Rever "lei das escutas" pode fazer cair "investigações", diz PGR
A procuradora-geral da República alertou hoje para o risco de uma eventual revisão da lei de recurso a escutas fazer cair algumas investigações judiciais, sublinhando que o número de interceções telefónicas diminuiu nos últimos anos.
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País PGR
"A opção existe e é óbvio que pode ser alterada, ainda que consideremos que a lei, tal como está, está bem. O Ministério Público [MP] apenas recorre a escutas quando justamente e de forma criteriosa percebe que elas são essenciais", começou por dizer Lucília Gago, complementando: "Se for outra a opção do legislador, algumas investigações poderão vir a soçobrar. É bom que não tenhamos qualquer dúvida".
Em audição na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias, a propósito da apresentação do relatório de 2023 do MP e na sequência de vários processos mediáticos que agitaram a sociedade, a procuradora-geral da República (PGR) frisou também que o máximo de escutas foi atingido em 2015, com mais de 15 mil interceções, enquanto em 2023 ficaram abaixo das 11 mil.
"Em qualquer circunstância, as escutas carecem de autorização judicial e de renovação dessa mesma autorização. Ou seja, tem de haver do magistrado titular do processo a avaliação de recorrer a escutas e também da magistratura judicial idêntica leitura, não só naquele momento como aquando das renovações", referiu.
Questionada sobre o tempo prolongado de realização de algumas escutas telefónicas que vieram a público no último ano, a procuradora-geral da República destacou que essas situações "são absolutamente excecionais" e apenas ocorrem porque "se reconhece a necessidade para as finalidades do inquérito".
Lucília Gago salientou também que o peso das escutas nos inquéritos é reduzido e "tem vindo a diminuir de forma sustentada", notando que "os inquéritos com escutas nunca atingiram 2,5% dos inquéritos em cada ano e em 2023 não chegaram a 1,5%".
Apesar de ter sido questionada por praticamente todos os partidos sobre a alegada existência de uma "campanha orquestrada" contra o MP, conforme denunciara na entrevista em julho à RTP, Lucília Gago nunca respondeu sobre essa matéria.
A procuradora-geral ignorou também o suposto envolvimento do ex-primeiro-ministro António Costa no processo Operação Influencer, embora confrontada diretamente sobre essa situação pelo deputado do PCP António Filipe.
Entre as matérias mais enfatizadas pelos diversos partidos nas suas intervenções esteve a violação do segredo de justiça e a omissão desta questão no relatório de atividades, bem como a falta de resultados no combate a essa situação. No entanto, Lucília Gago afastou a responsabilidade do MP e salientou que um eventual reforço da investigação desse crime poderia levar à utilização de mais interceções telefónicas.
"O MP surge como tendo sobre si uma presunção de culpa, o que é uma coisa extraordinária. Esse clima interessa aos arguidos e respetivas defesas, sob efeito de se vitimizarem e desviar o foco das suspeitas de crimes de assinalável gravidade", declarou, reforçando: "Se se pretende perseguir e punir os responsáveis pela violação do segredo de justiça, teremos de autorizar o recurso a meios intrusivos de prova, como as escutas".
Lucília Gago defendeu também, perante a insistência dos deputados, que os excessos nos interrogatórios prolongados para arguidos detidos, como os 21 dias registados no caso de alegada corrupção na Madeira, "foram situações absolutamente excecionais".
Considerou ainda que a impugnação em 2021 da diretiva sobre o exercício dos poderes hierárquicos, apresentada pelo Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), "não invalida que se mantenha em vigor" e assegurou que "não foi reportado qualquer constrangimento" e que "está esclarecida a intervenção hierárquica que pode acontecer" no MP.
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