A recomendação foi aprovada na sequência da petição "Em defesa da dignidade das mulheres, prostituição não é trabalho", com mais de 3 mil assinaturas, promovida pelo Movimento Democrático de Mulheres (MDM), a Associação "O Ninho", e a Plataforma Portuguesa para os Direitos das Mulheres, que rejeita a criação de uma "plataforma local de intervenção na área do trabalho sexual".
Em novembro do ano passado, o vereador bloquista, com que o PS tem um acordo para o governo da cidade, e que tutela esta área, ficou isolado numa votação em Câmara, tendo sido rejeitada uma proposta sua que incorporava a ideia de "trabalho sexual", sendo aprovada, com o seu voto contra, uma estratégia municipal de intervenção na área da prostituição.
Os deputados municipais recomendaram hoje que a Câmara "faça uma apresentação pública dos documentos estratégicos, incluindo o Plano de Estudo para o Diagnóstico e a Estratégia Municipal de Intervenção na Área da Prostituição", e que a Assembleia "acompanhe a execução" daquele instrumento.
A recomendação recebeu o voto contra do BE e de dois deputados independentes, a abstenção de um deputado municipal do PS e de 4 independentes, sendo votada favoravelmente pelas restantes forças políticas.
A deputada municipal do BE Rita Calvário ficou sozinha a defender a ideia de trabalho sexual, rejeitada pelos restantes grupos municipais, que argumentaram que legitima e normaliza uma forma de exploração, a prostituição.
A eleita bloquista alegou, por seu turno, que existe preconceito contra uma expressão adotada em diversos programas das Nações Unidas, e por organismos do Serviço Nacional de Saúde, defendendo que não é sinónimo de exploração sexual e tráfico de pessoas, e considerou que a estratégia aprovada em Câmara não respeita "opções individuais" nem a "diversidade de situações" que a prostituição abarca.
"O uso de linguagem pejorativa não contribui para trazer direitos a uma comunidade já de si estigmatizada", disse, lamentando que o vereador dos Direitos Sociais não tenha sido ouvido em comissão da AML, assim como um conjunto de organizações com intervenção na área, tão distintas como a União de Mulheres Alternativa e Resposta (UMAR) e a Obra Social das Irmãs Oblatas.
O deputado independente Rui Costa manifestou incómodo com o texto da petição, desde logo por referir-se à prostituição como uma prática exclusivamente feminina, e considerou que impõe "uma moral judaico-cristã a uma sociedade laica", mas os restantes intervenientes manifestaram sintonia com os peticionários.
A eleita do PCP Natacha Amaro pediu a implementação "quanto antes" da estratégia municipal, considerando que poderá ser "um marco e um incentivo para outros municípios", sublinhando que passaram três meses da sua aprovação.
Pelo PEV, Cláudia Madeira criticou a eventual existência da plataforma para o trabalho sexual, sob tutela dos Direitos Sociais, de que chegou a ser convocada uma primeira reunião, argumentando que a autarquia "estaria a abrir caminho à normalização da prostituição em Portugal".
No mesmo sentido, Gonçalo Moita, do CDS-PP, falou de um "perigo de branqueamento", e expressou apoio à estratégia municipal, defendendo um investimento em "programas de saída desta realidade", com inserção social, acesso à habitação e saúda, e proteção social.
A eleita do PAN Inês Sousa Real preferiu salientar que "é fundamental que nas políticas públicas se deva proteger as pessoas", mesmo aquelas que escolhem exercer a prostituição, ao mesmo tempo que se combatem os "fatores estruturais" daquela atividade.
O líder da bancada do PSD, Luís Newton, saudou o "enorme bom senso" da recomendação, bem como da petição que lhe deu origem, criticando que "certa esquerda" tenha um "discurso de ódio" para com os peticionários.
Pela Câmara, o vice-presidente João Paulo Saraiva (Cidadãos Por Lisboa, eleito na lista do PS), limitou-se a expressar: "O Município de Lisboa considera que esta é uma matéria em que todos somos poucos para combater o flagelo da prostituição, independentemente das diferenças na forma como esse mesmo flagelo pode ser combatido".
Em novembro do ano passado, quando a estratégia foi aprovada, o vereador dos Direitos Sociais disse à Lusa que aquela proposta tinha "um preconceito em relação ao trabalho sexual" e "contraria a ideia de trabalhar com as pessoas".