"Acho que é um tema sério. Não havendo um acusador, não havendo até, por vezes, a identificação de quem cometeu o crime, não pode haver processo para contraditório", referiu José Ornelas na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias.
No entanto, "manda a lei e o bom senso que se tenha em vista [prevenir] a repetição do mal", através do afastamento cautelar da pessoa que seja visada numa queixa anónima, adiantou o também bispo de Leiria-Fátima na Assembleia da República, onde foi ouvido a pedido do Chega e do PS.
"Uma denúncia, mesmo anónima, não me entra por um ouvido e sai pelo outro. Vou tomar a sério a questão, mas também se não tiver algo que faça [ser] plausível, isto é, que seja possível que tenha acontecido, eu não vou afastar ninguém", salientou o presidente da CEP.
José Ornelas adiantou ainda que o Dicastério para a Doutrina da Fé, no Vaticano, constitui a instância de referência para avaliação superior destes casos.
Aos deputados, o bispo reiterou ainda que "ninguém que tenha sofrido dramas deste género vai ficar sem ajuda", a primeira preocupação da Igreja nesse processo, mas salientou ser também "fundamental" tratar os abusadores de menores.
"Uma pessoa que comete crimes desta natureza não pode estar à frente de uma comunidade, particularmente onde haja crianças", assegurou José Ornelas.
Para além de serem afastadas, se "essas pessoas têm verdadeiramente uma tendência pedófila para abusar de crianças, isso tem de ser tratado e com muito cuidado, porque não é fácil para essa pessoa libertar-se dessa tendência. Vão ter uma vida pouco feliz e vão fazer pessoas infelizes", afirmou.
O presidente da CEP reconheceu ainda que "não foi fácil estar no dia 13 de fevereiro, na Gulbenkian, na primeira linha, a ouvir aqueles depoimentos de pessoas", aquando da apresentação do relatório da comissão independente, alegando que foram "impactantes, revoltantes e causa de vergonha e de preocupação justa para com as pessoas".
Esta comissão, coordenada pelo pedopsiquiatra Pedro Strecht, validou 512 dos 564 testemunhos recebidos, apontando, por extrapolação, para um número mínimo de vítimas da ordem das 4.815.
Vinte e cinco casos foram reportados ao Ministério Público, que deram origem à abertura de 15 inquéritos, dos quais nove foram já arquivados, permanecendo seis em investigação.
Estes testemunhos referem-se a casos ocorridos entre 1950 e 2022, período abrangido pelo trabalho da comissão.
Já em 26 de abril, foi apresentado o novo grupo de acompanhamento das situações de abuso sexual de crianças e adultos vulneráveis no contexto da Igreja Católica em Portugal, denominado Grupo VITA, liderado pela psicóloga Rute Agulhas.
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