"Direita vive em birra. Não fazer coligação é estender tapete à Esquerda"

Pedro Santana Lopes, fundador do partido Aliança, é o entrevistado de hoje do Vozes ao Minuto.

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Melissa Lopes
21/06/2019 09:00 ‧ 21/06/2019 por Melissa Lopes

Política

Santana Lopes

Deixou o PSD para se aventurar na criação de um novo partido. Com poucos meses de vida, a Aliança teve o seu primeiro teste eleitoral no passado dia 26 de maio. Não conseguiu eleger nenhum eurodeputado, mas a 'medalha'  do "melhor dos novos" é sua. Foi, por isso, um "bom primeiro passo", diz Santana Lopes ao Notícias ao Minuto. O líder da Aliança está convencido de que este primeiro passo poderia ter sido um salto para Estrasburgo se o jogo não estivesse "viciado" e a cobertura televisiva tivesse dado um destaque ao seu partido semelhante aos outros já representados. 

Santana não é suave nas críticas que faz aos partidos da Direita. Aos seus olhos, sim, é inegável a existência de uma crise "de relacionamento, de identidade, de projeto, de vontade política, de entusiasmo, de chama e de memória", aponta. E admitindo já não esperar uma coligação pre-eleitoral à Direita, Santana foca-se agora nas propostas de centro-direita que ocupem o espaço de quem está nesse campo sem "ambição para o país". 

E é de olhos postos nesse objetivo que a Aliança está empenhada em ter tudo preparado para ir "para a luta" no início de julho, tendo marcado para este sábado, na Figueira da Foz, o Senado, de onde sairá aprovado o programa eleitoral e serão conhecidos os cabeças de lista para as legislativas. Santana defende o alargamento da ADSE e seguros de saúde para todos. 

Comecemos pelo que já passou. O que é que correu menos bem ou mal, nas Europeias?

Com toda a franqueza, quanto mais o tempo passa mais acho que foi um resultado positivo. A Aliança era o segundo [partido] mais jovem a concorrer, com quase tempo nenhum de apresentação. Os dois outdoors que metemos na rua foi quase só a dizer quem era o candidato, porque não tivemos tempo para mais nada. Fomos o primeiro dos que não têm a proteção do sistema, ou seja, não vão à televisão. Fomos a dois debates para aliviar a consciência. Nem vou dizer o que é que achei daquilo. Se tivéssemos metade da televisão que os outros partidos têm, ou talvez um quinto do que tem o Bloco de Esquerda, tínhamos eleito representação de certeza. As pessoas têm de se convencer disso, [a televisão] é o grande fator de diferenciação. E vê-se quais são os partidos que têm e os que não têm porque isto é um jogo viciado, só cobrem aqueles que já lá estão.

Os portugueses passam a vida a dizer mal do que existe, mas quando chega a hora votam em quem está no governo, votam nos mesmosNão permitindo que outros entrem?

É muito difícil. Olhando para os resultados dos concelhos do país todo, sinceramente fico agradavelmente surpreendido. Em Famalicão, 399 votos. Acho que é ótimo. Temos votações por todo o país. Acho que foi um bom primeiro passo, não considero que tenha sido mau quando penso nas circunstâncias. Não estou a falar ‘politiquês’. Os portugueses passam a vida a dizer mal do que existe, mas quando chega a hora votam em quem está no governo, votam nos mesmos. Comparando com outros países europeus, acho estranho.

Apesar de não ter sido um resultado mau, sentiu alguma frustração por não ter conseguido eleger um eurodeputado, tendo até em conta que o cabeça de lista tinha colocado a fasquia nos dois?

O que é que queria que ele respondesse? Um? Zero? Vocês perguntam, as pessoas têm de responder. Não sabíamos o que é que iríamos conseguir. Foi modesto, disse que gostaríamos de eleger um, dois. Era bom. Tivemos pena, mas frustrados não. Já estamos noutra, estamos a trabalhar para diante. Foi um bom primeiro passo. Permitiu medir o apoio que temos, agora é para diante.

