Instituições de ensino superior preocupadas com redução de vagas
As instituições de ensino superior públicas de Lisboa e Porto olham "com preocupação" a intenção de reduzir vagas em 5% nestas cidades e antecipam "efeitos nefastos" de uma "medida bem-intencionada", que os politécnicos encaram como um sinal positivo.
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País Lisboa e Porto
A proposta de despacho orientador de vagas no ensino superior público para o próximo ano letivo, a que a Lusa teve acesso, determina uma redução do número de vagas para as instituições de Lisboa e Porto, universidades e politécnicos, em 5% do total face aos três anos letivos anteriores, assim como a possibilidade de as restantes instituições, fora destes dois grandes centros urbanos, poderem aumentar as vagas em 5% nos mesmos moldes.
O documento chegou hoje às instituições e foi dado a conhecer pelo ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, numa entrevista à rádio pública Antena 1, na manhã de hoje, e as reações das instituições de maior dimensão em Lisboa e Porto são, genericamente, negativas.
A Universidade de Lisboa (ULisboa) defendeu em comunicado que as alterações propostas "não deverão ser adotadas", a Universidade Nova de Lisboa (UNL) "foi desagradavelmente surpreendida", a Universidade do Porto (UP) entende que a proposta "deve ser repensada" e o Instituto Politécnico de Lisboa (IPL), que se manifesta solidário com a necessidade de as instituições do interior do país captarem mais alunos, antevê "efeitos nefastos" de uma medida que considera "bem-intencionada".
A ULisboa critica a proposta dizendo que não tem em conta a capacidade instalada das instituições, "sendo assim desperdiçados os recursos existentes", e que pode frustrar as expectativas de muitos candidatos, que não seriam colocados em consequência de um previsível aumento das médias de entrada nestas instituições, empurrando muitos alunos que habitam em Lisboa e Porto para o ensino privado, que se tornaria uma opção mais barata do que os custos associados a um aluno deslocado.
"Mesmo admitindo que o objetivo das medidas agora propostas fosse o aumento de estudantes em IES [instituições de ensino superior] públicas do interior do país, estas apenas penalizam os candidatos que pretendem frequentar cursos de ensino superior público nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, não se constituindo como reais medidas de descriminação positiva em relação às IES públicas do interior. Tais medidas passariam por aumentar a atratividade das IES públicas do interior do país", lê-se no comunicado da ULisboa, que acrescenta que em causa está também "a livre escolha dos estudantes".
Numa resposta enviada à Lusa, o reitor da UNL, João Sàágua, diz que "a Universidade NOVA de Lisboa foi desagradavelmente surpreendida com este projeto de despacho que ainda está a analisar", adiantando ter "grandes dúvidas relativamente à eficácia da alegada solução para o problema (da falta de procura relativamente às instituições de ensino superior do interior) e às universidades escolhidas para sofrer cortes".
O reitor da UP, Sebastião Feyo de Azevedo, defendeu em declarações à Lusa que "não é por decreto que se resolvem estes problemas", apelando para que as medidas sejam repensadas, acrescentando que a redução de vagas pode, no limite, inviabilizar alguns cursos, com consequências para o corpo docente e para a capacidade instalada das universidades.
"Não me parece que seja assim que se resolvem os problemas do interior do país. Vai criar instabilidade e algumas dificuldades governativas nas instituições que vão sofrer a redução de estudantes, mais algumas a somar a outras que temos tido", disse, defendendo os consórcios entre instituições como uma opção viável para dinamizar o interior do país e levar para lá "atividades que de outra forma dificilmente terão".
O reitor do Porto alertou ainda que, com as exceções previstas na redução de vagas para áreas como Medicina, Informática ou Física, a redução de 5% transforma-se numa percentagem maior, uma vez que se reduz o universo aplicável ainda que o total de alunos seja considerado para esse corte.
Para o presidente do IPL, Elmano Margato, há questões de pragmatismo que não estão a ser acauteladas.
"A nossa posição é que estaríamos disponíveis para ceder vagas se elas fossem efetivamente utilizadas. O que sentimos é que esta medida tendo boas intenções pode não ser exequível, pode não ser profícua. Pode haver uma transferência formal de vagas de Lisboa e Porto para as instituições do interior e não serem preenchidas, aliás, como não são já hoje as vagas que lhes estão alocadas. Estamos a fazer uma transferência de vagas que não vai ser utilizada e cuja consequência é a diminuição do número de alunos no ensino superior. Esse é que é ponto que pode ser nefasto para este novo rearranjo de vagas", disse.
Para Elmano Margato, que entende que a recusa recente de abertura de três novos cursos de engenharia no IPL foi já um sinal da tutela de que não queria aumentar o número de vagas disponíveis em Lisboa, a deslocação de estudantes do sistema público para o sistema privado em Lisboa e Porto também se afigura como um cenário bastante provável.
O presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP), e presidente do Instituto Politécnico de Leiria, Nuno Mangas, considera que a questão que se coloca é que sentido faz o ensino superior público português, que tem uma rede "de grande qualidade e muito bem distribuída pelo país", ter metade dos seus alunos concentrados em Lisboa e Porto.
"O que me parece aqui mais importante e relevante é a mensagem de que vale a pena estudar fora destas duas grandes cidades. Temos uma rede de ensino superior pública que está muito bem distribuída pelo país, que tem qualidade e onde existem oportunidades. Acho que esta diferenciação por um lado visa introduzir algum mecanismo de regulação da distribuição dos estudantes, mas também dá este sinal de que há oportunidades fora destas cidades", defendeu Nuno Mangas em relação à proposta, que em breve será discutida em plenário do CCISP, e que espera ver amplamente discutida nos próximos meses.
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