É ministro da Administração Interna, agora num Governo de gestão, contudo, não é devido à pasta que tutela que José Luís Carneiro se tornou num dos nomes mais falados do momento. Aos 52 anos, é candidato à liderança do Partido Socialista (PS) e, no horizonte, vê a possibilidade de se vir a tornar primeiro-ministro.
Nascido em Baião, onde foi presidente de câmara, conta com uma vasta experiência política que, em entrevista ao Notícias ao Minuto, diz querer colocar "ao serviço do PS e ao serviço do país".
Numa altura em que a campanha entra nos últimos dias, José Luís Carneiro diz ter o projeto que "vai ao encontro da vontade maioritária dos portugueses" e defende que se deve "despolarizar" o debate político e "procurar espaço de encontro e diálogo", perante uma sociedade que quer "previsibilidade e estabilidade".
Afirma estar a "concorrer para ganhar as eleições" e admite que o novo aeroporto será uma prioridade. Quanto a António Costa, com quem mantém uma "relação pessoal de muita estima", considera que este "tem ainda um grande futuro político à sua frente".
Este projeto é aquele que melhor pode ir ao encontro daquela grande maioria que dá as grandes vitórias eleitorais
Estamos numa semana que é decisiva para o futuro do PS e, inevitavelmente, para o seu. Mantém a confiança que tem transmitido ao longo das últimas semanas?
Sim, há razões para acreditar que é possível ganhar a confiança maioritária dos meus camaradas e também, a seguir, ganhar a maioria da confiança dos portugueses. As duas grandes sondagens que foram feitas - tratando-se de um retrato do momento, como é evidente há uma dinâmica própria que depois pode alterar os dados - mostram que esta candidatura e o perfil desta candidatura vai ao encontro daquilo que é uma apreciação positiva da maioria dos portugueses. E, nesta hora de reflexão, em que os militantes estão a refletir como hão de agir, como hão de votar, o meu apelo é para que procurem ouvir aquilo que a sociedade tem para lhes transmitir, na rua, nos cafés, nos locais de trabalho. Que procurem aquilo que os cidadãos estão a transmitir ao PS que, na leitura que faço, é que este projeto é aquele que melhor pode ir ao encontro daquela grande maioria que dá as grandes vitórias eleitorais, ora a um partido, ora a outros partidos.
Nessas sondagens, de que fala, é o preferido dos portugueses para assumir não só a liderança do PS, mas também o cargo de primeiro-ministro, contudo, quando olhamos para aqueles que deram a maioria absoluta ao PS nas últimas legislativas, o escolhido é Pedro Nuno Santos.
Não. O que é dito é 'Mas quem é que acha que vai ganhar as eleições dentro do PS'. O Pedro Nuno começou como, digamos, o camarada que ia ganhar as eleições, e as pessoas formaram a ideia de que ele iria ganhar as eleições dentro do PS. Mas, o que importa, na decisão dos militantes, é saberem aquilo que os portugueses entendem como o mais apropriado para servir o país. A mais importante sondagem é ouvir as pessoas que estão na rua, que estão no café, no mercado, as pessoas que trabalham com os nossos camaradas, nos seus locais de trabalho, é ouvirem aquilo que têm para lhes dizer. E se ouvirem essas pessoas que dão as maiorias políticas, então decidirão dar-me a sua confiança maioritária. E é isso que tem vindo a acontecer por todo o país. Há ainda muitos camaradas que estão indecisos, mas o apelo que faço é para que confiem o seu voto na minha candidatura, porque ela é aquela que vai ao encontro da vontade maioritária dos portugueses.
Demissão? Vamos aguardar pelos resultados eleitorais, depois decidirei
Caso vença e consiga o desejado cargo de secretário-geral do PS, vai manter-se ministro ou a demissão é quase certa?
Vamos aguardar. Esta é uma função de grande responsabilidade. Tenho a tutela das forças de segurança e tenho a tutela de vários setores e serviços do Estado que são essenciais à nossa vida. Vamos aguardar pelos resultados eleitorais, que já serão conhecidos no próximo fim de semana, depois decidirei. Naturalmente, sempre tendo em consideração o interesse público e a isenção e a imparcialidade que devem imperar nas decisões.
Mas, certamente, já pensou nisso.
Vamos avaliar e decidirei no momento oportuno.
Coloquei-me à disposição dos meus camaradas(...) tendo, por objetivo, com os valores do PS e com os princípios do PS, do socialismo democrático, servir Portugal
Foi o primeiro a anunciar que estava na corrida à liderança socialista, apenas dois dias depois da demissão de António Costa. Era algo que ambicionava há algum tempo ou foi uma decisão de última hora?
Primeiro, quis ouvir o nosso primeiro-ministro, ele teve uma reunião com todos os membros do Governo, quis ouvi-lo sobre a sua decisão. Concordei e apoiei a sua proposta para que, junto do senhor Presidente da República, apresentasse uma alternativa que permitisse ao Governo cumprir o seu mandato, ou seja, a esta maioria política cumprir o seu mandato até 2026. Após a decisão do senhor Presidente da República, ouvi os meus camaradas na Comissão Política e manifestei a minha disponibilidade para me habilitar ao cargo de secretário-geral. Já tinha sido secretário-geral adjunto e coloquei-me à disposição dos meus camaradas para me candidatar a esta função, tendo, por objetivo, com os valores do PS e com os princípios do PS, do socialismo democrático, servir Portugal.
