"Medo não tenho de nada. O partido conhece-me há muitos anos"

João Almeida é o entrevistado de hoje do Vozes ao Minuto. Deputado é um dos cinco candidatos à liderança do CDS-PP.

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Catarina Correia Rocha
23/01/2020 09:30 ‧ 23/01/2020 por Catarina Correia Rocha

Política

João Almeida

João Almeida é um dos cinco candidatos que, este fim de semana, irá disputar a liderança do CDS-PP. Depois de um desaire nas eleições legislativas de 6 de outubro, e não deixando de "assumir a responsabilidade", o também deputado diz estar em "perfeitas condições" para falar ao partido. 

Quer recuperar um "conjunto de questões que sempre fizeram a primeira linha da agenda do CDS" e que pensa que "nunca deviam ter deixado de fazer", entendendo também que tem de haver espaço para "causas mais contemporâneas", como ambiente ou alterações climáticas.

João Almeida está convicto de que o partido "devia ter mantido abertas as pontes com outras forças políticas", mas, assumindo que os portugueses perderam a confiança no CDS, defende que esse facto se trata de algo "absolutamente conjuntural". 

Em conversa com o Notícias ao Minuto, garante que tem como objetivo "recuperar a representatividade do CDS" e diz saber "muito bem" o que é preciso para o partido neste ciclo que atravessa. Apresenta-se sem medo e "bastante confiante" de que irá vencer no próximo fim de semana.

Apoiou Assunção Cristas e foi porta-voz do CDS durante a sua liderança. Teme ser visto como o candidato da continuidade que levou o partido regressar a um número reduzido de deputados?

São duas coisas diferentes. Estive na direção de Assunção Cristas como estive noutras e em todos os ciclos políticos do partido apresentei moções globais com aquelas que eram as minhas ideias para o partido. E as ideias que apresento agora são coerentes com o que sempre apresentei no passado, durante a liderança de José Ribeiro e Castro – em que divergi profundamente dessa liderança e candidatei-me contra – e, mesmo nas lideranças de Paulo Portas e de Assunção Cristas apresentei ideias diferentes das que eles tinham para a condução do partido. Portanto, é normal que agora, quando me candidato, seja coerente naquilo que fui no passado.

Medo não tenho de nada. O partido conhece-me há muitos anos e conhece bem do que sou capazQuanto à questão dos resultados, nunca deixei de assumir a responsabilidade que tenho, solidária, e dentro daquilo que é a direção do partido. Agora, é de registar uma coisa: Este foi o pior resultado de sempre do CDS. No segundo pior resultado de sempre, que foi em 1987, o CDS não elegeu deputado em Aveiro e desta vez elegeu. Se este resultado, que é o pior de sempre em comparação com o segundo pior de sempre tem uma diferença, é a eleição do deputado em Aveiro que foi o círculo onde fui cabeça de lista.

A minha pergunta vinha mais no sentido se não tem medo de ser ‘colado’, digamos assim, de alguma forma à anterior liderança e ao papel que nela teve.

Medo não tenho de nada. O partido conhece-me há muitos anos e conhece bem do que sou capaz. Portanto, mal de mim se tivesse medo.

Acha que não ‘joga’ contra si.

Acho que estou em perfeitas condições - como tenho feito durante a campanha – de falar daquilo que sempre fiz pelo partido em cada um dos seus ciclos. E o partido conhece-me por isso.

E em termos gerais o que o separa, então, da líder demissionária?

Há maneiras completamente diferentes de encarar a forma de fazer política e as políticas. Acho que o partido deve ter sempre presente um conjunto de causas de sempre que fizeram a agenda do partido em todos os ciclos e que devem continuar a fazer. Tenho dito isso na campanha eleitoral. As questões da segurança, as questões da autoridade, na escola, as questões da meritocracia, as questões das prestações sociais e o rigor nessas prestações para que possa haver apoio aos mais idosos, as questões da agricultura e do mundo rural… Há um conjunto de questões que sempre fizeram a primeira linha da agenda do CDS que acho que nunca deviam ter deixado de fazer.

Por outro lado, a necessidade também de, naquilo que se fala em termos de causas mais contemporâneas e que surgiram mais recentemente, o CDS tem de ter um discurso profundo que vá para além de uma ou duas proclamações. E isso aplica-se ao ambiente e às alterações climáticas, aplica-se à transição energética, à transformação digital e aplica-se a uma matéria que penso que tem de ser prioritária no discurso do CDS que é o combate à corrupção.