Eu gosto muito do Presidente [da República], defendo-o em muito em coisa, mas ele às vezes tem atos que não estão à altura deleCriticou muito a comunicação social pela cobertura das eleições. Para lá dos constrangimentos de não ter podido participar nos debates com os chamados grandes partidos, quão difícil é um partido novo singrar na política portuguesa? Que barreiras enfrenta um novo partido?

É muito difícil. O Presidente da República quando recebe os partidos para os ouvir sobre a data das eleições só recebe os que lá estão. Sabe porquê? Há muitas razões. Por exemplo, as contas dos partidos. Se entrar mais um partido, têm de dividir com mais um. Não lhes convém nada. Entre outras razões. Mas essa também tem peso. Todos fazem o possível para: "Não, mais não". Até preferiam, se calhar, menos.

Há uma coisa sobre a qual é preciso não ter ilusões. Sem as redes sociais e sem a televisão é uma tarefa quase inglória. E a legislação portuguesa proíbe a promoção nas redes sociais a partir do dia em que o Presidente marca a data das eleições. Ora, como é que se fala com as pessoas nos tempos de hoje? Quando as pessoas têm cinco ou seis partidos todos os dias a falar com elas na televisão, como se os outros não existissem. Andam para aí comissões de inquérito, batotas na banca, na energia. Porque é que não fazem uma sobre a comunicação? Acham que isto é democracia a sério? Acho que não é, sinceramente. Estou muito aborrecido com a RTP. Eu adoro futebol, mas por amor de Deus, o tempo que as televisões dedicam hoje ao futebol é algo absolutamente imoral. Mas Portugal é assim. Quando o Presidente da República dá o exemplo... Eu gosto muito do Presidente, defendo-o em muito em coisa, mas ele às vezes tem atos que não estão à altura dele.

Como por exemplo?

Esse de receber só os partidos que estão representados. Ele quer marcar a data das eleições, concorrem 18 partidos e recebe seis. Então e os outros que vão concorrer não têm direito a ser ouvidos sobre a melhor data? O sistema está de facto viciado, não vale a pena. Depois nas redes sociais, como sabe, metade é um chorrilho de insultos para trás e para a frente. Os novos partidos não têm financiamento nenhum. É difícil chegar ao cidadão.

Portanto, é um jogo viciado, não é aberto. Um jogo aberto seria autorizarem, por exemplo, a todo o tempo a promoção nas redes, pelo menos isso. Hoje em dia, fala-se para 2.500 pessoas. Com os algoritmos do Facebook, do Instagram, Twitter... No nosso mural, não nos aparecem mais do que quase sempre as mesmas pessoas. Aqui há dias falava com uma jornalista sobre iniciativas da Aliança na área do ambiente durante a campanha eleitoral. E ela disse que não sabia de nada. A generalidade dos portugueses não sabe de nada, não viu. Isso sim é frustrante. De uma coisa tenho a certeza, se o Paulo Sande tivesse tido a mesma cobertura televisiva, com a categoria que ele tem, tinha sido eleito.

Espero que não haja aí outra orquestração para me porem fora dos debates. Podem conhecer-me, mas têm que ouvir as razões, argumentos e as propostas. Isso é o principalO Santana Lopes está habituado a estar do lado dos grandes partidos e sentiu agora na pele o que é estar no outro lado. Custou-lhe essa parte de não ter tido a hipótese de entrar no jogo dos grandes nos debates?

É muito diferente. Mas eu quando estava nos grandes partidos - se calhar era alguma premonição ou sentido de justiça – fiz praticamente sempre entendimentos com os pequenos partidos. E os seus líderes disseram-me sempre, na altura, que me ficavam gratos para a vida porque ninguém tinha feito isso. Sempre procurei pensar que se eles existem, eles representam alguém. Hoje em dia, quanto mais o tempo passa mais isto vai piorando. Porque o sistema aperta. Disponibilizámo-nos para tudo. [Na televisão], fizeram-nos uma entrevista na RTP3. Enquanto os outros falam às 8h00 da manhã, às 13h00, às 20h00, às 00h00, estão sempre em casa das pessoas. Isto é como alguém lançar um produto novo no mercado e proibirem-no de fazer publicidade.

Mas agora com as legislativas vai ser diferente porque não há quem não conheça o Santana Lopes, do PSD, da Santa Casa, até do Sporting.