Mas chegou a ter uma conversa privada com António Costa, imagino. Sentiu apoio à sua candidatura?
Fundamentalmente, apenas comuniquei na tarde da Comissão Política Nacional ao presidente do partido, Carlos César, a minha disponibilidade para, depois de ouvir a Comissão Política, colocar a minha experiência política, que é longa, são quase 30 anos de serviço público como autarca, como secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, como deputado, como secretário-geral adjunto e como ministro da Administração Interna, com uma experiência europeia também já grande, estive 10 anos no Comité de Regiões, estive também várias vezes no Conselho Europeu de Justiça e Assuntos Internos, portanto, para colocar essa experiência num momento especialmente exigente na vida do país, ao serviço desses valores da liberdade, da igualdade e da fraternidade, para servir o país. Informei o presidente do partido e também informei o meu secretário-geral, António Costa.
Costa? Mantemos uma relação pessoal de muita estima, de muita consideração e de uma lealdade inquebrantável que se manifestou em todos os momentos
Mas o que lhe perguntei foi se sentiu o apoio de António Costa quando fez essa comunicação. Acredito que mantenham uma relação mais pessoal.
Sim, mantemos uma relação pessoal de muita estima, de muita consideração e de uma lealdade inquebrantável que se manifestou em todos os momentos desde que me convidou para secretário de Estado das Comunidades Portuguesas e que me deu um testemunho de grande confiança quando me convidou para secretário-geral adjunto e agora, também, para ministro da Administração Interna. Em todos os momentos, mantive essa absoluta lealdade, o que significa que, naturalmente, não revelarei as conversas que tive com ele do ponto de vista pessoal.
Acredita que vai contar com o voto dele?
Gostaria muito de ter o voto dele.
Olhando para a sua moção, fica claro que quer apertar as regras de transparência na política. Foi uma lição que tirou das inúmeras polémicas que assombraram os últimos governos, nomeadamente este do qual faz parte?
É preciso, primeiro, afirmar que o Partido Socialista, nos diferentes momentos em que esteve no governo, foi dos partidos que mais contribuiu para aperfeiçoar o nosso sistema judicial e para o capacitar com meios para cumprir a sua missão. Ainda há poucos dias, pôde certamente ver o próprio diretor nacional da Polícia Judiciária dando conta de que houve um reforço sem precedentes dos meios humanos da Polícia Judiciária, para cumprir a sua missão de apoio e de auxílio ao Ministério Público, para que a Justiça possa ser administrada de forma ainda mais completa e mais célere.
Casos e casinhos são demonstração de que a Justiça funciona
Peço desculpa, mas isso não apaga os inúmeros "casos e casinhos", e foi António Costa que se referiu assim a eles, nos quais estiveram envolvidos vários membros do Governo.
Mas, veja, essa é a demonstração de que a Justiça funciona. A garantia de que a Justiça funciona é a de que todos aqueles que têm prevaricado no exercício das suas funções públicas estão sujeitos à administração da Justiça.
Por outro lado, entendemos, também, que é útil ao país que a sociedade, no seu conjunto, tendo em vista reforçar os níveis de confiança nas suas instituições, possa dialogar sobre como podemos aperfeiçoar o Sistema de Justiça. Ainda outras áreas que são conhecidas, uma delas tem que ver com a celeridade processual, pese embora termos reduzido em 50% o número de pendências na Justiça. Por outro lado, evitar a conexão de processos, os chamados megaprocessos, que envolvem muitos meios, mas depois têm eficácia reduzida, e também garantir níveis mais elevados de prestação de contas e de transparência no exercício e na administração da Justiça.
Disto isto, a nossa moção propõe, nomeadamente, reforçar as medidas que já foram adotadas na anterior legislatura, também por iniciativa do PS, no que respeita ao aprofundamento do escrutínio do exercício da atividade política ou da atividade pública por parte de titulares de órgãos políticos. Propõe também por exemplo, que se regulamente o 'lobbing'. É algo que tem vindo a ser feitos nos países europeus e também assumimos na nossa moção esse objetivo, assim como o desenvolvimento de uma cultura de prestação de contas, nomeadamente no âmbito partidário.
Assumimos, com clareza, já há muito tempo, a subscrição de uma declaração de compromisso de honra de todos aqueles que são candidatos ao desempenho de funções políticas, a que estão todos obrigados e a que devem obedecer, e tem havido casos em que, por força do incumprimento dos deveres para com o interesse público, tenham sido, muitas vezes convidados a abdicarem das suas próprias candidaturas. É uma prática que tem vindo a ser desenvolvida no Partido Socialista e são práticas que devem ser ainda melhoradas e aperfeiçoadas.
Já vamos a propostas concretas. O senhor já elogiou as "contas certas" de Fernando Medina e já se assumiu como um garante da continuidade das políticas deste Governo. No que é que se pode esperar que José Luís Carneiro seja diferente de António Costa?
