"Ou criamos todos e definimos todos um pacto verde e evitamos muita discussão ou então isto é um problema que se vai adiar, porque este ano não se vão tomar grandes decisões [...]. Este pacto seria bom para pôr gelo em muitas das discussões que se vão fazer no calor das eleições autárquicas", afirmou Hugo Pires, referindo que "muitas vezes" se ganham ou perdem eleições por causa dos preços da água e dos resíduos.
Participando no encontro nacional promovido pela Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP) sobre o futuro dos resíduos, que decorre em Lisboa, o ex-secretário de Estado do Ambiente, que também já foi autarca na Câmara Municipal de Braga, disse que não se consegue ter uma política de resíduos eficaz ambientalmente "quando há municípios que não cobram um euro de taxa de resíduos", referindo que o problema quanto à atualização dos preços cobrados é de "uma percentagem muito reduzida" de autarquias.
"Proponho um pacto entre os grandes partidos, entre movimentos independentes, um pacto para a sustentabilidade e um pacto verde, para que as eleições e a campanha autárquica não resvalem para um problema do preço da água", desafiou Hugo Pires.
O socialista começou a sua intervenção por questionar como é que Portugal chega a 2035 a depositar somente 10% dos resíduos que produz em aterro, salientando que atualmente o país produz cinco milhões de toneladas de resíduos por ano, com 59% a ser depositado em aterro.
É necessário, indicou, desviar 2,5 milhões de toneladas de resíduos da deposição em aterro e perceber como valorizar estes resíduos sólidos urbanos.
"Isto não se faz sem os municípios, e os municípios são importantíssimos nesta política ambiental e nesta corrida contra o tempo que nós temos que fazer para atingir as metas com que nos comprometemos com a Comissão Europeia", declarou o ex-governante.
Na sua leitura, um dos problemas neste âmbito é o financiamento, mas também há uma questão que se prende com os próprios municípios, que têm "ciclos curtos" de governação, com eleições de quatro em quatro anos.
"Os autarcas - perdoem-me, porque eu também já o fui - chegam ali ao último ano do seu mandato e não querem confusões e querem estabilidade, e, portanto, não querem grandes transformações na gestão do seu município e isso é um problema", apontou, destacando a atualização dos valores de contrapartida atribuídos aos municípios para assegurarem o serviço público de recolha dos resíduos urbanos.
Sobre a valorização dos resíduos, com o aumento da reciclagem em vez da deposição em aterros, o ex-governante disse que existem hoje "problemas graves". Portugal, acrescentou, tem 35 aterros e a maioria deles esgotará a sua deposição em 2027, pelo que urge encontrar soluções para o futuro.
Entre as medidas a tomar, Hugo Pires priorizou a sensibilização das populações, com uma campanha nacional sobre a necessidade de reciclar, assim como a redução da produção de lixo, apostando, por exemplo, na compra a granel.
Outros dos passos são assegurar uma recolha de resíduos "mais eficaz e mais eficiente" e garantir a aplicação do princípio do "poluidor pagador", em que existem exemplos "excelentes" em Guimarães e na Maia, para que a cobrança seja feita consoante o que se produz, apontou, sugerindo ainda a separação da faturação dos consumos de água e os custos da gestão dos resíduos.
Hugo Pires defendeu ainda ser preciso incentivar os privados a colaborarem com os municípios, referindo haver empresas que andam à procura dos orgânicos, porque querem montar instalações e infraestruturas de produção de biometano (um gás oriundo do biogás).
O encontro promovido pela ANMP discute hoje o subfinanciamento e as soluções para que os municípios consigam cumprir as metas de reciclagem previstas no plano nacional de resíduos, já em atraso.
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