Renovar Emergência parece certo, mas partidos defendem medidas diferentes
O Presidente da República recebeu e ouviu os nove partidos com assento parlamentar, no Palácio de Belém. Além do OE2021, em cima da mesa nestes encontros esteve a eventual renovação do Estado de Emergência por mais 15 dias, até 8 de dezembro. E se a nova Emergência não gera consenso, as críticas ao recolher obrigatório a partir das 13h aos fins de semana foram proferidas da Esquerda à Direita. Saiba o que se passou nos últimos dois dias em Belém.
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Política Palácio de Belém
Na véspera de uma reunião no Infarmed - que já não acontecia há mais de dois meses -, e num momento em que o país atravessa uma fase crítica devido à pandemia da Covid-19, com o número de óbitos, internamentos e novos casos a aumentar diariamente, o Presidente da República chamou os partidos a Belém.
Marcelo quis perceber que balanço fazem do quarto Estado de Emergência, que termina às 23h59 da próxima segunda-feira, e se concordam com uma eventual renovação para os próximos 15 dias. Também o OE2021, cuja votação na especialidade vai ocorrer na próxima semana, esteve em cima da mesa, embora em segundo plano.
À saída dos encontros em Belém, que arrancaram na tarde de terça-feira e se prolongaram até ao fim do dia de hoje, os representantes dos nove partidos manifestaram as suas preocupações e exigências. Se a maioria se mostrou contra o recolher obrigatório ao fim de semana entre as 13h e as 5h, quase todos consideraram também que a divisão do país em três escalões, a confirmar-se, será uma medida relevante.
Preparada está já a Assembleia da República que tem pré-agendado para a manhã desta sexta-feira, 20 de novembro, o debate e a votação de um eventual decreto presidencial sobre a renovação do Estado de Emergência.
PS concorda com medidas em função do "nível de perigosidade"
O PS foi o último partido a ser ouvido pelo chefe de Estado. À saída de Belém, ao final da tarde desta quarta-feira, o socialista José Luís Carneiro confirmou que o Governo tenciona "graduar o nível de perigosidade dos diferentes municípios" e em função desse nível aplicar medidas.
"O PS é favorável à renovação do Estado de Emergência e à adoção de medidas que sejam adequadas, proporcionais e com base no diálogo que tem continuado a existir com os epidemiologistas e com o conhecimento que se tem vindo a produzir no país sobre esta matéria, e em critérios que possam ser aplicados indistintamente a todo o território, mas de uma forma gradual e ajustada à gravidade das diferentes situações", afirmou.
Questionado sobre se em alguns dos concelhos em que vigora atualmente a proibição de deslocações a partir das 23h nos dias de semana e das 13h aos sábados e domingos poderá deixar de se aplicar, o secretário-geral adjunto do PS admitiu que "sim, é possível que uns possam deixar de ter e outros [concelhos] que não tiveram tenham de ter, em função precisamente da gravidade".
PSD aceita Emergência mas discorda da realização de Congresso do PCP
Antes, o vice-presidente do PSD Nuno Morais Sarmento afirmou à saída do Palácio de Belém que "o PSD está de acordo, não obstaculiza que esse quadro legal excecional se mantenha", mas adverte o Governo de que a adoção de medidas com "excessivas diferenciações ou cores ou classificações" poderá deixar os portugueses "mais confundidos do que agora estão".
"Estas decisões têm de ser iguais para todos" e não podem ser permitidas "realidades diferentes, que os portugueses já não entenderam no passado". Apontando o dedo ao PCP, embora sem o mencionar, o social-democrata disse ainda que não entender "que fechem supermercados e restaurantes, que se obrigue as famílias portuguesas a estar em casa e que depois se realizem, por exemplo, congressos partidários". Recorde que o Congresso do PCP está marcado para os dias 27, 28 e 29 deste mês, em Loures, no distrito de Lisboa.
Bloco quer provas científicas e comunicação "coerente"
"Achamos que tem faltado muito coerência nas medidas e correta comunicação do risco às populações". Quem o disse foi a coordenadora do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, à saída da audiência com o Presidente, acrescentando, por isso, ser necessário "que as medidas de restrição que o Governo venha a implementar sejam baseadas na evidência científica e comunicadas à população de forma coerente e que a população perceba".
A líder bloquista acusou ainda o Governo de "querer fazer tudo pelos mínimos", mas sublinhou que "esta crise não é mínima, é máxima". "É uma crise pandémica grave. É tempo de o Governo se deixar de medidas mínimas e ter medidas robustas capazes de apoio económico e social que tempere as restrições pedidas às populações", defendeu.
Quanto ao sentido de voto do BE relativamente a uma renovação do Estado de Emergência, Catarina Martins, que se fez acompanhar pelo líder parlamentar Pedro Filipe Soares, disse que o partido "decidirá o seu voto na análise do decreto (de eventual prorrogação do Estado de Emergência), o texto do decreto, como temos feito sempre, ainda que seja certo que compreendemos ser necessário medidas porque temos de preservar a capacidade de resposta à saúde e o direito da população à saúde", declarou.