Aí há que manter. Eu considero-me honrado por participar num Governo que valorizou rendimentos, valorizou as prestações sociais, propõe-se reduzir, para 2024, 1.700 milhões de euros de IRS, promove investimento público nas funções sociais do Estado, na Saúde, na Educação, nos Transportes, na Mobilidade, na Habitação, e, ao mesmo tempo, também apoia o investimento privado. Sinto honra e orgulho em defender esse legado de boas políticas públicas que permitiram que Portugal tenha vindo a convergir economicamente com os países da União Europeia e tenha vindo também a reduzir a pobreza e as desigualdades no país. Sendo que, deve continuar a merecer a nossa atenção e o nosso maior empenhamento.
Mas, dito isto, as contas certas trata-se de um compromisso para com as novas gerações. Porque, caso queiramos manter um país no qual as mais jovens gerações possam realizar os seus projetos de vida, temos de lhes legar um país que não esteja sob assistência nem sob tutela internacional. Temos de garantir um país no qual podem autodeterminar a sua vontade. Para esse efeito, as contas públicas em ordem são um compromisso de futuro. Por outro lado, contas públicas em ordem, redução da dívida pública, superavit orçamental, permite reduzir os encargos com a dívida, com os serviços da dívida e libertar milhares de milhões de euros para financiar as funções sociais do Estado. E, por último, contas públicas saudáveis permitem, nomeadamente, adotarmos aquele instrumento que, pela primeira vez fica no Orçamento do Estado, que é um instrumento de investimento público que permite assegurar, no futuro, níveis elevados de investimento público, independentemente ou não de termos fundos europeus.
A minha concordância é com as políticas, com as opções programáticas e com a liderança do primeiro-ministro
Mas não encontra defeitos na governação de António Costa? Questionei diretamente no que é que poderá ser diferente.
Nós temos de olhar para duas dimensões, que são diversas. Uma questão tem que ver com as políticas e com as opções programáticas, portanto, a minha concordância é com as políticas, com as opções programáticas e com a liderança do primeiro-ministro. Se me perguntar ‘então mas houve erros, houve falhas?’, com certeza que houve erros e com certeza que houve falhas.
Peripécias no Ministério das Infraestruturas não deviam ter acontecido. É um exemplo. Houve outras peripécias em atitudes e comportamentos individuais
Quais?
Por exemplo essas peripécias, digamos assim, no Ministério das Infraestruturas. Foram peripécias que não deviam ter acontecido. É um exemplo. Houve outras peripécias em atitudes e comportamentos individuais que eram dispensáveis e que fragilizaram a nossa imagem pública? Sim, é verdade. Deveríamos ter evitado que tivesse acontecido. Agora, olhando estruturalmente para as opções de política, olhando estruturalmente para a liderança transformacional de António Costa, que fez com que a própria Europa tivesse alterado algumas das suas opções de política, no modo como recuperamos rendimentos, no modo como protegemos as famílias, no modo como protegemos as empresas, como enfrentamos a pandemia, produzindo emprego por intermédio do lay-off, protegendo as empresas, contribuindo para um Plano de Recuperação e Resiliência e tendo, de novo, uma voz ativa na Europa para continuarmos a investir na modernização da nossa economia, na modernização do Estado e na modernização da nossa sociedade, ou seja, do ponto de vista das políticas adotadas, naturalmente, que tenho orgulho nas opções de política que têm vindo a permitir afirmar o prestígio do nosso país e a melhoria das condições de vida dos nossos concidadãos.
Sim, teria aceitado a demissão de João Galamba
Apontou aí erros, por exemplo, dentro das Infraestruturas. Olhando para a altura em que João Galamba apresentou a sua demissão e António Costa decidiu não aceitar, se fosse primeiro-ministro teria aceitado essa demissão?
Sim, teria aceitado essa demissão. Tanto mais que correspondia à própria vontade de João Galamba. Aqui, quero deixar ficar, naturalmente, uma palavra de reconhecimento pessoal, mas tendo em conta os incidentes que ocorreram dentro do Ministério, entendia que, efetivamente, seria de aceitar a sua demissão. É claro que o primeiro-ministro viu naquele contexto, nomeadamente o contexto da própria Comunicação Social ter tornado pública aquilo que poderia ser uma decisão, também vinha compreender, portanto, a razão, digamos, da decisão definitiva do primeiro-ministro. Mas é evidente que o ministro procedeu bem ao ter colocado o seu lugar à disposição.
Não podemos deixar ficar os idosos totalmente na dependência da condição de rendimento dos seus filhos
Vamos então falar especificamente de algumas medidas. Vamos focar-nos nas alterações que quer fazer ao Complemento Solidário para Idosos, que prometeu, aliás, "aperfeiçoar". Que alterações são estas? Pode concretizar?
Duas questões. Os termos da sua atribuição. Hoje, essa prestação é atribuída em função de um pedido, o que torna o processo burocrático. Portanto, encontrar um mecanismo mais ágil na sua atribuição. E olhar para a condição de rendimentos para efeitos de atribuição, porque ela hoje está muito na dependência da disponibilidade de rendimentos dos filhos e nem sempre os filhos cumprem os deveres com os pais. E, há algo que eu sei: é que não podemos deixar ficar os idosos totalmente na dependência da condição de rendimento dos seus filhos.
