"Foi dos documentos mais 'sui generis' que já vimos entre dois banqueiros. Esta diligência de busca em 2016 aconteceu quando Helder Bataglia estava fora do país e há mais de um ano tinha um mandado de captura internacional", explicou na segunda sessão do julgamento, no Juízo Criminal de Lisboa, o coordenador da investigação da Autoridade Tributária na Operação Marquês, sublinhando: "Na gíria da investigação dizemos que isto é prova plantada".
Em causa está um documento - sem reconhecimento notarial - apreendido no cofre da casa do empresário luso-angolano e antigo líder da ESCOM, segundo o qual existiria uma dívida de Bataglia a Salgado no valor de dois milhões de euros desde 1999 e sobre a qual ambos teriam acordado dez anos depois o pagamento de 2.750.000,00 euros, incluindo juros de 750 mil euros sobre o montante original.
Esta operação está associada a um dos três crimes de abuso de confiança sob os quais Ricardo Salgado responde neste processo conexo à Operação Marquês, tendo origem na sociedade Green Emerald, na Suíça, controlada por Helder Bataglia, para a sociedade offshore Savoices, controlada por Ricardo Salgado.
O advogado do antigo presidente do BES, Francisco Proença de Carvalho, reagiu de imediato à afirmação da testemunha e questionou se havia sido interposto algum processo por falsificação. "Como é que sabe que foi plantada?", perguntou, mas o tribunal acabaria por desvalorizar a situação.
Além deste tema, a defesa de Ricardo Salgado questionou o papel de Paulo Silva no processo da Operação Marquês, com o inspetor a admitir ter participado "na definição da estratégia de investigação", tendo feito "sugestões de diligências" e integrado "muitas inquirições" no âmbito desse caso.
A defesa do ex-banqueiro procurou ainda encostar a testemunha à sua análise pessoal e não a um conhecimento direto dos factos ou através de testemunhos de intervenientes. Paralelamente, Francisco Proença de Carvalho contestou ainda a tese de uma gestão centralizadora de Ricardo Salgado, levando Paulo Silva a reconhecer que "pontualmente" eram dadas ordens na ES Enterprises por outros membros da família Espírito Santo.
Já em relação a um manuscrito cuja autoria Paulo Silva atribuíra a Ricardo Salgado, o inspetor da Autoridade Tributária assumiu, em resposta a questão dos advogados do antigo presidente do BES, que não foi feita uma perícia forense.
O julgamento de Ricardo Salgado prossegue agora na próxima terça-feira.
O antigo presidente do BES foi pronunciado pelo juiz de instrução Ivo Rosa por três crimes de abuso de confiança, em processo conexo e separado da Operação Marquês.
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