"Ainda há muito caminho a fazer" em Portugal sobre democracia cultural
Em Portugal existe abertura para pensar em democracia cultural e na Cultura a várias vozes, mas "ainda há muito caminho a fazer", afirmou à Lusa o comissário do Plano Nacional das Artes, Paulo Pires do Vale.
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O breve diagnóstico é traçado na véspera da realização de um encontro internacional sobre "democratização da cultura e democracia cultural", intitulado "Conferência do Porto Santo", que decorrerá na terça e quarta-feira naquela ilha madeirense, juntando ensaístas, programadores e agentes culturais.
"É o desejo de pensar a democracia cultural, não como uma coisa para intelectuais ou só para alguns, mas perceber qual o papel de cada um; qual a voz que cada um pode exercer e ter; de que maneira é que podemos exercer os nossos direitos culturais, que não é apenas ter acesso à cultura feita por outros, mas de fazer parte desse tecido cultural. Significa ser produtores, cocriadores, espetadores", sublinhou Paulo Pires do Vale.
O Plano Nacional das Artes assume a organização desta conferência, a convite do Ministério da Cultura e inserida no contexto da presidência portuguesa do Conselho da União Europeia.
Entre os oradores convidados desta conferência, que decorrerá em formato híbrido, 'online' e presencial, estão os ensaístas Jacques Rancière e Chantal Mouffe, o investigador Wayne Modest e a artista Tânia Bruguera.
Paulo Pires do Vale recorda que "já há uma abertura em Portugal para deixar de pensar na Cultura no singular e pensar em culturas no plural, em comunidades diferentes; e os cidadãos puderem rever-se na identidade cultural das suas comunidades e não na perspetiva de uma Cultura única que a democratização tantas vezes tinha".
Para o ensaísta, este conceito de "democracia cultural" é uma mudança de paradigma em relação à "democratização da Cultura", que vigorou sobretudo a partir de finais de 1960, por influência de França: "Dar a conhecer as grandes obras da humanidade ao público, ao povo. Tornar acessível o património a esse público".
"Essa perspetiva tem sempre um ponto de vista de superioridade e às vezes mesmo de paternalismo. Significa que há uns quantos que sabem e decidem o que os outros devem fruir, e olham tantas vezes esses outros do ponto de vista do consumo, de consumidores. Ou seja, não tanto de pensar os cidadãos como produtores culturais, agentes culturais, mas sob a perspetiva de consumidores" que significa que há uma elite que define o que é a arte e a cultura e como deve ser fruída, apontou.
A "Conferência do Porto Santo" tem como objetivo repensar, precisamente, esse conceito.
Questionado sobre a quem se destina este debate, Paulo Pires do Vale inclui todos na resposta: Instituições culturais, poder político, tecido empresarial, comunidade escolar, sociedade civil.
"Não basta dizer que somos inclusivos por estarmos de portas abertas ou sermos uma instituição pública. A maneira como programamos, o que programamos, como é que envolvemos, como é que tornamos acessível ou não, como é que ajudamos e vamos ao encontro aqueles que ainda não são os públicos da instituição; isto implica repensar o modelo autoritário de decisões que não têm em conta, por exemplo, a escuta dos vizinhos destas instituição, a escuta daqueles que ainda não fazem parte destas instituições", afirmou.
O encontro decorre na ilha de Porto Santo, onde o Plano Nacional das Artes decidiu implementar a Escola de Porto Santo, projeto que é descrito como um 'think tank' para refletir sobre políticas internacionais e nacionais, nas áreas da Cultura e da Educação, acolhendo ainda residências para artistas e investigadores.
Da "Conferência do Porto Santo" deverá sair "um documento orientador com princípios e recomendações que promovam uma cidadania cultural plena".
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