Pois, está bem. Esperamos é ter o direito a ir debater com os outros. Espero que não haja aí outra orquestração para me porem fora dos debates. Podem conhecer-me, mas têm que ouvir as razões, argumentos e as propostas. Isso é o principal. Eu quero ir lá dizer o que tenho a dizer ao dr. António Costa, principalmente, e à maioria de Esquerda que se formou no Parlamento.

É incompreensível, um Governo apoiado por uma maioria de Esquerda deixar degradar os serviços tão importantes para aqueles que mais precisam

Tem muito para lhes dizer?

Tenho, bastante, sobre o que fizeram nos últimos quatro anos. Nomeadamente degradação dos serviços públicos, nos transportes, na saúde, nas reformas do segurança social, nas lojas do cidadão, tanta coisa. É incompreensível, um Governo apoiado por uma maioria de Esquerda deixar degradar os serviços tão importantes para aqueles que mais precisam. O que é importante é os cidadãos ouvirem as diferenças. Senão depois dizem que são todos iguais. Nós fizemos um partido novo não foi para ser igual aos outros. Vamos aprovar o nosso programa até ao fim do mês, apresentá-lo na primeira semana de julho, os cabeças de lista serão apresentados agora no sábado. Estamos a terminar tudo para irmos para a luta no início de julho.

Já decidiu se vai aceitar a proposta de coligação do Nós, Cidadãos?

Ainda não. Estamos a apreciar. No sábado temos o Senado, na Figueira da Foz, que é quem vai tomar a decisão. Vamos ver. É uma proposta interessante, foi inesperada para nós. Tem aspetos positivos. Recebemo-la com espírito democrático.

E receberam outras propostas entretanto?

Não. Este partido, o Nós, Cidadãos, é que fez a proposta a vários partidos. Fez à Aliança, fez à Iniciativa Liberal, ao PPM. Fez a proposta de nos juntarmos todos numa plataforma.

Há uma crise [à Direita] - uma crise de relacionamento, uma crise de identidade, uma crise de projeto, uma crise de vontade política, uma crise de entusiasmo, uma crise de chama, uma crise de memóriaQuem também sofreu um desastre, não na estrada, mas nas Europeias, foi o seu antigo amor, o PSD, e o CDS. Concorda com o diagnóstico do Presidente da República de uma crise à Direita no futuro?

Acho que o Presidente tem razão. De facto há uma crise. Quando o centro-direita não é capaz de se unir na primeira vez em que há uma maioria de Esquerda a governar, no Parlamento, em Portugal… Basta isso para se perceber que há uma crise - uma crise de relacionamento, uma crise de identidade, uma crise de projeto, uma crise de vontade política, uma crise de entusiasmo, uma crise de chama, uma crise de memória. Isso está tudo junto. Se as pessoas tivessem memória, chama, entusiasmo, crença, força, ânimo, acho que não hesitariam em nos unirmos todos para pôr a frente Esquerda fora daqui, fora do Governo. Anda cada um a passear para o seu lado, como se nada se passasse no país. Um diz uma coisa ali, outro diz uma coisa acolá.

Rio diz que não há uma crise na Direita mas sim uma crise no regime.

Eu percebo o que ele quer dizer. Os partidos que estão no governo veem sempre menos os problemas do que os que não estão no governo. Só depois é que se veem os problemas. Percebo isso que ele diz. Mas ainda mais me ajuda. Se ele acha que há uma crise de regime, então não devia agir em conformidade? Ou age como se nada se nada se passasse e vamos sozinhos a eleições? O dr. Sá Carneiro, quando entendeu que havia uma crise de regime, resolveu fazer uma grande coligação e teve de vencer a oposição até dos seus maiores apoiantes que não queriam por nada um entendimento com o CDS. E ele lutou, lutou, fez vários conselhos nacionais e lá os convenceu. Porque havia uma crise de regime, o conselho da revolução, o general Eanes era Presidente da República e na altura era grande adversário do PPD/PSD.