Já tem uma fórmula? Já pensou nisso?
É algo que terá de ser trabalhado posteriormente e após assumir responsabilidades executivas.
O compromisso que assumi foi de me sentar com os representantes dos professores e avaliar
Aquele que é tido como o seu principal adversário, Pedro Nuno Santos, defende a devolução do tempo de serviço congelado aos professores, e não só. Como é que olha para esta proposta? A avançar, acha que é uma irresponsabilidade?
Nós, primeiro, temos de ter um ponto de partida. E qual é o ponto de partida que os professores e os seus representantes têm de reconhecer ou devem reconhecer? O Governo conseguiu a vinculação de 20 mil professores, oito mil deles vinculados no último ano. Segundo, foi este Governo, o Governo do PS, que descongelou as carreiras e que retomou as progressões na carreira. Terceiro, este Governo também introduziu o chamado acelerador de carreiras que já alcançou, pelas informações que disponho, quatro mil professores. Por outro lado, foi também este Governo do PS que passou de dez quadros de zona pedagógica para 63 quadros de zona pedagógica, o que significa aproximar os professores da sua área de residência e combater aquela ideia dos professores com a casa às costas. E, agora, é aqui que está o ponto, há ainda um alegado nó górdio para resolver. Transmitem-me que a aplicação da fórmula de descongelamento e contagem de serviço ainda tem desigualdades e o compromisso que assumi foi de me sentar com os representantes dos professores e avaliar se se confirmam essas desigualdades. Caso se confirmem, temos de avaliar os custos que elas têm. Avaliados os custos, temos de decidir se o Orçamento do Estado tem ou não tem condições, porque se transforma numa despesa permanente, para remover estas desigualdades. A minha vontade é para que essas desigualdades, a existirem, possam ser removidas, mas temos de avaliar, digamos, os custos dessa remoção e em que termos é que essas desigualdades podem ser removidas.
Mas falemos de Pedro Nuno Santos, que não defende apenas a recuperação do tempo de serviço congelado dos professores, mas de todos os funcionários públicos. É uma irresponsabilidade a acontecer? Acha que se trata de uma mera promessa?
Não me quero estar a pronunciar sobre aquilo que defende o meu camarada. Aquilo que eu defendo é isto.
Recuperação do tempo de serviço? Vi afirmações divergentes por parte de Pedro Nuno Santos
Mas vocês são adversários, talvez seja importante, incluindo para os próprios militantes, encontrar um contraste de ideias.
Porque eu vi afirmações divergentes. Ou seja, primeiro, vi que na moção estava a assunção de descongelamento de serviço e contagem de todo o tempo de serviço de toda a Administração Pública, depois verifiquei também que havia mais um outro compromisso, que era a contagem de todo o serviço dos professores. Posteriormente, ouvi afirmações de que não se tratava de reconhecer o tempo de serviço congelado de toda a Administração Pública e também que em relação aos professores que era necessário conhecer os números e os dados da unidade técnica de apoio orçamental. Foi isso que eu ouvi. Portanto, não posso ser eu a explicar o que é que se estará afirmar. Se é uma realidade, se é outra. Só mesmo o candidato Pedro Nuno, o meu camarada, poderá explicar.
Portanto, não se sente esclarecido?
Não.
Despolarização do debate político ajudará a servir o interesse nacional e, particularmente, a defender a Democracia e a defender a liberdade e os valores constitucionais
Ao longo da sua campanha, tem referido, várias vezes, que votar em si é escolher o diálogo e afastar radicalismos. Quando fala em radicalismos, admite que se refere a Pedro Nuno Santos?
Não, não tem que ver com isso. Tem que ver com o seguinte: entendo que hoje, julgo que é, aliás, uma evidência para todos, que as sociedades estão demasiadamente polarizadas. A polarização excessiva das sociedades leva a que os extremos, quer extrema-direita, quer extrema-esquerda, ganhem espaço mediático e ganhem espaço político, absorvendo e anulando o espaço do consenso e da convergência. Ora, entendo eu, que é desejável, do ponto de vista do nosso futuro, desenquistar, despolarizar, o debate político e procurar espaço de encontro, espaço de consenso, espaço de diálogo, para servir o país. Porque, do meu ponto de vista, essa despolarização do debate político ajudará a servir o interesse nacional e, particularmente, a defender a Democracia e a defender a liberdade e os valores constitucionais.
As outras candidaturas, particularmente a candidatura de Pedro Nuno, adota uma linguagem de muita bipolarização e a linguagem da bipolarização fomenta a polarização. Do meu ponto de vista, ao fomentar a polarização, ela cava trincheiras e não aproxima posições
Antes de irmos ao diálogo, pergunto-lhe no que é que o PS ficará a perder se for Pedro Nuno Santos a vencer esta batalha?
