Recorda-se de ouvir falar em banda gástrica? Há 10 anos, Francisco George, diretor-geral da Saúde na altura, anunciava que o Serviço Nacional de Saúde (SNS) iria passar a comparticipar a 100% as cirurgias para colocação de banda gástrica, tentando reduzir, assim, os níveis de obesidade - considerada pela Organização Mundial da Saúde como a "epidemia do século XXI".
Trata-se de um procedimento cirúrgico popular destinado ao tratamento da obesidade que atua de forma restritiva, limitando a quantidade de alimentos ingeridos. Com efeito, o estômago é dividido em duas partes através de uma banda ou anel ajustável, colocado estrategicamente abaixo da união do esófago com o estômago.
Uma década se passou desde então e, por isso, o Notícias ao Minuto esteve à conversa com uma especialista, Paula Freitas, presidente da Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade (SPEO) e responsável da consulta de Cirurgia de Obesidade no Centro Hospitalar de São João, que traçou um retrato da evolução cirúrgica neste domínio.
O progresso da Medicina tem-se traduzido em avanços notáveis em diversas especialidades. E os procedimentos cirúrgicos para o tratamento da obesidade não são exceção. O nível de desenvolvimento fez, inclusive, com que “atualmente, na verdade, já se coloquem poucas bandas gástricas. É uma técnica que faz parte do passado”, afirma Paula Freitas.
Hoje em dia, ao nível da cirurgia bariátrica [cirurgia para redução de peso], "os pacientes são submetidos essencialmente a dois tipos de procedimentos cirúrgicos: o sleeve gástrico e o bypass gástrico".
Na primeira opção, o sleeve gástrico, o cirurgião faz um corte vertical no estômago e retira uma parte, transformando-o num tubo gástrico. Já no bypass gástrico, é criada uma pequena bolsa gástrica (excluindo-se 90% do estômago) que faz ligação ao intestino delgado. Estas são ambas cirurgias realizadas por via laparoscópica (menos invasivas) e, tal como explica Paula Freitas, a escolha do procedimento cirúrgico mais adequado irá depender “das características do paciente, da doença e da experiência do centro hospitalar na realização das técnicas”.
Mais recentemente, elucida a especialista, surgiu “o conceito de cirurgia metabólica, em que, além de se tratar o excesso de peso, tenta controlar-se doenças metabólicas associadas à obesidade (por exemplo a Diabetes Mellitus tipo II, Dislipidemia, e Hipertensão Arterial)”.
Número de obesos em Portugal acima da média europeia
Portugal tinha, em 2014, 16,6% de adultos obesos, um valor acima da média da União Europeia (15,9%) e a tendência para o excesso de peso aumenta com a idade e diminui com a escolaridade. Os dados são uma conclusão do estudo do Eurostat divulgado no ano passado.
Os indicadores apontam para o facto de, no país, a maior taxa de obesidade se situar na faixa etária dos 65 aos 74 anos (22,1%), seguindo-se o grupo entre os 45 e os 64 anos (21,9%) e o das pessoas com mais de 75 anos (16,7%).
A presidente da SPEO alerta ainda para o facto de, no passado, a prevalência da obesidade “ser mais acentuada nos homens do que nas mulheres. Atualmente o cenário está invertido, já que é o género feminino que assume a liderança”.
Já em relação à adolescência, Portugal é um dos cinco países com mais adolescentes obesos. Os números são do estudo ‘Adolescent obesity and related behaviours: trends and inequalities in the WHO European Region, 2002-2014’, de acordo com o qual a prevalência da obesidade em Portugal, nos adolescentes aos 11, aos 13 e aos 15 anos, é de 5%.
Este número representa uma subida de 0,3 pontos percentuais desde 2002, quando o objetivo era travar esta doença. O valor mais elevado na região europeia é registado na Grécia, com 6,5% de adolescentes obesos. No caso de Portugal, a contribuir para este resultado estão sobretudo os rapazes, com 6,9%. Já as raparigas registam um valor de 3%.
Recorde-se que é considerada obesa a pessoa que apresente um índice de massa corporal superior a 30.
Na opinião da especialista, o futuro do país, no que respeita a este tema, deve passar pela “aposta na prevenção”. Só assim, advoga, “é que conseguiremos inverter estes indicadores”.
As cirurgias bariátricas “apenas são solução para as pessoas que já atingiram patamares de obesidade mórbida”. Por isso, “devemos fazer um esforço para que as pessoas normoponderais não passem desse patamar e por aí em diante”. E “este é um trabalho de todos sem exceção”, não só “dos médicos, mas também das autarquias e da sociedade em geral”, defende.
Partindo deste pressuposto, a Sociedade Portuguesa para o Estudo da Obesidade irá realizar, de 24 a 26 de novembro, o primeiro congresso português de obesidade subordinado ao tema ‘Obesidade: apostar na multidisciplinaridade’.