O que é que Rui Rio disse a Marcelo? "Não, não, não é uma crise da Direita, é mais grave do que isso, é uma crise do regime todo". E depois diz que há grandes assuntos da sociedade portuguesa que têm de se resolver com entendimentos e que os partidos têm due ser altruístas se não nunca mais se resolve, como por exemplo na Justiça. Se acha que há essa questão toda, só é capaz de se entender com o PS? Essa sua preocupação não é suficientemente forte para o levar a dizer para nos unirmos todos no centro-direita?

Rio não está a agir em conformidade ... 

... com aquilo que diz. Para situações excecionais, medidas excecionais. Então se a crise é tão profunda, têm de se tomar medidas que, em alturas de menor crise, não se tomariam.

Acho que a Direita vive em estado de birra. Não fazer uma coligação à Direita é estar a estender o tapete para a frente Esquerda continuar no poder por mais quatro anosDo que é que o PSD e o CDS estão à espera? Que os astros se alinhem só por si?

Não sei. Acho que a Direita vive em estado de birra. Depois há este argumento de que o presidente da Aliança saiu do PSD e agora quer unir-se com o PSD? Saí porque há diferenças. E por haver essas diferenças é que criei um partido novo. Mas as diferenças não são tão grandes como entre nós e o Bloco e o PCP. Por ter saído do PSD, não passei para a Esquerda. E criação de partidos dentro do mesmo espaço político já aconteceu nos sistemas políticos europeus todos. Estranhar isso é sinal de ignorância. Eu diria que não há nenhum partido de quem eu esteja tão próximo quanto do PSD e do CDS. Sempre fui uma pessoa que trabalhou o espírito AD – Aliança Democrática. Foi uma coisa que marcou muito quem a viveu. E naturalmente as coligações quando são genuínas, feitas com convicção, entendimento e boa-fé, criam entusiasmo e uma dinâmica que não se compara a nada disto.

Portanto, não o fazer [uma coligação à Direita] é estar a estender o tapete para a frente Esquerda continuar no poder por mais quatro anos. E quem diz tão mal de como isto está, tem de ser consequente e coerente. Se está mal, temos de tomar opções para fazer tudo para isto mudar. É isso que me está a custar. E volto a dizer: A Aliança segue as grandes figuras. As grandes figuras influenciam muito mais cidadãos além dos seus partidos. Esse exemplo de Sá Carneiro de construir soluções excecionais para dar a volta a crises profundas, nós seguimos e assumimos essa sua prova política, uma mostra daquilo que se deve fazer em situações de crise.

Portanto, já não está à espera de que o PSD e o CDS o contactem para essa solução?

Confesso que seria uma surpresa.

Já perdeu a esperança nisso?

Sim. Não gosto de falar em esperança, mas já não espero.

Marques Mendes disse que o PSD está desaparecido em combate com um vazio de ideias. Concorda em absoluto?

Acho que não devo falar do PSD. Já falei muito, não por ser bom ou mau. Falei por causa da questão da coligação. Agora se o PSD está a fazer bem ou mal [oposição] não quero falar. Mas é visível o estilo da liderança do atual presidente do partido.

Se os militantes do PSD o tivessem escolhido a si não andaria “desaparecido em combate”?

Não é muito o meu género. Isso é tempo que já passou, não volta para trás. Não quero falar disso.

Apontemos para o futuro. Qual vai ser a estratégia da Aliança para o desafio das legislativas?

É mostrar as suas propostas. Acho que estamos a fazer um bom trabalho de preparação. Nomeadamente na área económica, na área social, na área dos princípios e valores. Na área das questões sociais, muito a questão do Serviço Nacional de Saúde: consagrarmos um sistema que permita a liberdade de escolha dos cidadãos. Queremos transmitir bem esses princípios, o Estado deve organizar-se. O SNS está falido. O que é que diz o dr. Costa, agora, com um descaramento político sem limites? Que na próxima legislatura vai pôr os serviços públicos a funcionar. Então porque é que não pôs nesta?

Deve haver generalização da ADSE, o apoio do Estado aos que não podem ter seguro de saúde. E o que fazem no SNS tem de ser pago. A ilusão do SNS gratuito tem de acabar Porque estiveram concentrados em devolver rendimentos, dir-lhe-ia António Costa se estivesse aqui.