Em regra, as outras candidaturas, particularmente a candidatura de Pedro Nuno, adota uma linguagem de muita bipolarização e a linguagem da bipolarização fomenta a polarização. Do meu ponto de vista, ao fomentar a polarização, ela cava trincheiras e não aproxima posições. Eu entendo que o país, nesta fase, e a sociedade portuguesa querem diálogo, querem previsibilidade, querem um horizonte de estabilidade para podermos garantir o compromisso com, nomeadamente, as opções de política orçamental e com os compromissos que nos deram a maioria absoluta. Valorizar rendimentos, valorizar salários, valorizar as prestações, particularmente das crianças e dos idosos, nomeadamente a trajetória de valorização das pensões, continuar com a política de redução, nomeadamente IRS, que é algo de muito importante para as classes médias, e continuar a estimular o investimento na economia, a modernização da economia e a sua diversificação a partir do conhecimento e da inovação.
É isso que os portugueses desejam, mas têm a consciência plena, por aquilo que me vão transmitindo por todo o país, de que para que alcancemos esses objetivos, de manter a economia portuguesa a crescer, de manter níveis elevados de emprego, para garantirmos esse horizonte, temos de ter previsibilidade para quem investe. Portanto, entendo que, para termos essa previsibilidade e essa estabilidade, é essencial que o grande centro político e social, os partidos democráticos sejam capazes de dialogar uns com os outros.
Já admitiu, noutras entrevistas, que ficou surpreendido por ver Francisco Assis ao lado de Pedro Nuno Santos. Já teve oportunidade de esclarecer essa questão?
Respeito a decisão do meu camarada e amigo Francisco Assis.
Eu estou a concorrer para ganhar as eleições. Não há um ponto neste país, onde eu tenha parado nesta campanha eleitoral, onde não tenha tido manifestações espontâneas de apoio
Vamos então dar um passo à frente e olhar para as legislativas. Admite governar, mesmo que fique em segundo lugar?
Eu estou a concorrer para ganhar as eleições e o que mostram as sondagens é que eu tenho condições. Não sou eu, o projeto que tenho a honra de liderar tem condições para ganhar as eleições. A sondagem da Católica dava-me 42% e dava 37% a Luís Montenegro e eu estava há 15 dias como hipotético candidato. A última, do Expresso, SIC, ISCTE, dava mais de cinco pontos à frente do principal competidor. Portanto, eu partirei para esta eleição, naturalmente com muita humildade democrática, mas com a consciência de conhecer aquilo que as pessoas me transmitem na rua. Não há um ponto neste país, onde eu tenha parado nesta campanha eleitoral, onde não tenha tido manifestações espontâneas de apoio para que, ganhando o PS, pudesse contar com o apoio da sociedade portuguesa.
Sondagens podem ser ferramentas de trabalho, mas ainda não ganham eleições.
Com certeza. Com certeza. É verdade. E a realidade é dinâmica. Mas, apesar de tudo, é melhor ter sondagens que nos dão a ganhar do que sondagens que nos dão a perder.
Quando nós defendemos a autonomia do PS, não é uma autonomia para nos fecharmos sobre nós próprios, é uma autonomia para podermos decidir
Completamente. Mas acredito que tenha, obviamente, pensado em todas as possibilidades e uma delas é esta: pode não vencer.
Quando nós defendemos a autonomia do PS, não é uma autonomia para nos fecharmos sobre nós próprios, é uma autonomia para podermos decidir. Por isso é que desde muito jovem fui empreendedor, porque queria decidir por mim próprio, queria tomar as minhas próprias opções. O PS também quer essa sua autonomia, para decidir na hora certa como é que poderá servir o país. Nós, já servimos o país dialogando e estabelecendo compromissos políticos com os partidos à nossa esquerda e há um espaço de convergência com a nossa esquerda que é natural, nomeadamente para valorizar as funções sociais do Estado, para modernizarmos o Estado nas suas funções sociais. Mas também há um campo de convergência com o centro político e social, nomeadamente para servirmos as funções estratégicas, as funções de soberania. Por exemplo, a reforma do sistema político. Não é possível avançar com a reforma do sistema político se não houver um acordo que represente dois terços dos deputados da Assembleia da República.
Não podemos excluir cenários quando estamos a partir para um ato eleitoral
Mas já disse que uma reedição da geringonça não é opção. É certo que essa é mesmo uma carta fora do baralho?
Nós não podemos excluir cenários quando estamos a partir para um ato eleitoral. Quando chegarmos ao fim das eleições e olhar para os resultados vamos conhecer o peso político do PS. E, assim como não diabolizo a esquerda, porque são parceiros com os quais construímos muitas soluções governativas, nomeadamente para valorizar salários, para valorizar pensões, para valorizar serviços públicos, também não devemos diabolizar o centro político, porque é com esse diálogo e com esta autonomia que o PS pode construir as melhores políticas para o país.
Quando fala em diálogo, fala de acordos? Afasta coligações?
Diálogo parlamentar. Afasto, sobretudo, a formação de governo com outros partidos. Fundamentalmente, estou a falar de encontrar posições com suporte parlamentar, em sede de Orçamento, em sede de compromissos. O pacto para a Habitação, por exemplo, é um pacto que vai exigir compromissos com os partidos à nossa esquerda e ao centro político, com os partidos democráticos, para as próximas gerações. Dou um exemplo: quando eu era secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, estive na origem de uma das principais mudanças, que foi o recenseamento automático dos portugueses no estrangeiro, que permitiu mais de um milhão e trezentos mil portugueses poderem estar nos cadernos eleitorais e votarem nas eleições. Contei com o apoio de todos os partidos, só com a abstenção do CDS. Ora, há demonstrações práticas de que é possível construir soluções de política para o país, com o apoio dos partidos democráticos.
