“Venho aqui fazer aquilo que tenho feito ao longo destes cinco anos: repor a verdade. É um longo caminho, bem sei, é um caminho mais árduo do que aqueles que fazem alegações completamente infundadas, injustas e até absurdos. Mas é isso que venho aqui fazer: repor a verdade”, limitou-se a dizer aos jornalistas, à entrada do tribunal.
O antigo primeiro-ministro começa a ser interrogado esta segunda-feira, a seu pedido, na instrução da Operação Marquês, quase cinco anos após ter sido detido por suspeitas de branqueamento de capitais, corrupção, fraude fiscal e falsificação de documento.
Também à entrada do tribunal, o procurador Rosário Teixeira disse não esperar ouvir nada de novo na fase instrutória do processo.
“Não espero ouvir nada de novo. Vamos ver o que vai ser dito. Não vamos antecipar as coisas. Mas não espero ouvir nada de novo. As matérias foram ouvidas ao longo do inquérito, não penso que haja algo de novo que seja acrescentado”, sublinhou em declarações aos jornalistas, acrescentando que esta é a defesa “normal dos arguidos”. “É natural que pretenda prestar depoimento até noutras circunstâncias do que aconteceu no outro inquérito”, acrescentou.
No Requerimento de Abertura de Instrução (RAI), o antigo primeiro-ministro reitera que "não cometeu qualquer crime, nem praticou os factos narrados na acusação, muitos dos quais nunca sequer ocorreram" e considera que isso está "exuberantemente demonstrado nos autos".
José Sócrates será o penúltimo arguido a ser interrogado nesta fase, estando previsto que o seu amigo e empresário Carlos Santos Silva preste declarações a 27 de novembro.
A fase de instrução, que é facultativa e funciona como um mecanismo de controlo jurisdicional da acusação do Ministério Público, conclui-se com a decisão do juiz de levar ou não a julgamento os arguidos e os termos em que isso acontece.
O juiz Ivo Rosa começou a instrução no final de janeiro e pretende concluí-la um ano depois, já que o debate instrutório está marcado para os dias 27, 28, 29, 30 e 31 de janeiro.
José Sócrates, que esteve preso preventivamente durante dez meses e depois 42 dias em prisão domiciliária, está acusado de três crimes de corrupção passiva de titular de cargo político, 16 de branqueamento de capitais, nove de falsificação de documentos e três de fraude fiscal qualificada.
Entre outros pontos, a acusação sustenta que Sócrates recebeu cerca de 34 milhões de euros, entre 2006 e 2015, a troco de favorecimentos a interesses do ex-banqueiro Ricardo Salgado no Grupo Espírito Santos e para garantir a concessão de financiamento da Caixa Geral de Depósitos ao empreendimento Vale do Lobo, no Algarve, e ter acordado com o seu amigo Carlos Santos Silva negócios para favorecer empresas do grupo Lena através de obras do projeto Parque Escolar.
No final de 2006, segundo a acusação, Carlos Santos Silva e Joaquim Barroca, administrador do Grupo Lena, aceitaram integrar o esquema financeiro para ocultar a origem e a propriedade dos fundos de Sócrates, tendo concordado em abrir contas para a passagem de fundos, junto do banco suíço UBS.
A Operação Marquês teve início a 19 de julho de 2013 e culminou na acusação a 28 arguidos - 19 pessoas e nove empresas - a 11 de outubro de 2017 pela prática de 188 de crimes económico-financeiros.