde". "Desde pequenino, desde que me conheço, vivi sempre em dificuldades", recordou, ressalvando que o seu "percurso e historial" não fazem de si um justiceiro. "[O passado] faz de mim uma pessoa aplicada no trabalho que faço e procurando ser correto e justo nas decisões a que sou chamado a tomar. Não há aqui nenhum ajuste de contas com o passado", reforçou.
Quanto ao seu trabalho como juiz, garantiu que ao longo dos 14 anos sempre tem tratado as pessoas "por igual". "Tenho de tratá-las por igual", frisou, prosseguindo: "Aliás, tenho a pretensão de dizer que essa forma de tratamento surge documentada – bem ou mal – mas pode ser objetivada pelas gravações que existem, porque tudo o que eu faço é gravado".
Carlos Alexandre recusou ser uma muleta dos procuradores e sublinhou que "já houve ocasiões" em que discordou do Ministério Público. "O facto de concordar ou discordar não é decisivo", uma vez que tudo "é escrutinável em sede de recurso", realçou.
Em todo o caso, assegurou, os Tribunais Superiores, no que diz respeito ao mérito das decisões, e o Conselho Superior de Magistratura, nas avaliações que tem feito ao trabalho que vem desempenhando, "não me assinalaram ainda defeitos de caráter ou defeitos de pesporrência ou de altivez na forma como exerço o meu trabalho".
O polémico sorteio
Em 33 anos de trabalho, o 'superjuiz' faltou apenas dois dias ao trabalho por motivos pessoais e, por coincidência, correspondeu um deles ao dia do sorteio informático do juiz para a fase de instrução da Operação Marquês em que o computador ditou que seria Ivo Rosa a seguir com o processo. Uma "coincidência" que Carlos Alexandre até agradece. "Ainda bem que foi decidido naqueles dias", destacou.
No entanto, Carlos Alexandre levantou dúvidas sobre a aleatoriedade do sorteio, declarações que já lhe valeram a abertura de um inquérito por parte do Conselho Superior de Magistratura. Disse Carlos Alexandre, nesta entrevista à RTP, que "há uma aleatoriedade que pode ser maior ou menor consoante o número de processos de diferença que exista entre mais do que um juiz".
Questionado pelo jornalista se sente preso num labirinto [como no livro de Gabriel García Márquez], Carlos Alexandre optou por outro livro, do mesmo autor, para explicar como se sente nesta fase. "Não me sinto preso no labirinto, mas se calhar sinto-me um pouco mais no 'relato de um náufrago', tal como retratado nesse livro", disse. "Chegou a terra, sobreviveu", acrescentou. E espera também conseguir sobreviver? "Quero acreditar que vá sobreviver, pelo menos fisicamente", atirou, entre risos.
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