Apresentando o plano nacional de combate à corrupção, cujas linhas gerais foram aprovadas hoje em Conselho de Ministros, Francisca Van Dunem disse que, no plano da prevenção, vai ser criado um Regime Geral de Prevenção da Corrupção.
O que significa que as entidades públicas e privadas "passam a ter a obrigação de ter planos de prevenção de riscos de corrupção, códigos de conduta e canais de denúncia para denúncias internas", sendo responsáveis pelo cumprimento dessas normas. "A violação dessas regras constitui uma contraordenação punível com coima", disse.
A ministra informou ainda que, no mesmo diploma, foi aprovada a criação de um mecanismo que é responsável, não só pela execução do Regime Geral de Prevenção da Corrupção, como pela implementação da estratégia na dimensão preventiva e recolha da informação que tenha a ver com a parte repressiva".
Esta entidade será "independente", que tem poderes de iniciativa e que "obviamente é ouvida cada vez que houver necessidade de se falar nessas matérias". Terá planos de ação trianuais e anuais que serão desenvolvidos em articulação com as várias áreas da governação, "no sentido de permitir que, através da educação, da formação profissional se consiga criar um ambiente que seja hostil a fenómenos de natureza corruptiva".
Paralelamente, o Governo identificou "há muito tempo" necessidades de intervenção no que diz respeito à repressão criminal.
A primeira - a aproximação do inquérito à data dos factos. "Muitas vezes, os inquéritos criminais iniciam-se muito depois de os factos criminais terem ocorrido, o que torna depois particularmente difícil a sua reconstituição", considerou.
Nessa medida - "e também por imposição europeias"- o Governo aprovou hoje o diploma que transpõe para a ordem jurídica interna a diretiva relativa à proteção dos denunciantes. Este estabelece, por um lado, a existência de canais específicos de denúncia, e por outro lado, proíbe a existência de atos de retaliação.
Ainda sobre a repressão criminal, "há vários momentos, conhecidos de todos, (...) em que há constrangimentos". Essas dificuldades são visíveis ao nível da "conexão dos processos - da junção de muitos factos no mesmo processo [os chamados megaprocessos]. Há uma intervenção do processo penal no sentido de facilitar a separação de processos e assegurar a possibilidade de o Ministério Público avaliar as situações isoladamente", disse.
O Executivo identificou ainda a necessidade de "quebrar os pactos de silêncio". "Como sabem, crimes de corrupção são crimes sem vítima, aparentemente. Lesam interesses macro-sociais. E existem pactos de silêncio que, normalmente, envolvem agentes associados à prática".
Ora, no sentido de ajudar a romper esses pactos de silêncio, e facilitar o acesso à prova, "o Governo vai propor ao Parlamento que seja possível a dispensa da pena, em determinadas condições, melhorando o mecanismo que já existe hoje". Nas palavras da ministra, "não se trata de criar nada de absolutamente novo". "Trata-se de simplificar as regras que hoje já existem relativas não só à dispensa da pena como também relativas à acumulação da pena", esclareceu.
Numa outra dimensão, "houve a preocupação de intervir também, por um lado, atualizando os prazos de prescrição, e por outro lado, atualizando o conceito de funcionário para efeitos penais".
Neste ponto, o Governo prevê uma harmonização dos prazos de prescrição de 15 anos para crimes de corrupção e outros económico-financeiros cometidos por funcionários e detentores de cargos políticos.
No que toca à dimensão do julgamento, tendo em conta que "não temos neste momento, e não podemos provavelmente ter, formações especializadas para julgar estas categorias de crimes" e considerando que o grau de complexidade destes crimes e o seu volume "tornam difícil a fase de julgamento", o Governo identificou um mecanismo, que são os acordos sobre a pena aplicável, que permitem uma negociação, na fase de julgamento, entre o arguido, o Ministério Público e o juiz. Acordo esse que incide sobre os limites máximos e mínimos das penas aplicáveis.
O Governo deliberou ainda sobre o acesso direto a informação bancária por parte das autoridades judiciárias e alguns órgãos de polícia criminal perfeitamente delimitados.
No quadro da estratégia, o Executivo aprovou a criação de um mecanismo que permitirá a todos acompanhar as várias interações que vão existindo ao longo de um processo legislativo.
"Ou seja, vai ser criado agora, e em modo experimental, um projeto que no futuro permitirá a qualquer cidadão acompanhar e saber com quem é que o Governo interagiu, relativamente a um certo processo legislativo, desde o princípio até ao fim".
Terminando a apresentação, a ministra disse que o Governo "está fortemente empenhado neste pacote. Não na perspetiva meramente formal, mas na perspetiva de criar condições efetivas quer à prevenção quer à repressão de fenómenos corruptivos e, sobretudo, conseguir que haja uma prevenção efetiva" através da aplicação de sanções.
"Por vezes, os resultados não são compatíveis com as expectativas"
Van Dunem conclui reconhecendo que "gera alguma incompreensão no plano social" a existência de processos muito longos e que, por vezes, "os resultados não são compatíveis com as expectativas".
Sobre a não inclusão da criminalização do enriquecimento injustificado na Estratégia, a ministra considerou que essa matéria faz parte do pacto de transparência e que qualquer alteração à lei já existente é da responsabilidade do Parlamento.
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— República Portuguesa (@govpt) April 29, 2021