De cravos nas mãos e máscaras no rosto, a Liberdade voltou a sair à rua
As imagens do dia em que a Avenida da Liberdade, em Lisboa, voltou a encher-se de pessoas a celebrar a Revolução dos Cravos, ainda que com as regras impostas pelas circunstâncias da pandemia.
© Getty Images
País 25 de Abril
Se no ano passado o desfile que celebra o 25 de Abril ficou marcado pela presença de Adriano Domingues que, de forma solitária, carregou a bandeira nacional Avenida da Liberdade abaixo, este ano caminhou-se no sentido da normalidade.
Ainda que com regras próprias por causa da pandemia, muitos foram os que este domingo desceram a avenida celebrando o 47.º aniversário da Revolução dos Cravos.
O trânsito foi cortado totalmente a partir das 14h30, tendo nessa altura as pessoas ocupado toda as faixas habitualmente tomadas por carros.
Duas chaimites abriram o desfile, seguindo-se o 'quadrado' da comissão promotora - uma área fechada por panos vermelhos, onde só puderam entrar cerca de 40 pessoas autorizadas, entre as quais as comitivas do PCP, PEV, PS e da CGTP.
Pelas 15h30, os participantes, com os rostos cobertos por máscaras, um certo distanciamento entre si, e a maioria com um cravo vermelho na mão, na lapela ou até mesmo na orelha, começaram a descer a Avenida da Liberdade rumo aos Restauradores.
Nas palavras de ordem não houve mudanças: "o povo unido jamais será vencido"; "Somos muitos, muitos mil para continuar Abril"; "Abril está na rua, a luta continua" ou "25 de Abril sempre, fascismo nunca mais".
Além dos adultos, não faltaram ao desfile as crianças, os cães e até um papagaio.
A celebração da liberdade foi também oportunidade de negócio. Além da venda de cravos, um homem apregoava, de garrafas de água na mão, ser o "último estabelecimento aberto" àquela hora.
Quando a frente do desfile chegou ao destino, ouviu-se e cantou-se a Grândola, Vila Morena (de cravo no ar) e o hino nacional.
Além daqueles que integraram o desfile, como é habitual e apesar de em menor número, foram também várias as pessoas que se deslocaram à avenida para o ver passar.
Manuel Veloso é de Guimarães, mas está em Lisboa. Costuma celebrar este dia em Braga e este domingo foi a primeira vez que participou no desfile na Avenida da Liberdade.
Apesar do elevado número de participantes, sente-se seguro, até porque já foi vacinado, confidenciou à Lusa.
Quando à polémica entre a comissão promotora e alguns partidos, Manuel Veloso considera que não há "polémica nenhuma" e criticou o que considerou "oportunismo", alegando que, em ano de eleições autárquicas, "toda a agente se cola ao 25 de Abril".
"O 25 de Abril foi uns contra os outros e continua hoje na sociedade a haver quem é a favor do 25 de Abril e quem é contra. A nossa Constituição é de todos, mesmo dos que votaram contra, o 25 de Abril não é de todos, é dos democratas e de quem ama a liberdade, defendeu o vimaranense.
Leonor Vilar, 22 anos, foi até à Avenida da Liberdade com uma máscara FFP2 personalizada com bordados alusivos à Revolução dos Cravos.
Natural da "margem Sul", participa no desfile desde que "era mais nova" e faz questão de estar presente sempre que pode, notando que este ano, devido à pandemia, está "menos gente" na rua.
"É diferente o molho de pessoas que se juntava e agora como estão organizadas as pessoas", afirmou, indicando estar "de fora" a avaliar "como é que as coisas vão funcionar" antes de decidir se se juntaria ao desfile ou só continuaria a vê-lo passar.
Sobre a polémica, Leonor defendeu que "o 25 de Abril é de todos" e "pertence a todos os que queiram fazer parte do 25 de Abril".
Ana Filipa, 32 anos, quis deslocar-se à Avenida da Liberdade esta tarde "para marcar a data", que é "muito importante".
À Lusa, disse que se sentia segura, apesar dos milhares de pessoas que se concentraram naquela artéria da cidade, porque "a organização está muito boa e parece que há espaçamento entre as pessoas".
"Se podemos estar numa esplanada também podemos comemorar o 25 de Abril", defendeu.
A discórdia deste ano
Este ano, pela primeira vez o desfile oficial não foi o único a percorrer a Avenida da Liberdade, depois de uma polémica que levou a Iniciativa Liberal a organizar uma iniciativa autónoma.
A discórdia instaurou-se depois de a comissão promotora do desfile que assinala a Revolução dos Cravos ter negado a participação da Iniciativa Liberal e do Volt Portugal no evento, decisão defendida pelo contexto pandémico, mas que gerou polémica, levando posteriormente à abertura da celebração a todos os interessados, desde que cumpridas as regras sanitárias.
A comissão esclareceu que a opção de realizar este ano, "não uma manifestação popular", mas "um desfile comemorativo, com grande limitação do número de participantes", teve como objetivo garantir o cumprimento das medidas e recomendações de saúde pública e "nunca, qualquer sentimento de sectarismo ideológico".
No entanto, a Iniciativa Liberal, que já tinha anunciado a sua intenção de realizar um desfile próprio antes da abertura por parte dos organizadores, manteve a sua decisão, considerando que a mudança de posição da comissão foi "tardia" e só surgiu porque a decisão "sectária" inicial foi fortemente criticada.
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