Não foi por vontade do Partido Socialista que houve uma crise política em 2021
Insistido na questão da chamada geringonça. Nós já o vimos criticar esta solução e, numa entrevista ao Observador, Pedro Nuno Santos disse que quem critica essa solução governativa também critica António Costa e que "quem quer ser herdeiro, é herdeiro de tudo".
Claro. Mas foi sempre assim que me coloquei. Há aqui uma tentativa, digamos, de alguma valorização de percurso. Nós temos de dar conta do seguinte: a experiência do acordo parlamentar com o PCP e com o Bloco de Esquerda foi uma experiência positiva, que permitiu recuperar direitos, recuperar salários, recuperar pensões, recuperar bens e serviços públicos do Estado. Já o disse mais do que uma vez. Agora, a experiência, entre 2015 a 2019, foi diferente a partir de 2019, porque não foi por vontade do Partido Socialista que houve uma crise política em 2021. E fomos a eleições e os portugueses deram-nos uma maioria absoluta. E porquê? Porque entenderam que o Partido Socialista devia ter autonomia para governar o país de acordo com os seus valores e de acordo com os seus princípios. Significa isto que nós devemos ter condições para dialogar com os partidos à nossa esquerda e também dialogar com os partidos de centro político social para servir o país. O diálogo deve ser para esse objetivo. E eu estou convicto de que é possível encontrar e fazer um diálogo que sirva o país, seja ele feito com o PCP, seja feito com o Bloco de Esquerda com o PAN, com o Livre.
Por exemplo, o Livre tem apresentado propostas muito construtivas sobre a melhoria do próprio sistema político, sobre a melhoria das condições de vida. O Bloco de Esquerda também apresenta propostas muito válidas, assim como o próprio Partido Comunista Português, na valorização das condições de vida dos trabalhadores, na dignificação das condições laborais. Portanto, há matérias, como tenho dito, em relação às quais é possível e desejável que haja uma ampla convergência política.
E com a direita como é que vai ser esse diálogo?
Olhe, veja, por exemplo, com os partidos, nomeadamente com o PSD, que é o grande representante do centro-direita e da direita portuguesa, há matérias de reforma do sistema político, há matérias de soberania, dos nossos compromissos atlânticos, dos nossos compromissos europeus, que terão de ser sempre construídos com o PSD e também com o CDS, aliás, à luz daquilo que foi feito por Mário Soares. Mario Soares quando lutou contra a ditadura de direita, mas também quando procurou impedir que houvesse uma, digamos um regime de sinal contrário no país, fê-lo em diálogo com o PPD e com CDS para construir e afirmar as nossas liberdades fundamentais. O doutor António Costa, em 2015, conseguiu garantir um acordo que salvaguardava os nossos compromissos europeus e os nossos compromissos atlânticos e concentrámo-nos na recuperação de direitos, na valorização das funções sociais do Estado, para validar esse acordo. Foi muito positivo. Eu próprio fui secretário de Estado das Comunidades durante esse governo e na minha área nunca houve áreas de divergência. Podia haver áreas de divergência na intensidade das respostas ao reforço dos serviços consulares, ao reforço de pessoal no Ministério dos Negócios Estrangeiros. Quero com isto dizer que, tendo capacidade para dialogar e para não diabolizar os partidos à nossa esquerda, mas também para não diabolizar os partidos de centro-direita, teremos um espaço amplo de diálogo, para afirmar essa mesma autonomia.
O PS não é um partido das inevitabilidades. É um partido que remove as desigualdades
Não sente que é essa abertura à política de centro-direita que deixa, talvez, alguns militantes receosos?
Bem, que seja claro, eu sou um socialista democrático e já dei provas, na minha vida concreta, de políticas de serviço à justiça social. Transformei o meu concelho, quando fui presidente de câmara, num dos concelhos que tinha maiores taxas de abandono e de insucessos escolares num dos que estava entre os melhores em termos de abandono e de insucessos escolares. Isto é justiça social. Estive nas políticas mais inovadoras do país, de apoio aos mais idosos. Olhe, os contratos locais de desenvolvimento social, eu estive na origem dessa resposta dada aos mais idosos. Isto é justiça social. Eu estive nas primeiras respostas das unidades móveis de saúde e de reforço dos cuidados primários de saúde. Isto é justiça social, isto é igualdade. Como secretário de Estado das Comunidades Portuguesas, eu estive sempre junto daqueles que mais precisavam de mim e do Estado. O que é que isso significa? Significa o sentido profundo de compromisso com a igualdade e com justiça social.
Agora, o que é que eu também defendo? Defendo que nós, com este sentido da igualdade e da justiça social, temos também de valorizar a liberdade, a liberdade para empreender na economia, a liberdade para empreender na sociedade, o respeito pelas liberdades individuais, ou seja, é aqui que está a dimensão da liberdade que faz com que, por exemplo, em relação a esta candidatura, sempre tenha dito que era uma candidatura com o destino manifesto, contra a chamada inevitabilidade. O PS não é um partido das inevitabilidades. É um partido que remove as desigualdades, para afirmar a liberdade, a igualdade e a fraternidade.
