A conclusão é do estudo "As mudanças nas políticas de acesso ao ensino superior durante a covid-19: Impacto na equidade", promovido pelo Edulog, o 'think tank' para a Educação da Fundação Belmiro de Azevedo, que procurou perceber se o aumento do número de estudantes se traduzia em maior equidade.
"Quando começamos a dissecar os resultados, o que percebemos é que mais não significa melhor, mas mais dos mesmos", disse à Lusa Orlanda Tavares, uma das coordenadoras do estudo.
No ano letivo 2021/2022, mais de 49 mil estudantes conseguiram colocação na 1.ª fase do concurso nacional de acesso ao ensino superior, o número mais elevado em três décadas.
O aumento, que se repetiu no ano seguinte, está em parte relacionado com as regras excecionais de conclusão do ensino secundário e acesso ao ensino superior implementadas durante a pandemia, mas as alterações não eliminaram desigualdades nem barreiras preexistentes.
"São os mesmos estudantes que já entravam sem essas medidas que continuaram a entrar, porque os grupos mais vulneráveis tiveram as mesmas dificuldades para ingressar no ensino superior", explicou Orlanda Tavares.
Ser o primeiro da família a frequentar o ensino superior ou ter notas mais baixas na escola são fatores associados a uma menor probabilidade de continuar a estudar depois do secundário, mas também entre os diplomados de cursos profissionais há uma percentagem significativamente mais baixa de alunos que seguem para o superior (22% contra 72% de cursos científico-humanísticos).
"São estudantes cujos pais têm pouca escolaridade, têm dificuldades financeiras e, portanto, estes alunos que tradicionalmente não iam para o ensino superior continuaram a não ir", refere a coordenadora.
Por outro lado, o estudo aponta uma maior probabilidade de transitar para o ensino superior entre os alunos de nacionalidade portuguesa, alunos que frequentaram escolas privadas, com pais diplomados, ou com bons resultados académicos.
Aqueles que conseguiram furar as barreiras, chegaram às universidades e enfrentaram dificuldades acrescidas e, por isso, muitos não conseguiram acabar o curso no tempo esperado ou acabaram mesmo por desistir.
Olhando para o sucesso académico dos alunos, o estudo conclui que é maior nos cursos com mais estudantes mulheres, mais alunos inscritos na primeira opção, com pelo menos um dos pais diplomados e bolseiros.
É entre os trabalhadores-estudantes, estudantes internacionais e admitidos via concursos especiais que as taxas de abandono são mais altas e, além das barreiras anteriores ao seu ingresso no ensino superior, como o contexto socioeconómico ou a preparação inadequada, os alunos podem deparar-se com desafios adicionais.
Na decisão de abandonar os estudos, têm impacto, por exemplo, expectativas desfasadas em relação ao curso, dificuldades financeiras e dificuldade em conciliar o trabalho e os estudos, exigências académicas elevadas ou dinâmicas sociais e cultuais insuficientes, sobretudo em zonas do interior.
"As barreiras são as mesmas desde sempre, a pandemia acaba só por agravá-las", resume Orlanda Tavares, referindo que durante a pandemia o abandono escolar se agravou em todas as áreas científicas e há efeitos desse período que vão continuar a sentir-se nos próximos anos.
Entre as recomendações deixadas no estudo, a investigadora sublinha a necessidade de mais apoios aos estudantes, recordando que os dados apontam que os bolseiros são, de certa forma, "protegidos do abandono".
Por outro lado, defende a diversificação das vias de acesso, intervenções pedagógicas e de apoio académico, como tutorias e mentorias, e maior integração social e envolvimento estudantil, sobretudo no primeiro ano.
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