Pois, então fez essa opção. Achou preferível devolver os rendimentos a alguns portugueses do que assegurar os serviços máximos para todos. Acho que é uma opção profundamente errada. Nós achamos que deve haver generalização da ADSE, o apoio do Estado aos que não podem ter seguro de saúde. E o que fazem no SNS tem de ser pago. A ilusão do SNS gratuito tem de acabar. O SNS custa quase 11 mil milhões de euros por ano. É muito dinheiro. E Portugal não pode continuar com a carga fiscal que tem. Portanto, quem é que tem de pagar os custos do serviço de saúde? Os seguros, claro. E os portugueses poderem escolher, como escolhem os mais ricos, se querem ir ao público, ao privado ou ao terceiro setor.

A ideia de que o Sistema Nacional de Saúde deve ser gratuito é utópica?

É desmentida pela realidade. Custa 11 mil milhões por ano. Os portugueses têm é de ter todos o seu seguro e poderem escolher entre os três setores. E têm que saber o custo, é uma noção fundamental que a sociedade portuguesa tem em muitos poucos casos. O custo de cada serviço, o custo de cada bem. No fim devemos ter a fatura com o que custou aquilo que recebemos do SNS. Depois há pessoas que não podem pagar. O Estado tem de continuar a assegurar. Eu não digo que os seguros de saúde sejam de uma vez. As pessoas que têm mais de 50, 55 anos, é difícil agora negociarem bons seguros de saúde, mas nas gerações mais novas isso é possível. É o sistema que vigora na generalidade dos países europeus. Em vários países europeus, nenhum cidadão pode deixar de ter seguro de saúde. Aqueles que não podem ter, o Estado tem de os ajudar a ter.

Ao que é que leva este sistema? A que muitos cidadãos no país não tenham resposta. Isto é muito bom para quem mora aqui em Lisboa e mesmo assim se for a alguns hospitais marcar uma consulta, se calhar só daqui a uns meses, ou daqui a um ano. E o problema sabe qual é? É que quem fala disto, na maior parte dos casos, são as pessoas que, graças a Deus, têm tido saúde. Se tivessem de passar por essa espera para consultas de oftalmologia, cardiologia, urologia. Sabe quanto demora a marcar em Vila Real? Cinco anos. “Temos um Serviço Nacional de Saúde gratuito”. É tudo ficção, o SNS e o gratuito. Temos de trabalhar com competência e capacidade para elaborar um sistema de funcionamento que permita a todos os portugueses terem uma resposta pronta. O CDS apresentou uma proposta que me pareceu positiva.

Qual?

Se ao fim de X tempo para marcar uma consulta de especialidade o SNS não responder, os utentes poderem ser encaminhadas para o privado. Mas eu sou capaz de funcionar assim, de ver as boas propostas dos partidos, e nem as tento copiar nem regateio elogios quando elas são boas. A Aliança vai trabalhar muito aí.

A sociedade portuguesa não se preocupa com o crescimento da economia. Se a economia não cresce, os governos só fazem uma coisa: vêm cá buscar o dinheiro com mais impostos

E em que mais áreas vai apostar?

A Aliança vai também trabalhar muito na preocupação das remunerações de algumas classes profissionais, nomeadamente as forças de segurança, cujos membros têm um estatuto absolutamente inacreditável do ponto de vista das carreiras e das remunerações. A questão dos descontos para a Segurança Social, os portugueses poderem optar por descontos para entidades privadas, para esquemas complementares de Poupança Reforma. Porque o Estado não pode continuar a gastar o que gasta.

É incomportável?

É incomportável. A não ser ou que cresça a economia ou que aumentem os impostos. A sociedade portuguesa não se preocupa com o crescimento da economia. Se a economia não cresce, os governos só fazem uma coisa: vêm cá buscar o dinheiro com mais impostos.

Talvez os portugueses não associem o crescimento da economia ao seu próprio bolso. Ou, pelo menos, não veem o resultado imediato disso.

Mas têm de meter na cabeça isto: Portugal tem de trabalhar mais para a economia crescer mais e criar um clima propício a mais investimento. O crescimento da economia também vem daí, não é só da produtividade. É do investimento, do consumo e outros fatores. Ainda agora a OCDE disse que há 10 meses que a economia desce.