O que correu mal é que o CDS não conseguiu gerar nos eleitores a convicção suficiente para que votassem no CDSNesse seguimento e na sua visão, o que correu então menos bem para o CDS ter pouco mais de 4% nas Eleições Legislativas?

O que correu mal é que o CDS não conseguiu gerar nos eleitores a convicção suficiente para que votassem no CDS. Não conseguiu gerar nos eleitores o sentimento de utilidade do voto no CDS.

Disse na altura que o “resultado foi péssimo”. O que poderia ter sido feito para tal não se ter dado?

E foi. Isso agora é um bocadinho, como se dizia antigamente, ‘fazer o Totobola à segunda-feira’. Obviamente que o que se podia ter feito era ter uma agenda mais focada para que as pessoas identificassem o CDS e as suas propostas e vissem aí utilidade em votar no partido. Para além de outras coisas. O CDS também devia ter mantido abertas as pontes com outras forças políticas no sentido de tornar viável a aprovação das suas propostas políticas e, obviamente, ao não ter essa abertura de pontes, as pessoas percecionavam que, mesmo votando no CDS, as propostas nunca seriam aprovadas.

Sente que, de alguma forma, os portugueses perderam a confiança no partido?

Sinto, mas acho que isso é absolutamente conjuntural. Não é estrutural e, portanto, essa confiança precisa de ser renovada e isso depende da condução que o partido tiver a partir do Congresso.

E é a isso que se propõe?

Com certeza. Recuperar a representatividade do CDS.

Na moção que leva ao Congresso tem um ponto dedicado ao combate à abstenção. Pensa que o elevado número de portugueses que não vai às urnas ‘ajudou’ a uma penalização do CDS?

Sim, estou convencido que uma parte dos votos que perdemos, perdemos para a abstenção. Não só por isso mas por uma questão estrutural – que é o peso enorme que a abstenção tem em Portugal – acho que o combate à abstenção deve ser uma preocupação política do CDS.

O meu plano é reorganizar o partido, pô-lo a funcionar de baixo para cima e isso só é possível fortalecendo as suas basesDefende também que o CDS deve seguir o seu caminho com vista ao futuro mas “sem cortes com o passado”. Pode explicar melhor o que isto significa?

O CDS tem mais de 40 anos de história. Votou contra a Constituição, governou o país quatro vezes, ajudou a tirar o país da bancarrota, governou quase cem câmaras do país com enorme competência e, portanto, um partido que tem todo este património e que, para além disso, tem um património doutrinário muito rico com base na democracia cristã, aberta às correntes liberais e conservadoras...

Um partido que tem todo este património obviamente que tem de ter, institucionalmente, a consciência de que uma parte importante do seu ativo é aquilo que já fez pelo país, a credibilidade que conseguiu junto da sociedade portuguesa e também o reconhecimento que, na ação do partido, se tem de ter por todos aqueles que em todos os ciclos do partido conseguiram todos estes resultados.

Refere também que a escolha não pode ser feita “virada para o passado”. Quais os seus principais planos para o partido se for eleito – sendo que diz que é preciso “arrumar a casa”?

Exatamente. O meu plano é reorganizar o partido, pô-lo a funcionar de baixo para cima e isso só é possível fortalecendo as suas bases, fazendo o partido funcionar em rede através dessas bases dos militantes e dos autarcas, preparar o partido internamente para o grande desafio das eleições autárquicas e dar substância política a toda essa reorganização através de uma ação política focada que permita aos portugueses identificar as causas que o CDS defende, a capacidade que o CDS tem de resolver os seus problemas e a importância que o CDS tem para que, na política, encontre a resposta a esses problemas.

Pensa que o seu percurso dentro do partido sendo filiado há décadas é um fator que pode jogar a seu favor nestas eleições internas?

Acho que é mais fácil conhecer alguém que tem mais tempo de serviço ao partido mas isso não é um fator especialmente distintivo. Acho que o que é distintivo é o que nesses anos fiz pelo partido e a forma como exerci os diferentes cargos, quer no partido, quer no Parlamento, quer no Governo.

E acha que é reconhecido – tanto dentro do partido pelo que diz ter feito como pelos portugueses?

Não me queixo disso. Internamente tenho tido muito apoio nesta campanha que estou a fazer como disse, externamente fui a votos como cabeça de lista em Aveiro há menos de seis meses e consegui ser eleito com um resultado nacional mais baixo do que aquele que o CDS teve em 1987 quando não elegeu deputado em Aveiro.