Vamos já no nono mês de crise, há setores económicos em rutura, muita gente em enormes dificuldades" (Catarina Martins)
"Aquilo que vemos é que não tem acontecido nenhuma alteração nessa área, mantendo-se uma fragilização do Serviço Nacional de Saúde, com os seus profissionais com muitos milhões de horas extraordinárias, muito cansados. Por outro lado, o Governo está a gastar milhares de milhões de euros em pagamentos a privados e esses preços não têm sido revistos. Não tem nenhum sentido que haja quem esteja a lucrar com a crise", rematou a bloquista.
PCP reitera oposição ao prolongamento do Estado de Emergência
O líder comunista, que foi a Belém acompanhado pelo líder parlamentar João Oliveira, reiterou a oposição do PCP à renovação do Estado de Emergência, alegando que as "pessoas não entendem" as medidas de prevenção adotadas. Além disso, referiu Jerónimo de Sousa, não se pode "subestimar a situação" e que "são precisas medidas de proteção sanitária e que garantam o combate à epidemia através do reforço do Serviço Nacional de Saúde, que está num momento crítico".
"O Estado de Emergência acabou por prevalecer sem resolver o problema. Antes pelo contrário. Os portugueses têm de perceber, tem de ser explicado, as medidas, o alcance, as consequências... As pessoas têm esta aflição, não entendem as medidas e veem os seus problemas a agravar-se quotidianamente" (Jerónimo de Sousa)
Jerónimo de Sousa chamou ainda à atenção para os efeitos nefastos em áreas de atividade económica como "restauração, setor da cultura e eventos e algumas indústrias". Ainda assim, garantiu que o Congresso do partido, agendado para o final deste mês vai não só realizar-se como "vai ser um exemplo".
CDS critica "navegação à vista" por parte do Governo
O CDS foi o primeiro partido a ser recebido em Belém esta quarta-feira. E à saída, ao final da manhã, o vice-presidente do CDS-PP Filipe Lobo d'Ávila criticou a atuação do Governo na atual segunda vaga da pandemia, lamentando a "navegação à vista". "O CDS aproveitou esta oportunidade para demonstrar ao Presidente da República que há aqui uma navegação à vista por parte do Governo que é particularmente preocupante. A impreparação nota-se pelo conjunto de medidas que são impercetíveis para a população em geral e, sobretudo, de eficácia muito duvidosa", afirmou.
O dirigente do CDS foi acompanhado por outro 'vice' do partido, António Carlos Monteiro, e sustentou que primeiro precisam de saber "quais são as medidas que o Governo se propõe fazer em termos de declaração de Estado de Emergência para tomar uma posição relativamente àquela que será a votação do CDS sobre esta matéria", justificou Lobo d'Ávila, admitindo, porém, que concorda com a intenção governamental de adotar medidas diferenciadas concelho a concelho, conforme os respetivos níveis de propagação da doença.
PEV deu a 'novidade' mas não quer nova Emergência
Ao final do dia de terça-feira, no Palácio de Belém, o deputado do Partido Ecologista "Os Verdes" (PEV) revelou aos jornalistas que a possibilidade de o Governo "escalonar os concelhos em função da gravidade" ao abrigo do estado de emergência, foi comunicada pelo Presidente Marcelo Rebelo de Sousa.
"Haveria um escalão mínimo para aqueles concelhos que estão entre os 240 e os 480 casos diários [por 100 mil habitantes], esse era o patamar mínimo, o que significa que as restrições aí vão ser mais leves. Há depois um escalão intermédio que envolve os concelhos entre os 480 casos e os 960; e um escalão máximo, onde as restrições vão ser mais intensas, nos casos onde os concelhos verificam um número superior a 960", adiantou.
Ainda segundo o deputado do PEV, só nos concelhos deste último escalão "é que haveria os limites que agora estão a existir ao nível dos fins de semana". "Ou seja, ao contrário do que se está a passar com este Estado de Emergência atualmente, aparentemente o Governo estará a ponderar dividir ou escalonar os concelhos em três em função da gravidade", explicou.
José Luís Ferreira manifestou, porém, a oposição do PEV à renovação do Estado de Emergência, rejeitando qualquer "restrição aos direitos, liberdades e garantias", e sustentou que é possível conter o aumento de casos de Covid-19 com medidas que não exigem o recurso a este quadro legal.
PAN considera Emergência "inevitável" mas quer que se repense restrições
Na opinião do PAN, que foi transmitida pelo deputado e porta-voz André Silva, "é inevitável" manter-se o Estado de Emergência "na medida em que é necessário restringir alguns contactos para evitar mais contágios e mais surtos", e impedir que "a situação fique descontrolada", mas defendeu que as restrições à circulação nos fins de semana devem ser repensadas.
