Bong Joon-ho, realizador sul-coreano de 50 anos de idade, foi o vencedor do Óscar de Melhor Realizador nesta 92.ª edição do prémios mais prestigiados do cinema. Numa categoria com nomes consagrados pelos seus pares, como Martin Scorsese ou Sam Mendes, Joon-ho torna-se na agradável surpresa da noite, num sinal de mudança vinda de dentro da Academia de Artes e Ciências Cinematográficas.
Depois de ter sido o primeiro filme coreano a receber a Palma de Ouro em Cannes, ‘Parasite’ tornou-se também no primeiro filme em língua não inglesa a vencer o prémio máximo do Sindicato dos Atores dos EUA (SAG Awards), o prémio de melhor elenco. Agora Bong Joon-ho é apenas o segundo realizador asiático (o primeiro foi Ang Lee, por duas vezes) e o primeiro sul-coreano a receber um Óscar de Melhor Realizador.
Paralelamente, Joon-ho é também o segundo realizador de um Melhor Filme Internacional a vencer na categoria Melhor Realizador, tendo o primeiro sido Alfonso Cuáron, com 'Roma'.
"Depois de ganhar Melhor Filme Internacional achei que estava feito por hoje e podia relaxar", começou por dizer, com a ajuda da sua intérprete Sharon Choi. "Quando eu era mais novo e estava a estudar cinema, havia um dizer que me marcou profundamente: 'o mais pessoal é o mais criativo'. Esta citação é grande Martin Scorsese, portanto...", disse, dirigindo-se ao realizador de 'The Irishman', que recebeu uma ovação em pé. "Quando eu estava na escola, eu via os filmes do Martin Scorsese, só ser nomeado foi uma honra, nunca pensei que fosse ganhar", continuou.
#Oscars Moment: Bong Joon Ho accepts the Oscar for Best Directing for @ParasiteMovie. pic.twitter.com/b7t6bYGdzw
— The Academy (@TheAcademy) February 10, 2020
"Quando as pessoas nos Estados Unidos não conheciam os meus filmes, o Quentin sempre colocava os meus filmes nas listas dele. Ele está aqui, muito obrigado. Quentin, eu gosto muito de ti", disse, fazendo também referências a Sam Mendes e a Todd Phillips. "Se a Academia deixasse, eu gostava de pegar numa motosserra do Texas [referência a filme do Tarantino] e cortar este Óscar em quatro", afirmou, em reverência aos seus colegas.
Embora tenha concorrido com o favorito ‘1917’, um filme de guerra que muito apraz aos votantes da Academia, ou com ‘Irishman’, um ‘requiem’ dos efeitos da culpa no envelhecimento tratado magistralmente por Martin Scorsese, ‘Parasite’ foi a verdadeira surpresa da sétima arte este ano, com uma crítica voraz ao capitalismo, imbuída numa festim de vários genéros cinematográficos (da comédia negra ao drama familiar, passando pela sátira de classes até ao thriller).
‘Parasita’, cujo título original é ‘Gisaengchung’, coloca duas famílias de Seul em pólos opostos e segue as suas interações. A família Kim vive numa cave e atravessa sérias dificuldades por causa da falta de emprego e a família Park vive numa casa de luxo com jardim e abundância de espaço.
Sem revelar demasiado, porque a surpresa é elemento fulcral, o filme não se pode reduzir a um confronto de classes. A leitura de Bong Joon-ho sobre os efeitos do capitalismo não é simplista, é complexa, e pretende deixar o espetador numa zona neutra em relação às personagens, todas com partes iguais de inocência e culpa. É no campo dos conceitos que o realizador pretende deixar perguntas, principalmente em relação ao sistema capitalista.
Bong Joon-ho já não estranho nenhum em Hollywood. Para além do aclamado filme de terror The Host’ (2006), o sul-coreano esteve a atrás das câmaras em ‘Snowpiercer’ (2013) e, mais recentemente, ‘Okja’ (2017), ambos com participação de atores americanos e ambos com visões distópicas sobre estratificação, confronto de classes e capitalismo.
‘Parasita’ é o 11.º filme em língua não inglesa a ser nomeado para Melhor Filme e apenas o sexto a ser nomeado para Melhor Filme e Melhor Filme Internacional no mesmo ano. Nunca nenhum ganhou Melhor Filme.
Os outros nomeados nesta categoria eram Martin Scorsese por 'Ther Irishman', Quentin Tarantino por 'Once Upon a Time... in Hollywood', Todd Phillips por 'Joker' e Sam Mendes por '1917'.