Cliente diz que foi "enganado três vezes no mesmo dia"
Um dos 30 clientes que se dizem lesados pelos ex-gestores do Banco Privado Português (BPP) e que pediram para serem assistentes no processo da Privado Financeiras disse hoje em tribunal que foi enganado três vezes no mesmo dia.
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País Caso BPP
"Fui enganado três vezes no mesmo dia", afirmou Acácio Silva, cliente da Privado Financeiras que perdeu dois milhões de euros com o seu investimento neste veículo do universo BPP que investia exclusivamente em ações do Banco Comercial Português (BCP).
"Não fui informado sobre o NAV [situação líquida do veículo] negativo. Apresentaram-me um financiamento já pronto [para acompanhar o aumento de capital da Privado Financeiras de forma a aumentar a posição do veículo no BCP, no âmbito de uma operação de capital do banco no início de 2008] que eu não queria, e desviaram o dinheiro, que me disseram que era para comprar ações do BCP, para pagar dívida [da Privado Financeiras]", especificou.
O cliente revelou perante o coletivo de juízes que, na altura destas operações, não tinha liquidez para participar no aumento de capital da Privado Financeiras, mas que foi convencido pelo seu 'private banker' [gestor de fortunas] a recorrer a um financiamento do BPP.
"Não tinha liquidez. Cheguei a levantar-me para me ir embora. Infelizmente, fiquei e cedi à argumentação [do seu gestor]", lamentou Acácio Silva.
E reforçou: "Fui enganado três vezes em hora e meia".
"Sabia que o NAV [do veículo em causa] era baixo porque o meu investimento tinha desvalorizado. Investi inicialmente um milhão de euros na Privado Financeiras e fui convencido a investir mais um milhão de euros neste aumento de capital", revelou, assegurando que não teve acesso ao NAV "nem neste, nem nos outros veículos" do universo BPP em que investiu.
O investidor disse ainda que só em janeiro de 2009 ficou a saber "que o NAV era negativo", mas admitiu que antes disso, quando viu declarações de João Rendeiro sobre o banco, percebeu "que alguma coisa não estava bem", frisou.
Acácio Silva disse que desconhecia o financiamento de emergência prestado pelo próprio BPP ao veículo, bem como o empréstimo concedido pelo JP Morgan ao mesmo e que não teria participado no aumento de capital "se soubesse que era para pagar dívidas ao banco".
Perante as várias perguntas que as partes lhe colocaram, Acácio Silva, economista de profissão, disse estar habituado às regras do mercado.
"Perder [dinheiro com investimentos arriscados] é normal", considerou, revelando que também perdeu dinheiro noutro veículo do universo BPP (Kendall, que investia em títulos das concessionárias de auto-estradas Brisa e da OHL Brasil).
"As ações destas empresas baixaram de cotação. Ninguém tem culpa disso. Mas o aumento de capital [da Kendall] serviu exatamente para o que foi dito. As ações desvalorizaram e isso é responsabilidade minha", salientou.
O responsável, cuja advogada é Fátima Godinho, revelou que também perdeu dinheiro em "fundos de investimento do BCP e do BPI", mas que isso faz parte do risco de investir em bolsa.
João Medeiros, um dos advogados de defesa de João Rendeiro, alegou então que havia detetado "contradições" entre o testemunho de Acácio Silva em tribunal e o seu depoimento durante a fase de inquérito do Ministério Público, pelo que solicitou que o último fosse lido em julgado.
O procurador do Ministério Público não se opôs a esta pretensão e o coletivo de juízes liderado por Nuno Salpico aceitou o pedido de João Medeiros.
Depois das alegações iniciais dos três arguidos neste processo, nas quais apenas o fundador do BPP, João Rendeiro, usou do direito à palavra, nesta terceira sessão do julgamento está a ser ouvido um dos clientes que se diz lesado pelo investimento feito na Privado Financeiras e que se constituiu como assistente no processo.
Segundo a calendarização do tribunal, hoje deveriam ter sido ouvidos dois clientes e assistentes no processo durante a manhã, mais outros dois à tarde.
Porém, a manhã foi toda 'por conta' de Acácio Silva, que continuará a ser ouvido da parte da tarde, sendo expectável que só haja tempo para ser ouvido um outro cliente.
No julgamento do caso Privado Financeiras, os investidores deste veículo, entre os quais se destacam Francisco Pinto Balsemão, Stefano Saviotti e Joaquim Coimbra, alegam que foram lesados em mais de 40 milhões de euros.
Os arguidos, João Rendeiro, Paulo Guichard e Salvador Fezas Vital, são acusados pelo Ministério Público (MP) de burla qualificada em coautoria.
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