Sistema de justiça não pode "substituir" a função da política
O vice-presidente da Assembleia da República, Jorge Lacão, afirmou hoje que "nenhum poder deve ter a pretensão de realizar o papel do outro ou de lhe sobrepor segundo pretensas hierarquias inexistentes na ordem constitucional".
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Política Jorge Lacão
"Nem a política pode comprometer a independência da justiça nem o sistema de justiça pode substituir-se à política na sua função ordenadora e mobilizadora da sociedade", disse Jorge Lacão ao intervir na sessão comemorativa dos 40 anos do Centro de Estudos Judiciários (CEJ), que decorreu na Assembleia da República.
Segundo Jorge Lacão, a esta luz, "nem a categoria de dos magistrados pode ser encarada - como alguns pretendem - como uma casta de privilegiados dentro do Estado, nem os titulares de cargos políticos devem ser concebidos como a `classe política´, designação que ignora deliberadamente o facto legitimador da representação democrática, transitória por natureza".
Em seu entender, para encarar com êxito os desafios do tempo presente é preciso, a "todos os níveis (...) mais cultura democrática".
"A informação esclarecida, o espírito crítico e a disponibilidade para compreender são antídotos indispensáveis ao alastrar dos dogmatismos e das manifestações populistas do discurso fácil que, no final, só incrementam a disrupção e as tentações autoritárias", afirmou o deputado socialista, considerando pertinente equacionar alguns pontos problemáticos de certas narrativas recorrentes.
Assim, perguntou se "há de merecer aceitação um discurso justicialista que passo a passo se obstina em ignorar ou desprezar o valor constitucional dos direitos fundamentais".
"É aceitável, à luz dos valores democráticos, continuar a reivindicar o fim da presunção da inocência e a inversão do ónus da prova em direito criminal, contra a jurisprudência firmada e unânime do Tribunal Constitucional, fazendo ignorar que doravante todos os titulares dos órgãos de soberania e altos cargos políticos estão sujeitos ao crime de falsas declarações de rendimento e património?", questionou o vice-presidente da AR.
E prosseguiu: "É aceitável pretender reivindicar para o direito português figuras tão controvertidas como a delação premiada sem explicar que, se as regras de colaboração com a justiça merecem ser revisitadas, nunca devem excluir a prova dos factos e a determinação judicial da culpa?".
Jorge Lacão questionou, ainda numa sala repleta de magistrados, se é aceitável reclamar em nome da eficácia o recurso a meios especiais de obtenção de prova à margem do processo e sem controlo jurisdicional.
"É adequado que se proclame como matéria de boa realização da justiça que o prazo normal de uma investigação não é o prazo processualmente estabelecido, mas o da prescrição", disse ainda.
Quanto ao legislador, do qual faz parte, Jorge Lacão diz que compete contribuir para melhorar as instituições pelo aperfeiçoamento dos seus quadros normativos, como é, por exemplo, o que ocorre com os trabalhos recentes ou em curso relativos ao Estatuto judicial e do MP.
"É ainda cedo para uma avaliação. Mas, à margem das ruidosas campanhas de injúria e detração contra o trabalho parlamentar, acredito na mais valia do resultado final. Em breve o saberemos", declarou o deputado socialista que integra a primeira Comissão Parlamentar que está analisar o novo Estatuto do MP.
Por último, Jorge Lacão desejou "longa vida" ao CEJ, lembrando a dimensão formativa e pedagógica desta escola que forma e qualifica os magistrados judiciais e do MP.
Jorge Lacão interveio numa sessão em que falaram ainda a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, e o diretor do CEJ, João da Silva Miguel, tendo o evento contado com a presença da PGR, Lucília Gago, entre outras figuras ligadas à Justiça.
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