Foi adiado para esta quinta-feira, dia 5, o início do debate instrutório da Operação Marquês. A informação chega depois da audição ao antigo primeiro-ministro José Sócrates, esta quarta-feira, no Campus da Justiça, em Lisboa.
Nesta audição, que decorreu esta tarde e durou pouco mais de duas horas, o antigo governante - que está acusado de 31 crimes - respondeu ao juiz Ivo Rosa que a "acusação [do Ministério Público] não tem nada para acusar, inventa".
Já à saída, em declarações aos jornalistas, Sócrates acusou o Ministério Público (MP) de ter construído "um embuste".
"O MP construiu um embuste, construiu uma mentira, uma grande mentira e depois de tudo ali desfeito vem perguntar-me se sabia que uma amiga minha ainda estava no Algarve, por amor de Deus", atirou Sócrates, visivelmente irritado.
O juiz Ivo Rosa quis saber se Sócrates, conforme consta da acusação, passou as férias da Páscoa de 2006 hospedado no hotel Pine Cliffes e se estas foram pagas - cerca de mil euros - com o cartão de crédito do seu primo e arguido José Paulo Pinto de Sousa.
O antigo governante negou que tivesse estado no sul do país de férias em abril de 2006, dizendo que passou a quadra pascal com o pai em Vilar de Maçada.
Na acusação aparecem faturas em nome de José Sousa, umas com morada de Cascais e outras apenas com a mera indicação de Portugal.
Segundo o arguido, quem esteve de férias nessa altura no Algarve foi o seu primo José Paulo Pinto de Sousa, afirmando lembrar-se disso com exatidão porque a mulher deste estava grávida.
"Se vocês tiverem o mínimo de honestidade dirão aquilo que se passou. O MP diz 'o senhor esteve 20 e tal dias no Algarve e alguém pagou as férias' e vai-se a ver e eu nessa altura estava em visita oficial ao Brasil, estava no Governo presente em Bragança, estava a inaugurar a Faculdade de Medicina da Universidade da Beira Interior. A pergunta que eu deixo é que credibilidade tem esta acusação?", afirmou, garantindo que não esteve durante todo este período no Algarve.
Outro dos assuntos que consta na acusação e foi abordado pelo juiz foi a concessão do TGV ao consórcio ELOS.
Sócrates insistiu que nunca falou com o seu amigo empresário Carlos Santos Silva, que esteve ligado ao Grupo Lena e é arguido no processo, sobre o concurso para a construção do comboio de alta velocidade e que não teve qualquer intervenção durante o concurso.
"Não estive em qualquer reunião para tratarmos da adjudicação do TGV", afirmou Sócrates, acrescentando que enquanto ocupou o cargo de primeiro-ministro "raramente falava com Carlos Santos Silva".
Sócrates reiterou no interrogatório que ninguém o informou sobre como decorria o concurso e que as adjudicações eram da competência dos ministros das respetivas áreas.
As viagens governamentais a Angola, Argélia e Venezuela foram outro dos temas abordados no interrogatório, tendo o ex-governante socialista afirmado que faziam parte da diplomacia económica do pais.
Após a diligência, Sócrates explicou aos jornalistas que prestou novas declarações a pedido do magistrado porque este queria saber todos os detalhes a que respondeu com o maior gosto.
Porém, as poucas perguntas feitas pelo procurador do Ministério Público Rosário Teixeira é que irritaram o ex-primeiro ministro, que as apelidou de "ridículas".
Os jornalistas puderam assistir ao interrogatório do arguido, mas estiveram impedidos de divulgar notícias no decorrer do mesmo devido à instalação de um inibidor de sinal na sala do tribunal por ordem do juiz.
José Sócrates, que esteve preso preventivamente durante dez meses e depois em prisão domiciliária, está acusado de três crimes de corrupção passiva de titular de cargo político, 16 de branqueamento de capitais, nove de falsificação de documentos e três de fraude fiscal qualificada.
A acusação sustenta que Sócrates recebeu cerca de 34 milhões de euros, entre 2006 e 2015, a troco de favorecimentos a interesses do ex-banqueiro Ricardo Salgado no Grupo Espírito Santos e na PT, bem como por garantir a concessão de financiamento da Caixa Geral de Depósitos ao empreendimento Vale do Lobo, no Algarve, e por favorecer negócios do Grupo Lena.
O Ministério Público imputou a 28 arguidos, 19 pessoas e nove empresas, um total de 188 crimes.
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