Uma pessoa liga a televisão e só ouve falar de crimes, de corrupção, de bola. Eu adoro futebol, mas não me tornem saturado de ver e ouvir futebolE ninguém quer saber …

A resposta é João Félix vai para o Atlético Madrid, o Bruno Fernandes talvez vá para o Manchester, houve uma senhora, em Vale de Câmara, que matou o enteado. Essas notícias a toda a hora. Tal como se diz que mostrar imagens de incêndios na televisão muitas vezes incita os pirómanos, falar tanto dessas notícias não é bom para uma sociedade, desmoraliza. Uma pessoa liga a televisão e só ouve falar de crimes, de corrupção, de bola. Eu adoro futebol, mas não me tornem saturado de ver e ouvir futebol. E os temas importantes como a economia portuguesa baixar há 10 meses … não interessa nada. Depois vão escolher assuntos de há 10 anos, como o dr. Vítor Constâncio. Portugal estava a dormir naquela altura, ninguém viu, houve reuniões do Banco de Portugal, a imprensa noticiou. Isto passa-se com vários assuntos. Nas rendas da energia, estamos em 2019 e estamos a ver decretos de lei de 2007 e 2005.

Estamos sempre atrasados em relação ao que é importante?

Lá está. O tempo da justiça, outra das grandes causas da Aliança. Queremos também assumir-nos como o partido que se preocupa mais, que trabalha mais, que faz mais pelos cidadãos com limitações físicas. Mas pronto, não quero adiantar tudo em relação ao programa de julho.

Sabe o que é que é triste? É todas as conversas darem por adquirido que o dr. Costa ganha as eleições. E isso é culpa do centro-direita No rescaldo das Europeias, e depois da surpresa que foi para muitos a eleição de Francisco Guerreiro do PAN, começou a falar-se da possibilidade de uma PANgonça. Que opinião tem deste cenário?

Não sei. Vamos ter tempo para falar nisso nas legislativas, na campanha. Ainda é cedo. Aconselho é as pessoas a lerem os programas de cada partido. Não estou a dizer todo, que é chato, as pessoas não têm tempo. Mas vão lá ver. São capazes de ter algumas surpresas. Quanto a essas hipóteses, acho que devo guardar para a campanha. Vamos ver. Sabe o que é que é triste? É todas as conversas darem por adquirido que o dr. Costa ganha as eleições. E isso é culpa do centro-direita.

Que não está a saber fazer oposição.

Nunca vi umas eleições com uma desistência tão grande à partida quanto estas. Nunca vi. Os líderes dos partidos da oposição a falarem na possibilidade de o PS ter maioria absoluta. Nunca vi uma coisa destas. Para mim não é política, é rendição.

Mas a que se deve isso?

Não sei explicar. É muito difícil de explicar.

Tem a ver com as próprias lideranças dos partidos, não?

Isso com certeza. Mas também com o estado a que as instituições partidárias mais antigas chegaram. Há alguma falta de ânimo, de vitaminas, de vitalidade... Os partidos passam muito tempo com coisas de aparelho que não interessam. O ânimo, a energia são tudo na vida. 

Que responsabilidade atribui ao Presidente da República em relação ao atual xadrez político?

Não atribuo responsabilidade ao Presidente. A culpa é dos partidos.

Mas ao falar de uma crise à Direita não está a acentuar essa mesma crise?

Marcelo é Marcelo.

Fê-lo na esperança de que servisse de aviso?

Também, também. Foi um toque de despertar. Pode ser visto de várias maneiras, mas há pessoas que não querem ver nem ouvir. Vamos para diante. Temos de apresentar propostas no centro-direita alternativas às daqueles que estão instalados num estilo de fazer política que não tem nada de ambição. Ambição no sentido positivo, para o nosso país, para o pôr ao nível médio da UE. Olhe, o que o João Miguel Tavares disse – não quero estar a citar discursos – é verdade. Faltam-nos causas, desígnios, objetivos. Estamos a trabalhar para quê? Do que é que se ouve falar? Que um dia destes vem aí a quarta intervenção externa. Por amor de Deus, não há nenhum povo que possa viver nessa neuro-supletiva. Temos de viver do tal bom ânimo, boa onda, com objetivos ambiciosos e trabalhar para eles.