CDS já teve, no passado, cinco deputados – até já teve quatro - e, nesses momentos, foi muitas vezes reconhecido como tendo os deputados com mais qualidade na Assembleia da RepúblicaE sobre o número de candidatos a esta eleição? Se são demasiados ou mostram a diversidade do CDS...

Em democracia os candidatos nunca são demasiados. Acho que é importante e mostra vitalidade do partido.

Porquê?

Mostra a vitalidade porque há várias pessoas com ideias para o futuro do partido e com projeto para o futuro do partido. Acho que é isso que é importante.

E consegue apontar algum candidato como o seu principal adversário?

Não. Era o que faltava. Adversários são fora do CDS.

E o que o diferencia de Filipe Lobo D’Ávila, Francisco Rodrigues dos Santos, Carlos Meira e Abel Matos Santos?

O que me diferencia diferencia-me dos políticos que estão fora do CDS. Dentro do CDS, conjunturalmente temos projetos diferentes mas, como diz o próprio lema da minha candidatura – e não é por acaso que o diz é porque esse é o meu sentimento – o importante é aquilo que nos une e é mesmo a nossa força.

O CDS tem atualmente apenas cinco deputados na Assembleia da República. Que relevância tem o partido na atualidade nacional?

Tem a relevância de ser um partido fundador do regime democrático e de nesses cinco deputados ter cinco vozes capazes de defender as causas que o CDS sempre teve e aquelas que possa introduzir na agenda política com acutilância e de fazer também um trabalho de proximidade para que as pessoas se sintam representadas em nós.

O CDS já teve, no passado, cinco deputados – até já teve quatro - e, nesses momentos, foi muitas vezes reconhecido como tendo os deputados com mais qualidade na Assembleia da República. Nós temos que ter presente esse exemplo e procurarmos exatamente estar à altura daquilo que é a história do partido e que o partido já foi capaz de fazer em algumas alturas tão difíceis como esta.

A democracia nunca é uma ameaça a ninguém. O CDS tem uma representatividade muito superior a esses partidos que agora apareceramGostava de alargar um pouco mais a temática. Querendo reconquistar os portugueses e fazer o partido crescer pensa ser possível que, nos próximos anos, o CDS volte a ser Governo?

Os partidos, obviamente, existem para tentar ter o máximo de representação possível e, se der, passar também pela ambição de poder fazer parte do Governo, naturalmente.

E ambiciona ser primeiro-ministro ou olha para o CDS como um partido de apoio a um Executivo de Direita?

Não, a questão não se coloca aí. Quero ser presidente do CDS, quero estar perto das bases do CDS, quero trabalhar com as bases do CDS, quero trabalhar para um bom resultado autárquico e quero, na Assembleia da República, enquanto deputado, afirmar o partido e confrontar aquilo que é a nossa visão da sociedade com aquilo que é a visão do primeiro-ministro e, de 15 em 15 dias, poder mostrar claramente essa diferença nos debates quinzenais. Não vou por esse tipo de questões à frente. Sei muito bem o que é preciso para o CDS neste momento.

Está focado no partido e não pensa…

Estou focado no partido e nos desafios eleitorais. Em fortalecer o partido e em enfrentar os desafios eleitorais que temos.

Há alguma linha principal de outro partido de Direita que para si seja inegociável em caso de eventual acordo?

Não estamos a falar de acordos. As pessoas primeiro precisam de ver o CDS fortalecido e o CDS consistente. É para isso que vou trabalhar. Antes de discutir linhas com outros partidos tenho de fortalecer o CDS e afirmar as nossas linhas… E não andar a discutir as linhas de outros partidos.

É um Governo completamente desfasado da realidade e que parece um Governo em fim de ciclo quando, afinal, nem um Orçamento aprovado tem ainda Deu-se também a chegada ao Parlamento de mais partidos – Livre, Chega e Iniciativa Liberal. Pensa que isso é, de alguma forma, uma ameaça ao CDS?

A democracia nunca é uma ameaça a ninguém. O CDS tem uma representatividade muito superior a esses partidos que agora apareceram, tem uma história que esses partidos naturalmente não têm. Respeito esses partidos e aquilo que representam mas, obviamente, não comparo àquilo que é a dimensão e a representatividade do CDS.