"Todos nós de forma individual somos agentes de saúde e somos responsáveis por conter esta contaminação" (André Silva)"No entanto, tal como está neste momento a resolução do Conselho de Ministros prevista para as regras de confinamento ou de restrição de movimentos, parece-nos excessiva, no que diz respeito ao recolher obrigatório, ao confinamento a partir das 13h. Isso teve um impacto e está a ter um impacto enorme, devastador, na pequena restauração, no pequeno comércio", acrescentou, sugerindo que deva "ocorrer idealmente a partir das 15h/16h, permitindo a hora do almoço ao nível da restauração".
Segundo o porta-voz do PAN, devem ser tidos em conta os "vários contextos sanitários dos vários municípios", onde "há situações mais gravosas e mais impactantes, de maior risco do que outras", e pediu André Silva ao Governo deve ser acautelado "o mais breve possível futuros hospitais de campanha", recorrendo "a estruturas do Estado, nomeadamente estruturas militares, como por exemplo quartéis, para esse efeito".
Iniciativa Liberal afirma que Presidente quer renovar Emergência
O presidente do Iniciativa Liberal (IL) afirmou, à saída de Belém, que o Presidente da República quer renovar o Estado de Emergência, um quadro legal ao qual este partido se tem oposto, por considerar que tem permitido "cheques em branco".
Em declarações aos jornalistas, o presidente e deputado único do IL, João Cotrim Figueiredo, manifestou-se contra "medidas como recolher obrigatório a partir das 13h ao fim de semana", que "não fazem qualquer espécie sentido", e rejeitou um eventual recolher total, "porque mata ainda mais a economia".
Cotrim Figueiredo escusou-se, porém, a avançar qualquer proposta porque "com os dados de que disponho, não vou arriscar uma solução", além disso o Iniciativa Liberal não é o género de partido que acha que tem soluções mágicas", respondeu, alertando que "sem uma economia saudável não vai ser possível combater a pandemia" e que se não houver essa preocupação haverá a prazo "problemas superiores àqueles que a pandemia tem trazido".
"Uma economia débil, uma crise económica profunda, uma crise social profunda irá causar um problema ainda maior no futuro"
Sobre a renovação do Estado de Emergência por mais 15 dias, Cotrim Figueiredo revelou que "o que ficou claro é que o senhor Presidente da República tem vontade de que haja uma renovação" a partir de 24 de novembro. Mas, e apesar de considerar que "há medidas de contenção que podem ser necessárias" e que "algumas delas até podem necessitar do Estado de Emergência", "todas elas certamente necessitam de ser devidamente justificadas".
Chega aceita restrições mas rejeita Estado de Emergência sem conhecer medidas
O presidente do Chega, André Ventura, que foi o primeiro a ser ouvido no Palácio de Belém, admite aceitar as restrições à circulação, mas rejeita viabilizar o Estado de Emergência sem conhecer as medidas concretas a adotar pelo Governo.
"Se até tomámos o voto de abstenção no Estado de Emergência foi porque aceitámos que deveria haver um chapéu legal para impor algumas limitações. Essas limitações podem passar por imposições de medição de temperatura, como restrições à circulação em algumas zonas, etc. E em alguns casos mais graves admitimos restrições ao funcionamento da própria economia, ou até de alguns espaços, nomeadamente espaços onde a humidade é muito grande, espaços fechados e onde a propagação do vírus é mais facilitada", referiu.
"Se tudo se mantiver nos mesmos moldes como tem sido até agora, vamos votar contra o Estado de Emergência"André Ventura alegou, contudo, que "o Governo aproveitou o Estado de Emergência para impor uma série de restrições absurdas, muitas vezes confusas", sem dar conhecimento prévio aos partidos. Nesse sentido, concluiu, "não voltaremos a viabilizar nenhum Estado de Emergência sem saber quais são as reais condições em que as restrições são impostas".
O presidente do Chega contestou em particular a proibição de deslocações nos concelhos com maior taxa de incidência de casos de infeção com o novo coronavírus aos fins de semana a partir das 13h, considerando que "concentra as pessoas todas à mesma hora em alguns espaços" e que está "a ter um efeito ainda pior".
Recorde-se que, o atual período de 15 dias de Estado de Emergência, que começou no passado dia 9 e termina às 23h59 da próxima segunda-feira, foi aprovado no Parlamento com votos a favor de PS, PSD e CDS-PP, abstenções de BE, PAN e Chega e votos contra de PCP, PEV e Iniciativa Liberal.
Para renovar por mais 15 dias este quadro legal para a adoção de medidas de contenção da Covid-19, Marcelo Rebelo de Sousa tem de ouvir o Governo e ter autorização da Assembleia da República, estabelece a Constituição.
[Notícia atualizada às 23h05]
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