Leonor Antunes, que foi escolhida pelo curador João Ribas para criar um projeto de representação oficial portuguesa oficial na 58.ª Bienal de Arte de Veneza, falava durante uma conferência de imprensa que decorreu no Teatro Nacional de São Carlos.
"É triste ver como alguns países estão a tornar-se regimes fascistas. Portugal vive uma situação fora do normal e temos um Governo fantástico", comentou, logo no início da sua intervenção para apresentar o projeto.
Intitulado 'a seam, a surface, a hinge or a knot' ("uma costura, uma superfície, uma dobradiça ou um nó", em tradução livre), o projeto ficará no Palazzo Giustinian Lolin, onde estará instalado o Pavilhão de Portugal, com pré-abertura marcada para 8 de maio.
No final da conferência de imprensa, Leonor Antunes reiterou as suas convicções políticas: "Tem a ver com a situação muito grave que estamos a viver hoje em dia".
"Se estivesse o PSD ou o CDS no Governo, eu não aceitaria porque não são valores em que eu acredito. Eu defendo os valores da democracia, embora sejam regimes também democráticos, eu defendo os valores de esquerda", afirmou.
Na opinião de Leonor Antunes, que reside desde há 2004 em Berlim, "um artista também representa um país". "Estou a representar o meu trabalho, a mim própria, mas também represento Portugal, e defendo o Governo que existe no país", sustentou.
A artista referiu a situação vivida na Alemanha, recordando que "o Governo não é assim tão desinteressante, mas, neste momento, a extrema direita também está no parlamento, com uma presença bastante forte, que até há pouco tempo era proibida".
"Sou uma estrangeira que vive em Berlim e não são esses os valores que quero dar à minha filha", sublinhou a artista de 46 anos, que diz estar "num momento bom" do seu percurso artístico.
Ressalvou, no entanto, que o alvo do projeto não é nacionalista, mas internacional: "Não me vejo como uma artista portuguesa. Sou uma artista que, por acaso, nasceu aqui [em Portugal], mas o nosso público é internacional".
Acrescentou que decidiu ficar em Berlim, para onde foi com uma bolsa da Fundação Calouste Gulbenkian, porque na altura era mais fácil trabalhar naquela cidade do que em Lisboa, "particularmente para mulheres artistas".
O projeto de Leonor Antunes resulta de uma pesquisa que tem vindo a realizar já há alguns anos, em anteriores exposições que fez em Milão e Veneza, sobre o trabalho de figuras importantes no contexto da arquitetura de Veneza, nomeadamente Carlo Scarpa, Franco Albini e Franca Helg e, mais recentemente, as arquitetas Savina Masieri e Egle Trincanato.
Sobre o Palazzo Giustinian Lolin, onde vai fazer a intervenção, a artista descreveu-a como "um espaço difícil para trabalhar, porque é histórico não é possível tocar nas paredes ou no chão do edifício, e o projeto é totalmente 'site specific'" (concebido para este espaço em si mesmo).
As obras em escultura que vai apresentar no interior de três salas do edifício - nomeadamente candeeiros - estão a ser feitas em oficinas de carpintaria, em metal, cabedal e vidro, em Veneza, Berlim e Lisboa.
Leonor Antunes sublinhou ainda que, neste projeto, quis "destacar o artesanato e objetos históricos de uma cidade [Veneza] que foi sendo invadida pelo turismo e perdendo a sua artesania".
"É esse saber fazer que eu queria reativar", no projeto, disse, acrescentando que, a partir do momento em que aceita trabalhar numa exposição, cria uma relação de proximidade e de envolvimento com os sítios, de forma empática.
De acordo com o diretor-geral das Artes, Américo Rodrigues, a representação oficial portuguesa em Veneza, este ano, tem um custo de 500 mil euros, cerca de 200 mil pagos pelo Ministério da Cultura e, o restante, precisou Leonor Antunes, proveniente das galerias de arte com as quais trabalha.
A 58.ª Exposição Internacional de Arte vai decorrer de 11 de maio a 24 de novembro deste ano, na cidade italiana, com curadoria do britânico Ralph Rugoff, diretor da Hayward Gallery, em Londres, e terá como tema 'Tempos Interessantes', reunindo 91 representações nacionais.