Os autores do livro 'Populismo - A revolta contra a democracia liberal' estabelecem paralelos entre Portugal e Espanha e consideram que a corrupção é um dos pontos mais preocupantes - no que diz respeito ao aumento do poder dos movimentos e partidos políticos nacional-populistas, nos dois países.
Roger Eatweel recordou que o Partido Popular espanhol enfrentou uma grave crise política em 2018 "devido a problemas de corrupção" e que na Região Autónoma da Andaluzia, os socialistas do PSOE, no poder desde 1982, foram afetados pelos problemas de corrupção.
"Este pode ser um aspeto importante para Portugal, sobretudo se vier a confirmar-se se o caso judicial que envolve o ex-primeiro ministro [José Sócrates] vai mesmo a julgamento, e eu não estou a dizer se vai passar ou não da fase de instrução", disse à Lusa Roger Eatweel.
Para o professor de Política Comparada da Universidade de Bath, Reino Unido, a corrupção tem sido um dos grandes fatores explorado pelos movimentos nacional-populistas e que é aproveitado "para lhes conferir" legitimidade.
"O discurso [nacional-populista] vai ser contra as elites corruptas que não se importam com a classe trabalhadora e que só estão interessadas nos seus próprios interesses. Assim, se o antigo primeiro-ministro [José Sócrates] for considerado culpado, e parece que existem fortes indícios, o caso vai ser aproveitado. Mesmo se não for condenado vai ser um fator muito importante", sublinha.
Além da questão relacionada com os processos de alegada corrupção, o autor destaca a situação económica portuguesa alertando que a estrutura do país é muito fraca e que existem muitas clivagens e desigualdades nos grandes setores ligados ao trabalho, apesar da recuperação da crise de 2008 "relativamente boa, devido aos preços do petróleo e ao turismo".
"Os números da participação eleitoral em Portugal são também muito baixos assim como a ligação das pessoas aos partidos políticos. Sendo assim, até que ponto a situação se vai manter na mesma nos próximos 10 ou 15 anos? No que diz respeito ao nacional-populismo, receio que não. Vai haver alterações", afirma.
Para Roger Eatwell é preciso igualmente "olhar" para o Vox, em Espanha - que conseguiu 10% dos votos nas eleições autonómicas da Andaluzia - e no caso português a recente eleição de um deputado do partido Chega.
Os autores sublinham que em Espanha, e em concreto na Andaluzia, a emigração foi igualmente um dos fatores importantes para a "subida do Vox" porque o país é historicamente uma rota importante da imigração (irregular) entre o norte de África e a Europa.
Para os dois académicos britânicos as rotas de imigrantes podem aumentar na Península Ibérica na medida em que se vão notando as restrições impostas por Itália à entrada de cidadãos do norte de África.
"Em Portugal, a imigração pode aumentar"
Os casos de corrupção que envolvem políticos, situação económica débil e a imigração podem ser determinantes para a alteração das lógicas políticas, de acordo com os autores do livro sobre o populismo, em países como Portugal e Espanha.
No caso concreto de Espanha regista-se a questão muito particular dos "sub-nacionalismos" basco e catalão que em Portugal não se verifica, referem os académicos britânicos.
No livro, os autores tratam da questão a nível global, sobretudo os casos, do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump; a questão da saída do Reino Unido da União Europeia e a popularidade do político britânico Nigel Farage e de Bolsonaro, no Brasil.
Eatweel e Goodwin consideram o nacional-populismo uma ideologia enraizada em antigas e profundas correntes que põem em primeiro lugar a cultura e os interesses da nação prometendo fazer ouvir a voz de um povo que se sente esquecido por "elites distantes e, amiúde, corruptas".
Genericamente, o livro defende que o nacional-populismo tem um sério potencial a longo prazo porque se baseia em enraizados fatores que não vão desaparecer no futuro próximo e que vai ter um forte impacto nas políticas ocidentais.
O livro 'Populismo - A revolta contra a democracia liberal' de Roger Eatwell e Matthew Goodwin (Editora Saída de Emergência, 304 páginas) foi lançado este mês em Portugal.
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