"Como em todas as épocas de crise, temos que nos preparar para que vai haver tentativas de abusos e, mais do que nunca, é importante o papel da Autoridade para as Condições do Trabalho", salienta o antigo ministro do Trabalho, que subscreveu, com um conjunto de outras pessoas, um manifesto contra os abusos laborais.
"Precisamos tanto dos inspetores do trabalho no terreno como dos agentes da PSP. A polícia das condições de trabalho não pode estar inoperacional neste momento. Precisamos de segurança como cidadãos e precisamos de segurança de que ninguém abusa das circunstâncias especiais em matéria laboral", frisa.
As respostas laborais à crise -- nomeadamente o mecanismo do 'lay-off' -- partiram de "uma boa intenção, que é a de tornar os processos mais céleres e tornar mais fácil a resposta para que a resposta possa ser mais imediata", reconhece.
"Se não se tivesse um instrumento capaz de agir imediatamente, muito provavelmente o que teríamos seria o uso desta situação para produzir o despedimento imediato, o que seria uma situação muito pior", acredita.
Porém, alerta, "pode ter-se facilitado o abuso".
Face a isto, "uma das coisas que vai ter que mudar, e que é lamentável que depois da crise [de 2008] não tenha tido a suficiente atenção, é o reforço operacional da ACT", sublinha.
"Se precisamos de uma polícia de segurança alimentar, se precisamos de uma polícia da ordem pública, precisamos de uma polícia do mundo do trabalho", compara.
Ora, na última década, "a ACT perdeu operacionalidade" e, "sem uma forte capacidade regulatória do Estado, há um grande risco de abuso", na base da "tentativa de usar uma situação trágica em que estamos todos concentrados nas questões de saúde pública, para agir com despedimentos abusivos, eventualmente com recursos abusivos a 'lay-off'", antecipa Paulo Pedroso.
Este risco pode desencadear "uma crise social retardada", com "algumas empresas a aproveitarem estes apoios extraordinários para a seguir virem invocar que não recuperaram a tempo", e culminar na "subida explosiva do desemprego, salários em atraso, falências", enumera.
No dia 23 de abril, a ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, Ana Mendes Godinho, disse que a ACT já tinha fiscalizado mais de mil empresas que aderiram ao 'lay-off' simplificado, abrangendo cerca de 43 mil trabalhadores, desde que foi desencadeada uma ação nacional de inspeções, em 15 de abril.
Estes resultados, acrescentou então a ministra, são consequência "da capacidade acrescida que foi dada à ACT", tanto no âmbito dos recursos humanos, com reforço de inspetores, como das novas competências.
Já a CGTP tem denunciado "abusos" por parte das empresas em 'lay-off', em termos de desregulação dos horários de trabalho ou da compensação que é paga aos trabalhadores.
"Vai ser essencial que o Estado não perca a noção de que tem que ser exigente não apenas agora, contra os abusos, como depois, contra os pretextos", apela Paulo Pedroso.
"Neste momento, as atenções estão todas focadas em que morra o mínimo de empresas e se extinga o mínimo de postos de trabalho. Há o risco de, com isso, tolerarmos abusos de uma das partes, com a ausência, no terreno, de modo forte, de uma entidade reguladora e com os sindicatos e as comissões de trabalhadores limitados", realça.
Reconhecendo que o entristeceu que "o estado de emergência tenha explicitamente mexido com os direitos sindicais, no sentido negativo", Paulo Pedroso sublinha que, a par de uma ACT com "o máximo de operacionalidade, este é o momento em que também os sindicatos e as comissões de trabalhadores e, portanto, o direito coletivo de trabalho, o trabalho organizado, não deveriam ter perdido a sua voz".
O estado de emergência em vigor até sábado suspende o direito das comissões de trabalhadores, associações sindicais e associações de empregadores a participarem na elaboração da legislação do trabalho.