Eduardo Cabrita diz que o senhor está a passar por uma “crise de identidade” quando fala desta aproximação ao PSD.
Eu tenho muita autoestima pessoal e sinto-me bastante bem e tenho, aliás, muita estima também pelo meu camarada Eduardo Cabrita.
Não quer tecer mais comentários?
Não. Até desconhecia essa declaração.
O Chega, para nós, está de fora desta equação do diálogo político
Voltando ao diálogo. Chega e Iniciativa Liberal estão de fora?
O Chega, para nós, está de fora desta equação do diálogo político. Mas que fique claro, eu sou favorável ao diálogo e à construção de políticas públicas com os partidos à nossa esquerda, mas sou do socialismo democrático, não me confundo é com os partidos à minha esquerda.
O PS é uma bússola do socialismo democrático, ou seja, do socialismo em liberdade. Significa que partimos para as eleições livres e sem condicionamentos, chegaremos ao fim das eleições livres e sem condicionamentos
Continua a recusar responder se irá viabilizar um governo minoritário do PSD, caso não fique em primeiro?
Eu estou a concorrer para ganhar as eleições. É para ganhar as eleições que eu concorro. E, no dia das eleições, nesse dia à noite, vamos avaliar a maioria que os portugueses nos vão dar. Depois terei de ouvir os órgãos do Partido Socialista sobre a forma como o PS se vai posicionar em relação ao futuro.
Permita-me aqui citar o que disse Mário Soares, em 1980, sobre a autonomia estratégica. Talvez seja importante para que todos saibam o que disse Mário Soares, já que estão a invocar, permanentemente, o nosso legado histórico. Diz Mário Soares: 'A afirmação com total autonomia do projeto de sociedade do PS e a preservação do seu papel de grande partido de esquerda, totalmente independente, são, por isso, condições imprescindíveis para manter em aberto todas as possibilidades de uma evolução progressista e de esquerda, em Portugal, tendo como bússola o socialismo democrático'. Isto é aquilo que eu defendo. Ou seja, o PS é uma bússola do socialismo democrático, ou seja, do socialismo em liberdade. Significa que partimos para as eleições livres e sem condicionamentos, chegaremos ao fim das eleições livres e sem condicionamentos, para decidirmos como poderemos servir o nosso país.
Com todas as possibilidades em aberto?
Com todas as possibilidades em aberto.
Novo aeroporto? Tem de ser uma das nossas prioridades, mas temos de cumprir a palavra dada pelo primeiro-ministro ao líder do maior partido da oposição
Vamos tocar noutro ponto, especificamente a localização do novo aeroporto. Esta será uma das primeiras decisões que tomará caso seja eleito primeiro-ministro?
Sim. Tem de ser uma das nossas prioridades. Mas sendo uma das nossas prioridades, temos de cumprir a palavra dada pelo primeiro-ministro, António Costa, ao líder do maior partido da oposição, procurando consensualizar a decisão com o maior partido da oposição, porque estamos a falar de uma obra que atravessará vários governos e é desejável que ela possa ser consensualizada à luz do princípio que foi estabelecido para as grandes obras públicas. E, por isso, se constituiu o Conselho Superior das Obras Públicas, para ter um amplo consenso na sociedade e na sua representação política em relação aos investimentos do futuro.
Ou seja, ao contrário de Pedro Nuno Santos, não avança sem um consenso?
Procuraremos estabelecer o consenso, mas não podemos ficar reféns do consenso, porque o país tem de avançar com esse investimento que é prioritário.
Operação Influencer? Seria desejável que, no caso em concreto do primeiro-ministro, pudesse haver um desfecho que pudesse permitir que a sua vida não ficasse em suspenso indefinidamente
Seria também importante olhar para o que nos trouxe até aqui. Refiro-me à Operação Influencer, que voltou a ser tema, sobretudo, porque o primeiro-ministro tornou a manifestar-se sobre ela. Acha que António Costa fez bem em demitir-se?
Ele explicou a razão pela qual se demitiu e a razão foi a de procurar defender a dignidade e prestígio das instituições. E, portanto, é uma razão atendível e compreensível. Por outro lado, temos de respeitar a presunção da inocência, nomeadamente do primeiro-ministro e de todos os outros, e temos também de respeitar o princípio da independência da Justiça e da autonomia do Ministério Público. Feita esta ressalva, é evidente que, tendo em consideração o impacto na confiança das instituições e no prestígio das instituições nacional e internacional, como é evidente, e sem prejudicar a profundidade e a extensão da investigação, tanto quanto possível, seria desejável que, neste caso em concreto do primeiro-ministro, pudesse haver, digamos, um desfecho que pudesse permitir que a sua vida não ficasse em suspenso indefinidamente.
Entende que as explicações de Lucília Gago sobre o polémico parágrafo que ditou a demissão de Costa foram suficientes?
Não me quero pronunciar.
E concorda com aqueles que disseram que António Costa não tem futuro político?
O doutor António Costa, do meu ponto de vista, tem ainda um grande futuro político à sua frente. Trata-se de um dos políticos europeus mais experientes e com provas dadas. Pelo que entendo que tem ainda um grande futuro político à sua frente.