Que setores da sociedade portuguesa, no seu entender, têm problemas ou questões mais prementes que necessitam de ser resolvidas?

Os mais desfavorecidos e excluídos, designadamente aqueles que menos têm e que são pensionistas. Acho que o CDS tem de falar para essas pessoas que trabalharam toda uma vida e que hoje em dia têm pensões muito baixas. Pensões – as pensões mínimas sociais atuais – que aumentaram mais no Governo PSD/CDS do que no Governo Socialista. E, portanto, é fundamental preocupar-nos com essas pessoas. Os antigos combatentes que são uma parte importante da nossa sociedade a quem o país tem de estar grato e reconhecido e não pode esquecer – e isto também tem sido esquecido durante Governo Socialista. E, depois, uma classe média que obviamente quer viver numa sociedade mais competitiva, quer ter mais oportunidades, quer ter melhores salários, quer poder conciliar melhor a sua vida profissional com a vida familiar e que precisa da voz do CDS para defender essas causas.

Não vou cometer o erro de desprezar a importância de ter contas certasQuais os pontos que considera mais negativos na governação de António Costa?

Ainda agora um Governo que nem aprovou o seu primeiro Orçamento tem um ministro das Finanças que está a prazo e que se sabe que vai sair mais cedo ou mais tarde. Um ministro da Administração Interna que acha que os agentes e guardas das forças de segurança comprarem material para a sua atividade é um capricho. Uma ministra da Saúde que diz que governar a Saúde é mais difícil do que pensava. Um ministro dos Negócios Estrangeiros que diz que os gestores portugueses não têm qualidade. É um Governo completamente desfasado da realidade e que parece um Governo em fim de ciclo quando, afinal, nem um Orçamento aprovado tem ainda.

E que elogios – se alguns – lhe faz?

Não vou cometer o erro de desprezar a importância de ter contas certas. E, portanto, partindo de um bom princípio que é o de ter contas certas, exigir, naturalmente, que essas contas certas correspondam a um benefício para a sociedade e não um estrangulamento, quer por via da carga fiscal quer por via das cativações que tornam os serviços públicos menos eficientes.

O apoio a uma candidatura presidencial é algo que deve ser sentido pela esmagadora maioria do partido e isso só é possível aferir no Conselho NacionalE quanto a Bloco de Esquerda e PCP, que comentários lhe merecem?

São partidos completamente opostos ao CDS no posicionamento político e aos quais daremos sempre combate porque representam uma visão da sociedade totalmente oposta àquela que nós representamos.

Falando também um pouco das eleições presidenciais, não diz desde já se apoia ou não Marcelo Rebelo de Sousa quanto a uma recandidatura e justifica com a necessidade de avaliação no Conselho Nacional. Qual a razão desta decisão? Porque não se quer comprometer?

Porque acho que o apoio a uma candidatura presidencial é algo que deve ser sentido pela esmagadora maioria do partido e isso só é possível aferir no Conselho Nacional que é o órgão máximo entre Congressos.

Não é porque tem alguma ‘carta na manga’?

Isso será o partido que saberá em primeiro lugar. Com toda a clareza, tendo o partido apoiado a eleição do atual Presidente da República, não faz sentido que comece o processo relativo às eleições presidenciais sem fazer a avaliação daquilo que foi o mandato do Professor Marcelo Rebelo de Sousa à luz dos pressupostos do apoio que o CDS deu há quatro anos.

Está confiante na sua vitória no próximo fim de semana?

Sim, bastante. Bastante confiante. Com respeito pela livre expressão da vontade dos militantes, mas muito confiante.

Há alguma promessa que possa, desde já, fazer aos militantes do CDS e também aos restantes portugueses que não sendo militantes estão atentos à realidade?

Não gosto de fazer promessas. Assumo dois compromissos. Um de proximidade interna, de viver o partido de baixo para cima e de estar junto das suas bases, não só para sentir esse funcionamento, mas para apoiar esse funcionamento. E, relativamente ao país, vão perceber que o CDS estará muito mais presente nas suas vidas e com muito maior capacidade.

E sente que os portugueses têm essa abertura?

Acho que um país onde metade dos eleitores não vota, espera exatamente que haja partidos políticos que sejam capazes de os representar e o CDS tem de ser capaz não só de representar o seu espaço natural de Direita democrática e popular, como também de conseguir trazer para esse espaço abstencionistas que aí vejam a solução para o exercício do voto que não viram até agora.

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