CSM quer acelerar formação de juízes para colmatar défice
O vice-presidente do Conselho Superior da Magistratura alertou o Ministério da Justiça que nos "próximos tempos" 80 a 100 juízes vão aposentar-se, havendo "necessidade de substituir o quadro de juízes" e acelerar a formação de magistrados.
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País Juízes
Estas foram algumas das revelações feitas em entrevista à agência Lusa pelo vice-presidente do Conselho Superior da Magistratura (CSM), José António Lameira, que disse existir "um défice de juízes" e tribunais que "ainda não têm juiz", estando de momento o CSM a "processar o movimento [anual] de juízes da 1.ª instância".
"Temos sempre problemas com as licenças de maternidade ou com baixa por motivos de doença, prevendo-se muitas jubilações, e este ano houve bastantes", afirmou, notando que "tudo isso" causa "uma carência tremenda de quadros".
Quanto à falta de juízes, o vice-presidente do CSM admitiu que está prevista na lei uma "bolsa de juízes", mas notou que esta "se esgota a ela própria quando os juízes colocados na bolsa entram de licença de maternidade" ou de baixa, e "não há quem os substitua".
"A bolsa de juízes tem muito poucos juízes para substituir todas essas situações de licença de maternidade, doença ou outras", afirmou, dizendo que o CSM alertou a ministra da Justiça e o diretor do Centro de Estudos Judiciários (CEJ) para a eventual necessidade de "encurtar o curso [para juízes], como ocorreu no passado, ou "criar um curso especial para solucionar" o problema.
Segundo indicou, nos últimos dois anos a renovação anual do quadro de juízes oscilou entre 35 e 40 e idêntico número está previsto para 2022, pelo que será preciso "um curso especial" de formação de juízes ou "encurtar os cursos".
José António Lameira refutou críticas de quem acusa o CSM de "não prever o futuro".
Referindo que no Tribunal de Comércio de Lisboa, "onde há largas dezenas ou centenas de processos anteriores a 2014", o CSM, em conjugação com o presidente da Comarca "está a tentar formar uma equipa de reforço não só para solucionar os processos que se encontram parados e muitos deles antigos", mas também para enfrentar um eventual acréscimo de processos" resultantes da pandemia.
Admitiu que, com a pandemia por covid-19, é previsível que surjam mais processos na área dos tribunais do Comércio e do Trabalho, observando que tudo vai "depender as medidas que o poder político tomar", pois o CSM "não sabe se as moratórias ao crédito vão ser prolongadas" e se "vai haver restruturação das dívidas das famílias e das empresas", situações que "vão condicionar a litigiosidade nos tribunais".
Realçou que, ao contrário do que muitos previram durante a pandemia, não houve, em setembro de 2020, uma avalancha de processos, assim como não ocorreu em janeiro de 2021, quando tantos anunciavam que ia ser o "caos" nos tribunais.
"Os tribunais, ao contrário do que se possa pensar, durante a pandemia acabaram mais 13.226 processos do que aqueles que entraram", embora reconheça que nesse período o volume de processos entrados também decresceu.
Assinalou contudo que "nos últimos anos se assiste a uma diminuição substancial das pendências nos tribunais", rejeitando a ideia que isso resulta basicamente do valor elevado das custas judiciais, que dificultam o acesso à justiça.
Em termos numéricos, o vice do CSM revelou que nos últimos meses deste ano entraram nos tribunais 324 mil processos e findaram 330 mil, mercê da resposta positiva dos juízes e dos tribunais.
Na entrevista, acerca da crescente desjudicialização e privatização da justiça, José António Lameira disse "não ter nada contra a arbitragem", mas criticou e disse não poder aceitar que "seja o próprio Estado a não confiar nos tribunais estaduais e a socorrer-se das arbitragens".
"Isso é que não aceito. Não aceito que o setor público ou o setor estadual na resolução de litígios com particulares privilegie a arbitragem em detrimento dos tribunais estaduais. O Estado não pode desconfiar de si próprio", enfatizou.
A arbitragem é um método de resolução de conflitos, no qual as partes definem que uma pessoa ou uma entidade privada irá solucionar a controvérsia apresentada pelas partes, sem a participação dos tribunais comuns, sendo que alguns casos dirimidos pelo Estado em arbitragem atingem valores de milhões de euros.
Ainda sobre a arbitragem, vincou que o CSM "é bem claro" em considerar que os juízes não podem participam nas arbitragens, mesmo que estejam jubilados, embora diferente seja a situação dos colegas aposentados.
Numa altura em que decorre processo disciplinar relacionado com uma arbitragem efetuada nas instalações da Relação de Lisboa pelo antigo presidente daquele tribunal, Vaz das Neves, o vice do CSM garantiu que atualmente o CSM "não tem conhecimento" de qualquer outro caso envolvendo um juiz.
Alertou contudo que há "uma situação em que é a própria lei que impõe que seja um juiz a fazer a arbitragem", nomeadamente no Tribunal Arbitral do Desporto, embora não possa haver remuneração.
Admitiu que esta lei do Tribunal Arbitral do Desporto possa colidir com o Estatuto dos Juízes, gerando conflito de leis, mas avançou que não vai ser o CSM "a levantar a questão".
Questionado sobre alegadas irregularidades e outras críticas apontadas ao concurso de graduação de juízes desembargadores para acesso ao Supremo Tribunal de Justiça, José António Lameira, que integrou o júri, ironizou que, muitas vezes, "só o primeiro [classificado] fica satisfeito e os outros ficam todos zangados", assegurando que o trabalho do júri foi "sério" e "honesto", tendo algumas reclamações sido já decididas pelo STJ, não dando razão aos reclamantes.
Quanto à critica de o CSM não quis discutir a proposta com a Associação Sindical dos Juízes Portugueses (ASJP) sobre transparência interna da classe, respondeu serem "naturais as tensões". Confirmou que o CSM "não subscreveu a proposta" e disse foi o plenário daquele "órgão de Estado" (CSM), que "não quis receber a ASJP".
Em contrapartida, realçou que CSM e ASJP tem grupos de trabalho em conjunto para tratar de matérias como "inspeções e complexidade de processos" e que o CSM deu já pareceres a diplomas do BE, PCP, PSD, CDS, CHEGA e do PS sobre a questão das "obrigações declarativas [de rendimentos] e crime de ocultação e enriquecimento".
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