Reforma Agrária só teria resultado com "colaboração dos comunistas"
António Barreto, ministro da Agricultura do I Governo Constitucional, em 1977, acredita que, "se os comunistas tivessem colaborado" a Reforma Agrária teria resultado e o Alentejo "seria hoje diferente".
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País António Barreto
Em entrevista à agência Lusa, a propósito da chamada "Lei Barreto" de 1977, que ditou o princípio do fim das ocupações de herdades no Alentejo e Ribatejo, o investigador considera que, se a Reforma Agrária tivesse resultado, "o Alentejo seria hoje diferente".
A longo prazo, os comunistas "perderam tudo", afirmou o autor do livro "Anatomia de uma Revolução", originalmente publicado em 1987 e que foi reeditado este mês pela editora D. Quixote.
Em vez das ocupações das herdades, feitas até com a ajuda das Forças Armadas, António Barreto defendia a distribuição de terras e a criação de cooperativas, "uma ou outra maior" - essa é uma reflexão que faz hoje, passados 40 anos sobre a Reforma Agrária.
"Se eles [comunistas] não tivessem reagido, se tivessem colaborado na ideia de fazer cooperativas de médios agricultores, familiares, uma ou outra maior... Se tivessem colaborado, tínhamos feito uma Reforma Agrária", disse à Lusa.
Ao contrário, os comunistas "reagiram e perderam tudo" e não há UCP's, as famosas Unidades Coletivas de Produção.
"Hoje não sobra nada do ponto de vista agrícola", acrescentou e perdeu-se uma oportunidade de ter um "Alentejo mais produtivo".
António Barreto distingue o que resta hoje da Reforma Agrária, que, durante anos, levou à ocupação de 1,1 milhões de hectares no Alentejo e Ribatejo, entre o social e político e na agricultura.
Se do ponto de vista agrícola, não resta nada, do ponto de vista social e político o ganho é diferente.
"Naqueles anos da brasa, os proprietários tiveram medo, receio. E muitos trabalhadores que tinham receio do patrão, - "o patrão tinha direito de vida sobre nós, os nossos filhos" --, muitos deles ganharam uma espécie de dignidade própria, pessoal", descreve na entrevista à Lusa.
A democracia, além da Reforma Agrária, "também ajudou".
"O facto de as pessoas terem que votar, quando o proprietário precisa do voto até do trabalhador. Quando um trabalhador ou um sindicalista precisam do voto da classe média ou até das classes altas, as pessoas estimam-se mais. A democracia tem isso. Isso mudou e ficou", explicou.
Critico do PCP, partido em que chegou a militar, nos anos 60, e da Reforma Agrária após a Revolução dos Cravos, o ex-ministro da Agricultura reitera as teses que lhe valeram tantas críticas à esquerda.
Imaginava uma "Reforma Agrária com a distribuição de terras e não fusão de terras", "defendia algum regadio, para permitir culturas intensivas, e distribuição de terras".
Nos anos 70, e contrariando a tese da pobreza e miséria que levou às ocupações de herdades -- Barreto considera que nessa altura, "no Alentejo quase não há desemprego permanente, os salários subiram muito".
"[Nessa altura] o Alentejo vive uma situação relativamente desafogada desse ponto de vista. Tem é muita desigualdade", disse.
A reforma que defendia passava por dar terra e pôr rendeiros, seareiros ou até alugadores de máquinas. Queria que "toda a gente que queria fazer agricultura pudesse ter direito à terra".
"Em propriedade ou em aluguer de longo prazo, até 100 anos", exemplificou.
A Reforma Agrária arrancou no final de 1974, com as primeiras experiências de ocupação de terras, mas foi no ano seguinte, com a Conferência dos Trabalhadores Agrícolas do Sul, em Évora, que ganhou força, tendo surgido o 'slogan' "A terra a quem a trabalha".
As ocupações de terras na Zona de Intervenção da Reforma Agrária (ZIRA), que envolvia os distritos de Beja, Évora, Portalegre e Setúbal e alguns concelhos dos distritos de Lisboa, Santarém, Faro e Castelo Branco, estenderam-se ao longo de 1975 e 1976.
A Lei Barreto (1977), do ministro da Agricultura do I Governo Constitucional, António Barreto, despoletou um longo processo de devolução das terras ocupadas e de posteriores indemnizações.
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