Por que razão levantou a questão das touradas na carta que escreveu aos militantes da Aliança?

É um assunto do qual não vou continuar a falar.

Foi mal interpretado?

Claro que fui.

Acho extraordinário que no dia em que digo que sou contra a proibição de touradas levei com um chorrilho até de insultos de uma série de pessoas radicaisFoi acusado de ser incoerente.

Hoje em dia, o mundo é assim. Escrevi que éramos contra a posição de partidos proibicionistas que queriam proibir determinados espetáculos em Portugal. E disse que que a Aliança é contra isso, porque respeita as tradições e os costumes dos portugueses. Eu disse alguma vez que não queria touradas ou que era contra? As sociedades evoluem, as pessoas até podem evoluir. Hoje em dia, não se vê, como se via há 20 anos, Presidentes da República, primeiros-ministros, presidentes de câmara, nesses espetáculos. Porque as sociedades evoluem em relação a vários temas. Hoje em dia, há uma sensibilidade diferente da que havia aqui há décadas. E nós até podemos evoluir um bocado e gostar mais de uma época de um determinado tipo de espetáculo, noutra menos. As questões até da proteção da natureza, do ambiente, dos animais ganharam, sem dúvida, uma acuidade maior. Agora, eu falei em nome da Aliança. Aqui à volta desta mesa [na sede do partido], tenho pessoas que gostam de touradas, outras não, outras assim assim. Para nós não é a questão mais importante do país, pus aquilo quase no fim da carta, depois de falar de outros temas, e nem falei de touradas. Falei de espetáculos com animais. Por exemplo, corridas de cavalos, de que pouco se fala, e por esse país fora há N espetáculos com animais,  porcos, bois, galgos.

Acho extraordinário que no dia em que digo que sou contra a proibição de touradas levei com um chorrilho até de insultos de uma série de pessoas radicais. “Então mas era a favor de touradas e agora é contra?” Onde é que eu disse que era contra? Respeito a sensibilidade de quem não gosta. E acho que temos de respeitar.

E a questão das transmissões dos espetáculos tauromáquicos na RTP?

Falei na RTP mas não por causa das touradas. Acho que a RTP não deve passar a vida a transmitir futebol, futsal, touradas, festivais. Acho que tem outras coisas para fazer mais importantes. O Polígrafo (na SIC) não foi incorreto, mas tratou o tema como se eu tivesse mudado. Eu de facto hoje em dia vou muito menos. Também mostraram o Costa a condecorar um forcado na arena, era por inerência de função porque era presidente da câmara, mas quem decidiu condecorar foi ele.

Mas também Costa tem evoluído ou acompanhado a evolução dessas sensibilidades no que diz respeito às touradas.

Acho isso compreensível. Sei de pessoas que deixaram de ir ao futebol porque acham que o futebol hoje em dia é uma chatice. Joga-se mal, há tareia nas bancadas, não querem ir com os filhos ao futebol. Há pessoas que acham que as touradas já não lhes interessa. Cada um é como é. Se eu tivesse mudado a minha posição dizia. Podia dizer que apreciava e que já não aprecio. Podia dizer-se que estava a seguir a moda, o que quisessem. Mas não foi o caso. A sociedade hoje em dia é assim e às vezes a culpa também é vossa [comunicação social], um título feito de uma maneira. O que eu escrevi foi que sou contra a proibição de espetáculos com animais que estejam de acordo com as tradições e costumes de Portugal.

Sugerindo referendos locais.

Sim. Ainda hoje li que na Póvoa do Varzim vão destruir a praça de touros. Falei nos referendos locais até a favorecer quem gosta de touradas. ‘Boom’! Às vezes é difícil.

Está confiante de que vai eleger deputados nas legislativas. E se não alcançar esse objetivo? Vai desanimar?

A vida continuava, mas vamos alcançar, era o que faltava. Se Deus quiser. Não vou estabelecer quantos, mas mais do que um [deputado], não tenha dúvida.

 

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