Qualquer um de nós gostava de ver António Costa na nossa campanha
Gostava de o ver na sua campanha?
Julgo que qualquer um de nós gostava de ver António Costa na nossa campanha. Mas, naturalmente, temos de respeitar agora também a sua privacidade, a sua própria intimidade e respeitar o seu espaço.
Como vê o caso das gémeas luso-brasileiras tratadas em Portugal, que envolve o Presidente da República?
Por aquilo que vejo na opinião pública, as instituições competentes já têm o caso, que lhes foi participado por parte do senhor Presidente da República, devemos aguardar pelo desenvolvimento do processo. Aquilo que sei é que temos de evitar, neste e nos casos anteriores, seja o caso com o primeiro-ministro e outros membros do Governo, seja também neste caso, juízos precipitados. Temos de evitar formular juízos que correspondam a julgamentos na praça pública, temos de deixar que as instituições fluam no cumprimento das suas atribuições e dos seus deveres, separando as dimensões da justiça, das dimensões da política.
Tenho da vida pública um sentido de missão e de serviço público. Nunca mexeu comigo o estatuto de ministro ou de secretário de Estado, de deputado ou de presidente de câmara, isso para mim é o menos relevante
Para terminar. Além do que estamos habituados a ver, além do ministro da Administração Interna, que é impossível dissociar de si neste momento, quem é José Luís Carneiro e porque é que as pessoas devem confiar em si para o futuro?
Sou alguém que procura servir o interesse público, que procura servir os outros e a sociedade como um todo, que acredita que é possível ter uma sociedade ainda melhor, que permita a plena realização das mais jovens gerações do nosso país. Sinto que temos todos um legado, um legado que nos veio de antes do 25 de Abril e depois do 25 de Abril, um legado das liberdades, dos direitos, das garantias, da defesa intransigente da Democracia e dos Direitos Humanos, e sinto que somos portadores desse legado e que temos o dever de defender esse legado e de o transmitir, se possível ainda, aperfeiçoado às futuras gerações.
E tenho da vida pública um sentido de missão e de serviço público. Nunca mexeu comigo o estatuto de ministro ou de secretário de Estado, de deputado ou de presidente de câmara, isso para mim é o menos relevante. Naturalmente, devemos valorizar o prestígio e a dignidade das funções e dos cargos, mas tenho dos cargos um sentido de função e de missão de serviço aos outros. É por isso que me orgulho, muitas das vezes, quando recordo que, como secretário de Estado das Comunidades Portuguesas contribui, entre outros apoios, outras ajudas, que pude dar aos portugueses no estrangeiro, para que mais de um milhão e trezentos mil pudessem ter os seus direitos eleitorais, um direito tão básico como este. Tão essencial. Como quando fui visitar dois jovens, estavam os dois na cadeia, sem culpa formada, uma jovem e um jovem, dois irmãos, porque tinha um dia mudado a moeda na Venezuela e a caixa registadora dos pais não estava adaptada e foram detidos. E, quando me dirigi a esses jovens, quando estava junto da sua mãe, com o nosso embaixador Júlio Vilela, que é o nosso embaixador hoje na Suíça, esses jovens estavam, em certa medida, petrificados, não querendo crer que os poderíamos auxiliar. E quando, depois de uma semana de diálogo com as autoridades venezuelanas contribuímos para a sua libertação, foi sentido que tinha sido útil, estando na vida política, a ajudar os outros e melhorando as suas condições de vida, a dar-lhes outra perspetiva sobre o seu futuro. A mesma coisa senti quando fui autarca. É isso que me realiza do ponto de vista da vida pública e da vida política. E é por isso que quero colocar também esta experiência de vida política ao serviço do PS e ao serviço do meu país. Fundamentalmente é isso, como aliás estava a fazer com as forças de segurança. Ou seja, quando eu estava a garantir condições de financiamento para construir alojamento e habitação para os polícias que se encontram deslocados na Área Metropolitana de Lisboa, quando estava a contribuir para a valorização de 20% dos seus salários, sentia gosto no que estava a fazer, sentia uma honra no que estava a fazer, porque estava a contribuir para melhorar a vida democrática, para melhorar a vida das instituições do meu país.
Tem consciência de que o cenário que tem pela frente não é nada fácil?
Sim, temos um cenário muito difícil. Um cenário de duas guerras, uma guerra na Europa, uma guerra no Médio Oriente, uma polarização excessiva das sociedades, uma radicalização que tem vindo a tomar conta das sociedades, mas também é por isso que eu entendo que tenho o perfil. Sem pôr em causa os meus camaradas, com certeza, seja o Pedro Nuno, seja o Daniel Adrião, terão qualidades que eu também não tenho, mas há algumas qualidades que eu tenho do ponto de vista humano, do ponto de vista pessoal, do ponto de vista do perfil psicológico, do ponto de vista da liderança, assim como também a experiência de vida que tenho, que é muito diversificada, que, neste momento do país, é útil, pode ser útil ao PS e é útil também ao país. E é isso que eu me proponho a fazer, é colocar esta experiência de vida, com um perfil, com uma personalidade, procurando contribuir, precisamente, para dar previsibilidade e estabilidade às condições de vida dos portugueses.
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